domingo, 31 de julho de 2022

PRAGMATISMO PARTIDÁRIO

Editorial Folha de S.Paulo

Numa eleição presidencial em que as preferências do eleitorado, com antecedência inédita, consolidam-se em torno de dois candidatos, as agremiações e postulantes que apostavam na perspectiva de uma terceira via estão em situação difícil.

Nada indica que em dois meses o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PSL) cederão terreno para candidaturas alternativas.

Nesse cenário, partidos como o MDB e a União Brasil, cujos candidatos ao Planalto colhem resultados pífios nas pesquisas, começam a tratar daquilo que de fato lhes interessa: garantir lugar na mesa das negociações do próximo governo com o futuro Congresso.

No MDB, a candidatura da senadora Simone Tebet (MS) foi confirmada poucos dias depois de uma legião de caciques do partido ter manifestado apoio à chapa de Lula e Geraldo Alkmin (PSB).

Com 2% das intenções de voto na mais recente pesquisa Datafolha, Tebet não obteve a adesão do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) à sua chapa e não consegue conter as articulações dos correligionários.

Na mesma linha, a União Brasil movimenta-se em busca de reposicionamento. Presidente da sigla e ex-aliado de Bolsonaro, o deputado Luciano Bivar (PE) indicou neste domingo (31) que abandonará suas pretensões presidenciais para buscar novo mandato na Câmara.

A legenda não deverá se comprometer com ninguém agora, mas a saída de Bivar da disputa principal se dá após tratativas com o próprio Lula, que tenta desde já mover as peças com as quais espera contar no novo Congresso se for eleito.

Note-se ainda a ironia da situação. Na União Brasil, Bivar foi o padrinho da filiação do ex-juiz Sergio Moro, que mandou Lula para a prisão nos tempos da Operação Lava Jato e nos últimos meses viu suas ambições políticas se esfarelarem.

Antecipam-se, assim, sob o signo do pragmatismo, articulações que em outras eleições só ganhavam impulso com a definição do resultado das urnas —quadro nada auspicioso para a dita terceira via.

Ciro Gomes (PDT), o postulante mais bem situado nas pesquisas depois dos dois primeiros colocados, está estacionado no terceiro lugar, com 8% das preferências.

Se o poder de atração exercido pelos principais contendores parece irresistível para os partidos, é de se lamentar o empobrecimento do debate eleitoral que a ausência de outras candidaturas competitivas decerto acarretará.

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BOLSONARO É CONSIDERADO TÓXICO ATÉ PARA ALIADOS

Editorial O Estado de S.Paulo

É notório o esforço do presidente Jair Bolsonaro em difundir desconfiança contra as urnas eletrônicas e as pesquisas de opinião. O objetivo é transmitir a mensagem de que teria um grande apoio popular, muito maior do que o registrado nas urnas e aquele medido pelos institutos de pesquisa. Afinal, a fantasia bolsonarista inclui alçar Jair Bolsonaro à categoria de líder de uma maioria silenciosa, que estaria incondicionalmente a seu lado.

A farsa só convence quem quiser ser convencido por ela. Jair Bolsonaro teve 57,8 milhões de votos no segundo turno das eleições de 2018, mas seu desgoverno foi capaz de produzir uma altíssima taxa de rejeição, além de ser o presidente da República candidato à reeleição mais mal avaliado desde a redemocratização. Segundo a última enquete realizada pelo Datafolha, 53% dos brasileiros afirmam que não votam em Jair Bolsonaro de jeito nenhum. Vê-se logo por que o bolsonarismo tem verdadeira ojeriza a pesquisas de opinião – afinal, estas retratam uma realidade que esse movimento fanático teima em negar.

Bolsonaristas podem continuar acreditando que seu líder é querido e admirado pela maioria do povo. Mas a farsa recebeu agora um novo capítulo, especialmente vexaminoso, a escancarar a desconexão do discurso do bolsonarismo com a realidade. Segundo informou o Estadão, os principais aliados políticos de Jair Bolsonaro, cientes do caráter tóxico da presença do presidente em suas campanhas, querem escondê-lo de sua comunicação com o eleitor.

Eis a realidade da rejeição do bolsonarismo por parte da população. Até o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (Progressistas-PI), vêm escondendo o presidente Jair Bolsonaro das campanhas próprias e de seus aliados no Nordeste.

Na convenção do PL que definiu Jair Bolsonaro como candidato à reeleição, Arthur Lira vestiu a camisa “Bolsonaro 22”. No entanto, isso era só para satisfazer a patota bolsonarista. Na hora de se comunicar com o eleitorado em Alagoas, o presidente da Câmara – justamente uma das pessoas que mais se beneficiam do orçamento secreto e das relações com o Palácio do Planalto – quer mostrar independência. Em vez de “Bolsonaro 22”, os marqueteiros de Arthur Lira almejam outra mensagem: a do tocador de obras independente e padrinho direto dos recursos para o Estado. Para piorar, Arthur Lira apoia para o governo de Alagoas o senador licenciado Rodrigo Cunha (União Brasil), que é contrário a Jair Bolsonaro.

Houve também o inusitado pedido do diretório estadual do Progressistas no Piauí, controlado por Ciro Nogueira, para que o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) proibisse a circulação de imagens de seus candidatos ao lado do presidente. Na ação, o partido do ministro-chefe da Casa Civil – a quem Jair Bolsonaro deu nada mais nada menos do que as chaves do Orçamento Federal – afirma que o presidente da República “possui altíssimo índice de rejeição em pesquisas mais recentes” e que o material que circula no WhatsApp de seus candidatos ao lado de Bolsonaro é fake news. Segundo o Progressistas, diante da alta impopularidade do presidente, eles serão prejudicados se aparecerem vinculados a Jair Bolsonaro.

O TRE do Piauí negou o pedido do Progressistas. “Está claramente nos limites da liberdade de expressão e comunicação”, disse a sentença, prolatada em junho deste ano. Certamente, é muito importante que o eleitor saiba, na hora de definir o seu voto, quem tem dado apoio e sustentação a Jair Bolsonaro.

As eleições são território de falsas promessas e de crescente desinformação. Mas elas também revelam muitas coisas. O processo eleitoral tem uma nota de realismo. Políticos sabem quem tem potencial de voto e quem horroriza o eleitor. Ao longo desses três anos e meio – sua primeira função na esfera do Executivo –, Jair Bolsonaro construiu e consolidou sua reputação de governante despreparado, irresponsável, conflituoso e que não é afeito ao trabalho. A alta rejeição não é fruto do acaso, mas simples consequência de seus atos.

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A ELEIÇÃO DO EXTREMISMO

Marcos Strecker e Ana Viriato, ISTOÉ

Com a polarização, estas eleições serão as mais importantes e tensas desde a redemocratização

s convenções partidárias confirmaram aquilo que já se desenhava desde o ano passado. A polarização entre o petismo e o bolsonarismo impediu a consolidação de qualquer alternativa de centro, mesmo no primeiro turno. Como haverá a ameaça direta do presidente às urnas eletrônicas, o pleito será o mais importante desde o fim da ditadura, pois a própria democracia estará em jogo. A campanha será curta e pode ser ter conflitos reais, diferente de todos os processos eleitorais que ocorreram a partir de 1989.

Uma das diferenças fundamentais é que, pela primeira vez, o presidente em exercício pode fracassar na reeleição, mesmo se beneficiando do enorme peso do cargo. Bolsonaro é o mandatário mais fraco a tentar um segundo mandato, e também é aquele que usou a máquina pública de forma mais descarada a seu favor, mudando a Constituição e rasgando a lei eleitoral para distribuir benesses bilionárias a menos de dois meses da votação e se cacifar nas urnas.

“Bolsonaro fala ‘meu Exército’, mas não é dele. Ele foi expulso do Exército por má conduta. Como a gente pode pensar em golpe?” Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente e candidato do PT

A candidatura governista foi lançada na Convenção do PL, no dia 24, quando o presidente perdeu a oportunidade de suavizar a imagem radical visando atingir um eleitorado mais amplo, como queria o próprio comitê. Ao contrário, ele voltou a pregar para os convertidos, mantendo o foco nos evangélicos, nos militares e no agronegócio. O evento aconteceu no Maracanãzinho, no Rio, com a participação do general Braga Netto, o quatro-estrelas escolhido para vice, e sem a presença do general Augusto Heleno (que em 2018 associou o Centrão à ladroagem). Michelle Bolsonaro destacou-se no evento com um apelo às mulheres e aos religiosos e disse que seu marido é “enviado de Deus”. Foi uma presença estratégica. Atrair o eleitorado feminino é um dos maiores problemas do mandatário, pois é o grupo em que sofre maior rejeição.

“O mesmo cara quer voltar  à cena do crime. Quis o destino que eu chegasse aqui. Estamos numa guerra” Jair Bolsonaro, presidente e candidato à reeleição pelo PL

e acordo com o QG bolsonarista, o presidente será apresentado na propaganda eleitoral como o “mais cor-de-rosa” da história. A pretensão soa como pensamento mágico, principalmente depois dos escândalos em série de assédio sexual do ex-presidente da Caixa, Pedro Guimarães, um dos nomes mais próximos do mandatário. A primeira-dama é considerada a grande arma da campanha para atingir esse eleitorado, mas resiste a cumprir esse papel. Um dia depois da Convenção no Rio, ela não compareceu a um evento-chave, quando Bolsonaro participou de um almoço com 135 empresárias e executivas no Palácio Tangará, em São Paulo. Frustrou mais uma vez os estrategistas.

Modular o discurso do presidente é o maior problema da sua campanha oficial, que foi encampada pelo PL e é dirigida por Flávio Bolsonaro. A comunicação está a cargo do marqueteiro Duda Lima, que trabalha há mais de uma década com Valdemar Costa Neto. Mas o próprio presidente não tem contato direto com o profissional. A natureza da campanha virou um problema existencial para os bolsonaristas. O presidente, assim como seu filho Carlos (que manda nas redes sociais e não compareceu à Convenção), sonha em reproduzir a anticampanha de 2018, que ocorreu nos subterrâneos da internet e mobilizou adeptos pelo País com um discurso antissistema. Isso é impossível agora, já que Bolsonaro é o próprio dono da máquina pública. Lima tenta emplacar sem sucesso motes como “Sem pandemia, sem corrupção e com Deus no coração, seremos uma grande nação”. Por isso, ele já enfrenta o fogo amigo da ala ideológica e mais radical do bolsonarismo, que ganhou agora o apoio do ex-secretário de Comunicação Fábio Wajngarten.

Bolsonaro conta com as benesses eleitoreiras para se recuperar nas pesquisas e investe em um novo Sete de Setembro. Se não melhorar, pode perder o apoio do Centrão

Para atrair os jovens, um dos carros-chefe será a norma que permitiu o abatimento de até 99% das dívidas de estudantes que usaram o Fies. “O governo quase não divulgou a revolução que fez com esse passivo. Foi algo acachapante, que será demonstrado bem na campanha”, sonha o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (PL). Mas Bolsonaro tem um longo caminho a percorrer também nesse segmento. Divulgada na quarta-feira, pesquisa Datafolha aponta que Lula conta com 51% das intenções de votos dos jovens ante 20% do presidente.

Manipulação da fé

Diante das dificuldades eleitorais, o presidente abusa da manipulação da fé e da apropriação de símbolos nacionais, tentando reproduzir o Sete de Setembro do ano passado, turbinando-o com as comemorações do bicentenário da Independência. No Maracanãzinho, ele citou a data conclamando os seguidores a “ir às ruas pela última vez”. A menção pode ter duas interpretações. Insinua que o golpe pode se consumar nesta ocasião (daí seria um blefe) ou reconhece inconscientemente que ele não vencerá o pleito (ato falho). Aliados consideraram que foi apenas um tiro no pé, reproduzindo o erro histórico de Fernando Collor em agosto de 1992. Na época, o ex-presidente convocou apoiadores para saírem às ruas de verde e amarelo defendendo seu governo. A população saiu de preto, o que precipitou o processo de impeachment.

Para a corrida eleitoral, o presidente conta com a maioria dos evangélicos, mas tem dificuldades entre os católicos. Espera contar com os deputados nas bases para melhorar a interlocução no segmento e reforçar a posição contra o aborto. O time conta com o deputado e cantor Eros Biondini (PL), que faz parte da Renovação Carismática Católica e é um dos idealizadores do “Cristo é Show”, um dos principais eventos de música gospel do País. Pode não ser suficiente. A Igreja não poupa críticas ao governo há meses. Recentemente, a CNBB falou em “insanidade” ao prestar condolências à família do petista Marcelo Arruda, que foi assassinado por um bolsonarista, e criticou o elevado número de armas em circulação.

O petismo, no outro extremo, fez sua largada eleitoral reforçando a velha imagem de Lula como pai dos programas sociais, especialmente do Bolsa Família. O ex-presidente não estava presente na Convenção que oficializou sua candidatura no dia 21, a portas fechadas em um hotel no centro de São Paulo. Preferiu viajar para Pernambuco, onde participou de evento com o candidato a governador Danilo Cabral, do PSB, partido que participa da sua coligação. (Cabral foi vaiado e a ex-petista Marília Arraes, concorrendo pelo Solidariedade, foi aplaudida mesmo estando ausente, o que mostra as fissuras que ocorrerão ao longo da campanha pelo País.) Foi uma viagem simbólica. O ex-presidente começou o giro no estado por Garanhuns e visitou em Caetés uma réplica da casa onde morou com a mãe, construída por militantes do PT e por familiares.

O eleitorado feminino prefere Lula. Os ricos tendem a favorecer Bolsonaro. O petista mostra um melhor desempenho entre católicos. Bolsonaro, entre os evangélicos

O grande temor em relação ao pleito são as ameaças recorrentes do presidente ao processo eleitoral, repetidas no dia 24. Por isso, o presidente do TSE, Edson Fachin, voltou a se manifestar contra as tentativas de desacreditar as urnas eletrônicas. “O TSE não está só, a sociedade não tolera o negacionismo eleitoral. O ataque às urnas eletrônicas não induzirá o País a erro”, afirmou. Apesar do apoio do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, que passou a questionar as urnas eletrônicas, a ação bolsonarista não ocorrerá sem reações. Em viagem ao Brasil, o secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, reforçou que Joe Biden vai reagir a qualquer tentativa de subverter o resultado das urnas. Disse que nos países da América deve haver “firme controle civil sobre os militares e forças de segurança”. Foi um recado direto a Bolsonaro.

Campanha curta

A campanha acidentada já tem dois momentos-chaves, o Sete de Setembro bolsonarista e a manifestação no 11 de Agosto em defesa da democracia, que promete ser histórico (leia mais à pág. 26). Essas iniciativas indicam que a própria luta pela normalidade democrática pode ofuscar a discussão sobre os problemas do País. Os debates presidenciais, um espaço vital para se conhecer as propostas, podem não ocorrer, já que tanto Lula como Bolsonaro têm evitado marcar o embate público. Isso privaria o País de uma etapa essencial em uma corrida eleitoral que será excepcionalmente curta. A propaganda eleitoral se inicia no dia 16, e o horário eleitoral gratuito, no dia 26. Trinta e sete dias depois, em 2 de outubro, as urnas serão abertas. O País vai decidir o seu futuro em situações conturbadas, e isso não deveria impedir um debate aprofundado. O eleitor merece esse respeito.

O duelo de jingles

Petista repagina o “Lula Lá” com nomes da MPB na campanha, enquanto Bolsonaro apela ao patriotismo com sertanejos

As produções musicais que embalam a pré-campanha dos candidatos ao Palácio do Planalto dão o tom do que eles falarão no corpo a corpo com o eleitorado a partir de 16 de agosto. Lula quer apostar na memória — no que diz respeito aos feitos do governo e, não, em relação aos escândalos de corrupção protagonizados pelo PT. Até então, nos comícios do petista, os telões reproduziam a faixa “Sem medo de ser feliz”, uma versão repaginada do jingle “Lula Lá”, cantada por artistas da cena nacional. Mas o partido já vem trabalhando em novas trilhas sonoras. Agora, um piseiro propaga a “saudade do ex”. “Tinha casa, comida, motinha, charanga, mas depois de você desandou”, diz a letra.

A música de Bolsonaro, em outra ponta, remete ao patriotismo, com o início do hino nacional tocado ao solo de guitarra na parte introdutória, e exalta o presidente com gritos abafados de “mito” ao fundo. O sertanejo o trata como o “capitão do povo” e frisa a ligação do chefe do Planalto com a religião, além de colocá-lo como protagonista de uma luta do bem contra o mal. “Igual a ele nunca existiu. É a salvação do nosso Brasil”. Já o “Pagode do Cirão” busca lembrar a população sobre a chance de eleger um governo diferente por meio da terceira via. “Tá cansado dos mesmos de sempre, de seguir o mesmo giro? Tá na hora de olhar para o Ciro”. Um feminejo de Simone Tebet, por sua vez, faz uma aposta na “esperança” e busca explorar a “força da mulher”.

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ENQUANTO ISSO NO CEARÁ...

Charge do Clayton publicada no jornal O POVO

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MORRE MARIA FERNANDA

André Carlos Zorzi, O Estado de S.Paulo

A atriz Maria Fernanda morreu aos 96 anos de idade, por volta das 18h do último sábado, 30. Ela vinha internada com complicações respiratórias na Casa de Saúde São José, no bairro do Humaitá, no Rio de Janeiro, havia quatro dias 

Nascida em 27 de outubro de 1925, Maria Fernanda Meireles Correia Dias era filha da poetisa Cecília Meireles (1901-1964) e do ilustrador Correia Dias (1892-1935). Começou no teatro ainda na década de 1940, quando fez Ofélia em uma montagem da peça Hamlet, da qual participaram também Sérgio Cardoso e Sérgio Britto, em 1948. Na década seguinte, foi estudar artes cênicas na Europa. 

A censura suspende a atriz Maria Fernanda

'Um Bonde Chamado Desejo'

Já de volta ao Brasil, conseguiu destaque fazendo o papel de Blanche DuBois em Um Bonde Chamado Desejo, em 1959. Consta que Vivien Leigh, que venceu o Oscar de Melhor Atriz em 1952 por interpretar a mesma personagem no filme homônimo, quando esteve ao Brasil, chegou a assistí-la. Foram mais de 10 anos em cartaz, o que lhe rendeu elogios, críticas positivas, o Prêmio Saci, então organizado pelo Estadão, e o Prêmio Moliére de Melhor Atriz, em 1963.

Em 6 de abril de 1962, às vésperas de uma apresentação de Um Bonde Chamado Desejo no Teatro Oficina, em São Paulo (que, inclusive, precisou ser adiada em alguns dias após a atriz sofrer um corte com vidro em um acidente no braço), constava no Estadão: 

"O entusiasmo da atriz pela personagem é enorme. Conta Maria Fernanda que conviveu com os loucos em um manicômio para poder fazer melhor a neurótica que o papel exige. Teve também que pintar os cabelos de loiro. Perdeu três quilos e promete que vai chegar aos 43 antes da estreia"

"Todos nós somos uma Blanche. Seu drama é o de todos nós, é o nosso cotidiano. É a busca de tudo o que queremos e que não temos. Esse é o sentido do título, Um Bonde Chamado Desejo. Blanche representa simbolicamente toda a trajetória humana que é válida porque é cumprida. Hoje em dia [1962], mais do que nunca, há necessidade de que os povos se compreendam. Se isso for pedir muito, que pelo menos eles se falem", destacava a atriz sobre sua principal personagem.

Maria Fernanda e a Censura

Foi por conta de Um Bonde Chamado Desejo que Maria Fernanda se indispôs com a censura durante a ditadura militar brasileira (1964-1985). O episódio se deu em fevereiro de 1968, em Brasília (o Ato Institucional número 5 [AI-5], considerado um dos auges da repressão do período, ainda não estava em vigor, seria assinado em dezembro daquele ano).

"Senhoras e senhores. Em respeito ao público pagante, vimos declarar que a peça Um Bonde Chamado Desejo, que vamos levar agora, tendo sofrido cortes da censura, que serão mantidos por obediência, não por concordância, sofrerá uma pausa, em silêncio, correspondente a cada corte. Pedimos, por isso, a compreensão do público de Brasília". Assim Maria Fernanda deu início à abertura da temporada, no dia 8 de fevereiro de 1968.

Mesmo assim, após a estreia da peça na capital do País, Maria Fernanda e seu então marido, Oscar Araripe, também ator, receberam uma notificação para pagar uma multa ao Serviço de Censura pelo uso de três expressões: "Você parece uma galinha"; "Vaca no cio"; "Essa minha mulher é uma vaca no cio". O espetáculo era produzido por sua empresa teatral, a Maria Fernanda Ltda. 

O casal foi ao gabinete do chefe do serviço de censura, Manoel Felipe de Souza Leão Neto, para pedir explicações sobre os cortes. Segundo Oscar, Leão teria se recusado a prestar-lhes esclarecimentos, afirmando que a censura não devia satisfações a ninguém. Araripe teria inclusive dito que, se estavam vivendo sob ditadura, que o censor lhes dissesse logo. 

Os atores ainda pediram uma lista de palavras para substituir as censuradas, mas o censor afirmou que seria necessário que Brutus Pedreira, o tradutor, redigisse uma nova versão para aprovação - e foi surpreendido com a informação de que ele já havia morrido. À época, o texto usado ainda era o mesmo apresentado desde 1948, em montagem com Henrinete Morineau e Graça Melo.

Suspensa de ser atriz

Sob a justificativa de que "os atores Maria Fernanda e Oscar Araripe conduziram-se de maneira desrespeitosa e descortês ante autoridades censoriais", o governo decidiu suspender as atividades profissionais dos dois atores por um período de 30 dias, além de proibir a apresentação da peça em Brasília por prazo indeterminado. 

Maria Fernanda então fez um comunicado em que pediu que colegas de teatro "protestem violentamente contra o estado de ditadura que reina no País", e afirmou: "Esses atos despóticos do chefe de censura, sr. Souza Leão, não representam o pensamento do governo para com a cultura, porque homens como o sr. Pedro Aleixo, vice-presidente da República, e o deputado Ernani Satiro, líder da maioria, mostraram a melhor boa vontade para resolver o problema". A atriz ainda comunicou que, embora discordasse dos pontos censurados, gostaria de prosseguir com a apresentação da peça, obedendo a lei. 

Desdobramentos

O episódio envolvendo Maria Fernanda, Oscar e a peça Um Bonde Chamado Desejo recebeu apoio da Associação de Escritores de Brasília, diversos intelectuais e também parlamentares. O fato chegou inclusive a ser debatido no plenário da Câmara dos Deputados naquela semana. 

Após Cid Carvalho, vice-líder do MDB na Câmara, ter condenado a ação de censura, Geraldo Freire, líder da Arena (governo), posicionou-se do outro lado: "Não se pode abusar do teatro para comprometer os destinos espirituais da cultura brasileira". O deputado ainda fez questão de "solidarizar-me com o general Façanha, porque teve a coragem de defender a moralidade e a cultura". O Façanha, a quem se referia, era o então diretor da Polícia Federal de Segurança, Juvêncio Façanha, a quem ficava subordinado o serviço de Censura e Diversões Públicas.

Freire foi interrompido por um brado de "Façanha fascista!" vindo de Oswaldo Lima Filho, do MDB. E continuou seu discurso em seguida: "Bendito fascismo, se assim for. Se o fascismo for defensor da cultura, então o fascismo não é aquela doutrina que eu sempre condenei, a doutrina da força e da opressão da inteligência. Se o fascismo, de um lado, oprime a inteligência e a cultura, por outro lado este emporcalhamento da arte do bom gosto oprime a personalidade humana".

Por conta do caso envolvendo Maria Fernanda, a classe artística se mobilizou e chegou a realizar uma greve de três dias sem apresentações nos teatros de São Paulo e do Rio de Janeiro. Posteriormente, foi convocada também Passeata da Cultura Contra a Censura, que tomou espaço na Cinelândia durante o regime militar. 

É possível relembrar parte deste fato nas reportagens do Estadão "A Censura suspende a atriz M. Fernanda", veiculada em 10 de fevereiro, e "Maria Fernanda impetra mandado", de 11 de fevereiro de 1968.

A carreira de Maria Fernanda

Ao longo das sete décadas em que fez sua carreira no teatro, esteve ainda em peças inspiradas nas obras de Nelson Rodrigues, Eurípedes, Tchekhov, Sartre, Brecht e Wilde, entre outros, como Vestido de Noiva, Doroteia, As Casadas Solteiras (1954), Verde que Te Quero Verde (1960), Santa Joana (1965), Jardim das Delícias (1971), As Três Irmãs (1972), O Romanceiro da Inconfidência (1983) e E O Vento Não Levou (1984).

Na televisão, esteve presente desde a década de 1950, com papéis nos teleteatros da época. Ainda esteve no elenco de diversas novelas, incluindo personagens como a sinhazinha Guedes Mendonça, em Gabriela (1975), e dona Gilda em Pai Herói (1979). No cinema, atuou desde os anos 1940, em produções dos principais estúdios da época. Fez parte do filme Carlota Joaquina, Princesa do Brazil (1995), que marcou a chamada Retomada do cinema nacional. No longa, dava vida à d. Maria I, 'a Louca'. 

Trabalhos recentes

Atuando cada vez menos a partir da década de 1990, conforme a idade foi avançando, despediu-se dos palcos com a peça A Importância de Ser Fiel, em 2004, junto ao grupo TAPA. No ano seguinte, foi lançado o filme O Quinze, baseado no livro de Rachel de Queiroz, que conta com Maria Fernanda no elenco. Ela também fez parte do júri teatral do Prêmio Shell. 

A família não divulgou informações sobre o velório.

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DESISTÊNCIA DE CANDIDATURA

Edson Sardinha, Congresso em Foco

BIVAR CONFIRMA DESISTÊNCIA DE CANDIDATURA À PRESIDÊNCIA E TENTARÁ REELEIÇÃO

O deputado Luciano Bivar (União-PE) desistiu de concorrer à Presidência da República. Em mensagem encaminhada pelo Whatsapp a integrantes do partido, Bivar confirmou que disputará a reeleição à Câmara. Dirigentes do partido, no entanto, descartam apoiar Jair Bolsonaro (PL) ou o ex-presidente Lula (PT), como queria o PT, e discutem duas possibilidades: manter a neutralidade na corrida eleitoral, o que também poderia favorecer o petista, ou lançar outro nome  à disputa, mesmo sabendo que não tem chance de vitória. A mais cotada para assumir a candidatura é a senadora Soraya Thronicke (União-MS), que, por estar no meio do mandato, não teria nada a perder.

Bivar oficializará sua decisão na convenção estadual do União Brasil em Pernambuco, ainda neste domingo (31), quando deverá anunciar que será candidato a deputado federal mais uma vez. Interlocutores do parlamentar avaliam que ele, pessoalmente, poderá trabalhar em favor de Lula. A convenção nacional, na qual a legenda decidirá seu futuro, está marcada para a próxima sexta-feira (5) em São Paulo.

Em conversas que tiveram recentemente, o ex-presidente havia acenado com o apoio dos partidos de sua aliança a uma eventual candidatura de Bivar à presidência da Câmara em troca da adesão do União Brasil ao seu nome. Embora Bivar não tenha pontuado na última pesquisa Datafolha, divulgada na quinta-feira (28), a existência de menor número de candidatos tende a favorecer Lula, que aparece em condições de vencer no primeiro turno. Para isso, ele precisará alcançar a maioria absoluta dos votos válidos.

“Se ele desistiu da candidatura à presidência, deve ter uma aritmética que justifique ele ficar confortável em disputar a Câmara. Ainda não está certo se o partido terá outro candidato a presidente. Se houver outra candidatura, não haverá favorecimento a Lula, será trocar seis por meia dúzia”, disse ao Congresso em Foco um político próximo a Bivar. Há diversos opositores a Lula União Brasil, como o ex-ministro e ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado.

O União Brasil é o dono da maior fatia dos fundos eleitoral e partidário no país e detentor de maior tempo no horário eleitoral no rádio e na TV graças aos votos obtidos pelos deputados eleitos pelo PSL na onda de Jair Bolsonaro. Um ano depois de se eleger pelo PSL o presidente rompeu com Bivar, em meio a uma queda de braço pelo controle da máquina partidária. A ala bolsonarista que ficou no União Brasil migrou em massa para o PL, derrubando a bancada, que chegou a ser mais numerosa da Câmara, para a quarta posição.

EDSON SARDINHA Diretor de redação. Formado em Jornalismo pela UFG, foi assessor de imprensa do governo de Goiás. É um dos autores da série de reportagens sobre a farra das passagens, vencedora do prêmio Embratel de Jornalismo Investigativo em 2009. Ganhou duas vezes o Prêmio Vladimir Herzog. Está no site desde sua criação, em 2004.

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O RUGIDO DA ELITE

Carlos José Marques, ISTOÉ

É um movimento tão extraordinário como alvissareiro. Até aqui, parte considerável da chamada elite brasileira parecia apática, resignada e silenciosa, quase cúmplice, diante dos descalabros cometidos em todas as direções pelo governo do capitão Bolsonaro. Nenhuma afronta à Carta Magna, desaforos praguejados contra as instituições da República, abusos no Orçamento público ou mesmo o desprezo pelas causas mais essenciais e caras à população – como garantia à saúde, educação e comida no prato, que falta no de tantos – pareciam capazes de comover a nata social (parte dela consciente e pensante), a ponto de levá-la à reação. Mas, aos poucos, felizmente, as coisas estão mudando. 

Um cordão de isolamento começou a ser montado diante da aberração do governo que claramente conspira e já assumiu o seu viés golpista, dizendo aos quatro ventos que, sim, irá atentar contra à democracia. Estabeleceu até data – o Sete de Setembro, em meio às comemorações que deveriam ser festivas do bicentenário da Independência – e passou a convocar sistematicamente seus correligionários de seita para uma espécie de algazarra geral contra o sistema eleitoral (pilar da democracia), seja qual for o resultado que não se mostre favorável. De um descaramento inominável a petulância do atual inquilino do Planalto, que tenta, a ferro e fogo, se garantir no poder. 

Bolsonaro move os recursos possíveis — financeiros, políticos, militares e, quiçá, milicianos. Apela à ilegalidade explícita, em uma baciada de crimes de responsabilidade e, até aqui, não enfrentava maiores resistências. Nem mesmo dos senhores parlamentares da Casa Legislativa, que deveriam, essencialmente, servir de contrapeso a favor do povo diante dos devaneios do Executivo. O levante das chamadas classes dominantes começou, afinal, a se costurar e a ser desenhado quando o presidente tratou de destruir a credibilidade do País numa apoplética reunião com embaixadores de países diversos para difamar o voto eletrônico.

Se deu mal. Cerca de 80 instituições, em uníssono, protestaram e condenaram o ato. Da Fiesp à Febraban, todos aderiram à causa. Vieram alertas de todos os lados. Seguiram-se mobilizações setoriais para, de alguma forma, blindar o sistema com apoio explícito aos resultados do pleito — a acontecer logo mais em outubro. Ao arreganho bolsonarista apareceram respostas firmes de banqueiros, empresários, economistas, juristas e formadores de opinião, que assinaram um manifesto dando assim o verdadeiro basta a tanta insanidade. “As coisas estão transbordando”, apontou o empresário Horácio Lafer Piva, uma das vozes mais lúcidas e aguerridas do empreendedorismo nacional. 

E está certo. Transbordou mesmo a paciência geral. No 11 de agosto está previsto um grito nas ruas de resistência a Bolsonaro. Nada supera a força de um posicionamento firme e claro de todos os extratos sociais a favor dos valores que lhes são mais caros. Impingir a uma população engajada a rendição incondicional a regimes totalitários é batalha perdida para arrivistas como o capitão — ele, em pessoa, um cancro que precisa ser extirpado da política, evitando que o seu obscurantismo crie metástase e raízes. Não há registro histórico no Brasil de algo igualmente perverso e fora de contexto gerado por um caudilho de atitudes tão anacrônicas e desestabilizadoras do sistema. 

Ante a gravidade das ameaças, que crescem a cada dia com a animosidade presidencial, a reedição da Carta aos Brasileiros – que na década de 1970 fez história em pleno regime da ditadura – veio em boa hora. Desta feita, lida em brado pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e ex-decano da Corte Celso de Mello. Como bem disse o jurista, “Bolsonaro mostra-se um político medíocre que tem aversão à democracia”. Precisa ser impedido de avançar na sua sanha, para o bem geral da Nação. O Brasil necessita agora de todas as vozes possíveis em defesa dos valores e princípios, e do respeito à Constituição. 

No ápice do absurdo sem limites torna-se vital deixar as divergências ideológicas, ou mesmo interesses pessoais, de lado, e se unir numa coalizão indissolúvel, contra os pendores arbitrários, venham eles de onde vierem. Mesmo direto do Palácio do Planalto. Que desalojem do poder aquele que jurou cumprir a Carta e que hoje exibe, sem constrangimento, diariamente, o desejo irrefreável de rasgá-la para reinar absoluto, subjugando cada um dos brasileiros aos seus caprichos e esquemas. Democratas do mundo inteiro estão atentos ao que ocorrerá nas eleições por aqui.

O governo dos EUA já expressou abertamente o seu receio nesse sentido e apelou para o resgate do bom-senso por parte das Forças Armadas, que não podem se alinhar aos devaneios de um projeto de ditador. O Brasil não precisaria estar passando por isso. Lastimável a armadilha em que caiu ao escolher um desatinado para o comando. No modo desespero, o Messias bananeiro tenta a última cartada, investindo na anarquia para desarranjar os fundamentos republicanos e evitar o destino da cadeia, que é o lugar que merece pelo que fez. Os desvarios autoritários de certas figuras não podem triunfar sobre a consciência geral que preza pela liberdade. O repúdio a acenos despóticos chegou no momento certo. Mesmo as elites não estão mais hipnotizadas e passaram a reagir pedindo respeito às regras. Que assim seja.

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"QUERENDO O MEU EX"

Do PODER 360 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) divulgou um jingle sobre a saudade do passado. “Eu sofrendo, querendo meu ex”, diz um trecho da canção. O estilo da música é um forró piseiro, ritmo que ganhou popularidades nos últimos anos.
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sábado, 30 de julho de 2022

OBJETIVIDADE E A LÓGICA LUSA - SEGUNDA PARTE

Carlos Monteiro, OS DIVERGENTES

(continuação…)

Contei-lhe uma história deliciosa, relatada por Mário Prata em seu “Schifaizfavoire” – Dicionário de Português, pela Editora Planeta, dando conta que essas ‘confusões’ linguísticas salvaram-lhe a vida. Quando estava muito mal, internado em estado grave, com transfusões de sangue e bolsas e mais bolsas de soro, que chamava carinhosamente de vinho branco e tinto, sentia que iria sucumbir tal era sua fraqueza… eis que surge uma enfermeira adentrando ao quarto do quase moribundo, que mais parecia um sepulcro e solta um tonitruante alívio verbal:

— Ó seu Prata, trago a pica das quatro, vai ao braço ou ao cu? Mesmo sem forças para aprazer-se, gargalhou. Salvou-lhe não o Rum Creosotado, mas a eficácia da senhora, prova cabal que rir é o melhor remédio.

Dicas dadas, informações relatadas, contatos passados, dias depois, ligo para saber como andavam os preparos àquela altura. Encontrei o amigo aparvalhado de indignação. Ao tentar reservar os hotéis para estada, só os encontrava com o pequeno almoço. Como assim? Não ficaria para refeição. Por que pagar por algo que não consumiria? Explique-lhe que era apenas o café da manhã. Naquele momento me dei conta das dificuldades que teria com hábitos, com a objetividade lógica portuguesa e, pasmem, com a língua.

Viagem feita, chegada à Portocale, felicidade só, em plena primavera lisboeta, quiçá uma quimera. À Ribeira para encostar a cabeça, doce e macia almofada do Tejo. Pura poesia e logo uma indignação. Fumante inveterado logo foi atrás de tabaco, fumos diários. Ao pé do balcão da Tabacaria Mónaco a fatídica pergunta:

— Tem Marlboro? O atendente, com aquela cara de pasmo, olha para o meu amigo como se ele fosse papalvo e responde com um certo grau de deboche:

— Temos! Meu amigo achando que estava no Rio, onde o balconista, no máximo, perguntaria se de caixa ou maço e a versão já buscando-a na prateleira, ficou lá parado aguardando. Mais uma vez: — Tem Marlboro aqui? Já completamente indignado o vendedor trava com ele o seguinte diálogo:

— Ó pá, anda cá; não tens o que fazer? Achas que estou a brincar? Entras numa tabacaria para ficar a perguntar se temos tabacos de marca, o que estás a pensar? É o que estás a fazer gajo, anda-te daqui já. Pondo-no-lo para fora do estabelecimento.

O português, de um modo geral, é objetivo ao responder o que é inquirido. Em outra passagem, meu caro amigo pergunta à concierge do hotel:

— Como chego ao Castelo de São Jorge?

— Apanhas um táxi à porta e indicas d’onde queres ir.

— Mas eu quero ir a pé…

— O senhor não apontou tal detalhe.

Indicações feitas, Sol causticante, meu amigo e a família chegam ao destino que se encontrava fechado. Às tintas, volta e cobra do atendente o fato com indignação plena. A resposta veio de bate-pronto:

— O senhor me perguntou como se chegava lá, não me questionou se estava ou não a funcionar!

Errado não está!

Esta crônica é uma homenagem a Carlos do Carmo.

 “…Lisboa no meu amor, deitada/Cidade por minhas mãos despida/Lisboa menina e moça, amada/Cidade mulher da minha vida…”

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A CHANCELARIA DO CERCADINHO

Weiller Diniz, OS DIVERGENTES

A cartilha de desarticulação do Estado esfolou respeitadas instituições e políticas públicas brasileiras. Entre elas o plano real, programas sociais, a educação e a saúde que ainda vivem dias aflitivos de contínua ameaça, dada a inépcia de seus gestores, com ministros desonestos, equipes despreparadas e/ou mal-intencionadas. Uma das principais vítimas da ruína bolsonarista, entretanto, é a diplomacia, esquartejada impiedosamente desde os primeiros dias desse flagelo. Mentor e executor dos vexames mundiais foi Ernesto Araújo, ex-ministro das Relações Exteriores que, entre tantas sandices, é xenófobo, isolacionista e discípulo de um farsante que afirmava ser a terra plana.  A nódoa eterna do enxovalho planetário foi traçada pelo ex-chanceler que ideologizou o Itamaraty, pulverizou o multilateralismo, implodiu os blocos como o BRICs e o Mercosul e implantou a subserviência a Donald Trump em troca de reciprocidades que nunca se materializaram. A vassalagem foi inaugurada com a cessão da base de Alcântara, no aumento da importação de etanol com imunidade tributária para ajudar potenciais eleitores de Trump, isolamento na OMC e na dispensa de vistos para cidadãos norte-americanos. Nenhuma contrapartida.

Foram os menores pecados do exterminador da diplomacia brasileira. O ápice da desmoralização veio na reunião golpista de Bolsonaro com os embaixadores, onde tentou emporcalhar a democracia, mentiu e afrontou as instituições diante de uma plateia incrédula com os disparates oficiais. O capítulo mais aterrador da agônica diplomacia do cercadinho, já sob a gestão do ministro Carlos França. Em suas vadiagens mundo afora, fruto do ócio e do sádico desprezo pelo próprio país, o capitão Bolsonaro não se cansou de enxovalhar indistintamente os brasileiros por onde trotou, sempre bajulado por comitivas exóticas em hospedagens nababescas. O anão do cercadinho buscou camuflar sua pequenez administrativa e política em missões internacionais improdutivas, sempre priorizando nações com fortes convergências com sua índole ditatorial, mas que também não o respeitam. Entre as nações democráticas ele se sente desconfortável, deslocado. Por anda passa é um zumbi.

Em 2019 foi a estreia na chacota global. Havia, então, uma grande expectativa quanto ao discurso no importante Fórum Econômico Mundial, em Davos. Os investidores e líderes mundiais esperavam um pronunciamento de grande densidade envolvendo temas das prometidas reformas estruturantes. A decepção foi generalizada. Num dos pronunciamentos mais curtos já vistos numa sessão inaugural do evento – 15 pífios minutos – Bolsonaro repetiu tolices eleitorais e mostrou ao mundo o calibre do populismo tosco repisando temas eleitorais inservíveis para o encontro: “Tendo como lema Deus acima de tudo, acredito que nossas relações trarão infindáveis progressos para todos.”, disse o capitão da ignorância ao concluir sua intervenção inicial. “Não queremos uma América bolivariana como havia antes no Brasil com outros governos. Quero lhes deixar claro que a esquerda não vai prevalecer na América Latina, o que é muito positivo para a região e para todo o mundo”, acrescentou ao final de sua fala no auditório principal do centro de convenções de Davos. Mesmo teor anacrônico repetido na ONU anos depois. O suficiente para corar o Barão do Rio Branco. O acervo de estultices é inesgotável.

Foram apenas 2 dias de pura infâmia que mancharam a imagem do Brasil no exterior sob o servilismo e a gastança de uma comitiva com mais de 50 integrantes na delegação. O mesmo evento entrou para o anedotário mundial do despreparo de um chefe de Estado envolvendo um exótico diálogo com Al Gore, ex-vice-presidente dos Estados Unidos. Nele o messias das cavernas obscurantistas disse querer explorar os recursos da Floresta Amazônica com os EUA. O conhecido ambientalista americano alegou não ter entendido o que o presidente brasileiro quis dizer. Nas cenas, Al Gore se aproxima de Bolsonaro para manifestar inquietação com a Amazônia, afirmando: “Estamos todos muito preocupados com a Amazônia, é algo que me toca profundamente”. O capitão reagiu toscamente: “Temos muita riqueza na Amazônia e eu adoraria explorar essa riqueza com os Estados Unidos”. O intérprete da pantomima era Ernesto Araújo. Parece inacreditável. O aumento da área desmatada na Amazônia foi um dos principais itens do desgaste Brasileiro no mundo, decisivo para esturricar nossa diplomacia.

Na abertura da 76ª Assembleia Geral da ONU, em setembro de 2021 em Nova York, o estadista do cercadinho não se limitou a ridicularizar o Brasil. Mentiu despudoradamente: “Estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção”…“Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior”… “No Brasil, para atender aqueles mais humildes, obrigados a ficar em casa por decisão de governadores e prefeitos e que perderam sua renda, concedemos um auxílio emergencial de US$ 800 para 68 milhões de pessoas em 2020”… “Lembro que terminamos 2020, ano da pandemia, com mais empregos formais do que em dezembro de 2019”… “Apoiamos a vacinação, contudo o nosso governo tem se posicionado contrário ao passaporte sanitário ou a qualquer obrigação relacionada a vacina”…” Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina”…”Não entendemos porque muitos países, juntamente com grande parte da mídia, se colocaram contra o tratamento inicial”.

Nos EUA, como alhures, Bolsonaro não passou de uma rudimentar irrelevância entre os líderes mundiais e objeto de jocosidades. Na cidade norte-americana era exigido o passaporte da vacinação contra a Covid-19 para frequentar lugares fechados, como restaurantes, cinemas, teatros e academias. Bolsonaro foi constrangido a almoçar em um lugar improvisado numa churrascaria brasileira. Foi montada uma área externa – cercada por uma grade e panos pretos que impediam a visão pelas pessoas da rua – para Bolsonaro e seu séquito driblarem as regras sanitárias. Outro embaraço foi ensejado pelo prefeito de Nova York, Bill De Blasio. Ele cobrou a vacinação contra a Covid-19 para participação na Assembleia da ONU. A organização do evento informou que não cobraria vacinação dos Chefes de Estado: “Precisamos mandar uma mensagem a todos os líderes mundiais, especialmente Bolsonaro, do Brasil, de que se você pretende vir aqui, você precisa ser vacinado. E se você não quer ser vacinado, nem venha, porque todos devem estar seguros juntos. Isso significa que todo mundo deve estar vacinado”, cobrou o democrata.

Em novembro 2021, os périplos de Jair Bolsonaro evidenciaram seu desprezo, dessa vez diante dos chefes de Estado do G20, em Roma. O capitão ficou deslocado, não conseguiu interagir com outros líderes mundiais, bateu papo com os garçons durante a recepção e o Brasil de Bolsonaro amargou a certeza de ser um pária mundial, insignificante para outras nações. Não pisasse o pé de Ângela Merkel, Jair Bolsonaro teria saído da Itália sem ser notado. É também o capitão da pisadinha. Para o Brasil ficou apenas a imagem da agressão selvagem a jornalistas brasileiros nas ruas da capital italiana. A vergonha foi de tal magnitude que Bolsonaro foi constrangido a desistir da segunda perna da excursão, em Glasgow, na Escócia. Uma reiteração da humilhação mundial. Ninguém o quer por perto. O tour desértico aos Emirados Árabes, Bahrein e Catar não produziu um resultado concreto, além de uma motociata poeirenta. Outra exibição internacional de despreparo onde verbalizou tolices incompreensíveis. Em Dubai chegou a dizer que tratou da “troca de presos políticos”. Para ele são presos políticos no Brasil Roberto Jefferson, Daniel Silveira, Zé Trovão e, em breve, Allan dos Santos, e outros delinquentes. Golpistas da pior laia.

A vadiagem de Jair Bolsonaro pela Rússia, epicentro de uma crise internacional, é a síntese da estupidez e da recorrente vergonha planetária imposta ao país. Depois de percorrer os 11 mil quilômetros que separam as duas capitais e posar no rigoroso inverno de Moscou, o mentecapto do cercadinho amarelou sob o cerco vermelho do Kremlin. Se rendeu a todos os protocolos sanitários que sabotava diariamente no Brasil, onde desfilou potencializando infecções e inflando o número de mortes. Foi colocado em confinamento, usou máscara, respeitou o distanciamento, fez uma bateria de testes de detecção da Covid-19 e bateu continência ao soldado comunista. Com portas fechadas na Europa, Bolsonaro queria demonstrar que não é um pária. Não conseguiu. Falseou, mentiu e reafirmou sua índole autoritária. Nunca um chefe de Estado foi tão desastroso à imagem do seu país. A solidariedade a Vladimir Putin na maior crise global recente esfarelou a diplomacia brasileira e apartou o Brasil das nações democráticas. A viagem teve a participação do gabinete do ódio e da ignorância, inclusive o chefe, Carlos Bolsonaro. O gabinete do ódio também foi na excursão injustificável a Israel atrás do spray contra Covid-19. Um festival de trapalhadas.

O saldo concreto na Rússia foi desastroso: uma anômala solidariedade a uma aliança entre os comunistas de fachada, Vladimir Putin da Rússia e Xi Jinping da China, outrora objeto de hostilidades xenófobas do Itamaraty e da família Bolsonaro na Pandemia. Além dos impactos negativos nos preços do petróleo (gasolina, diesel e gás de cozinha), que turbinou a alta inflação, o Brasil entrou na mira das retaliações de países democráticos da Europa. Um recado forte soou dos Estados Unidos. O porta-voz da Casa Branca anunciou que o Brasil estava “do outro lado”. “A leitura que eu tenho do presidente Putin é que ele é uma pessoa também que busca a paz. E qualquer conflito não interessa para ninguém no mundo. Por coincidência ou não, parte das tropas deixaram a fronteira e, pelo que tudo indica, é uma grande sinalização que o caminho para a solução pacífica se apresenta no momento para Rússia e Ucrânia”, ruminou Bolsonaro se sentindo patrono da paz mundial. A tacanhice foi ridicularizada mundo afora. Cinco dias depois, o presidente Putin reconheceu a autonomia de dois territórios separatistas e sete dias após a profecia pacifista de Bolsonaro, a Rússia invadiu o território Ucraniano. O tour pelo Kremlin foi um dos piores capítulos da vergonha mundial. Na segunda perna da perambulação, Bolsonaro ficou muito à vontade ao lado do ditador da sombria Hungria, Viktor Orbán, a quem chamou de “irmão”.

O vexame não é monopólio das viagens internacionais. Os mais graves ocorreram em solo brasileiro. No ápice da pandemia o então chanceler Ernesto Araújo quase saiu no braço com o embaixador chinês para proteger o filho “bananinha” de Bolsonaro. Ele abriu uma jihad contra a China, maior parceiro comercial do Brasil e o principal fornecedor de insumos e vacinas do mundo. “Quem assistiu Chernobyl vai entender o q ocorreu. Substitua a usina nuclear pelo coronavírus e a ditadura soviética pela chinesa. […] +1 vez uma ditadura preferiu esconder algo grave a expor tendo desgaste, mas q salvaria inúmeras vidas. […] A culpa é da China e liberdade seria a solução”, delirou Eduardo Bolsonaro. Yang Wanming, embaixador, retrucou: “A parte chinesa repudia veementemente as suas palavras, e exige que as retire imediatamente e peça uma desculpa ao povo chinês”. A própria embaixada da China publicou outra mensagem irônica: “As suas palavras são extremamente irresponsáveis e nos soam familiares. Não deixam de ser uma imitação dos seus queridos amigos. Ao voltar de Miami, contraiu, infelizmente, vírus mental, que está infectando a amizades entre os nossos povos”, publicou a embaixada.

Ernesto reagiu apoplético em defesa do clã Bolsonaro, que tempos depois o enxotou do governo. “Já comuniquei ao embaixador da China a insatisfação do governo brasileiro com seu comportamento. Temos expectativa de uma retratação por sua postagem ofensiva ao chefe de Estado”, disse Araújo em nota. Ele teria pedido a troca do embaixador. Em abril de 2021 Araújo escreveu em seu blog um artigo intitulado “Chegou o comunavírus”, onde a crise sanitária seria parte de “plano comunista” que usaria a pandemia como uma oportunidade de “acelerar um projeto globalista”. Em novembro 2021, Eduardo Bolsonaro voltou a atacar a China, dizendo que o Partido Comunista Chinês espionaria o país caso uma empresa chinesa atuasse na tecnologia 5G. O embaixador chinês chamou a declaração do deputado de infame e advertiu que esse tipo de atitude prejudicaria as relações bilaterais. Sob o tacão de Araújo, o Itamaraty enviou uma carta à embaixada da China dizendo que a resposta tinha conteúdo “ofensivo e desrespeitoso”.

O último degrau da indigência diplomática, consequência do pânico eleitoral e da prisão iminente, foi a reunião com embaixadores para reiterar a retórica golpista. A cartilha Donald Trump foi reproduzida literalmente. Atrás nas pesquisas, Bolsonaro faz um esforço para desacreditar o sistema eleitoral, portanto, a própria democracia. Todas as supostas vulnerabilidades invocadas pelo capitão foram desmontadas. Escaldado pelo extremismo trumpista, que resultou na selvageria da invasão do Capitólio, apoiada por Bolsonaro, o governo de Joe Biden emitiu uma nota mortal contra as bravatas: “Os Estados Unidos confiam na força das instituições democráticas brasileiras. O país tem um forte histórico de eleições livres e justas, com transparência e altos níveis de participação dos eleitores. As eleições brasileiras, conduzidas e testadas ao longo do tempo pelo sistema eleitoral e instituições democráticas, servem como modelo para as nações do hemisfério e do mundo. Estamos confiantes de que as eleições brasileiras de 2022 vão refletir a vontade do eleitorado.” Outras nações democráticas foram na mesma linha. O mundo civilizado monitora atônito as molecagens do cercadinho.

Os EUA, na era pós-Trump, não engoliram o golpismo e o escárnio de Bolsonaro ter pretendido nomear o chapeiro Eduardo Bolsonaro para embaixador brasileiro em terras ianques. O “filé” que ele pretendia dar ao filho foi inviabilizado politicamente, mas foi a primeira demonstração do desprezo pelas instituições e desrespeito ao mundo, como todos os fascistas da história que acham que tudo podem. Os vergonhosos resultados econômicos e geopolíticos das vadiagens internacionais do capitão só realçam a relevância do Brasil na era Lula, quando o país era chamado e parabenizado em pautas da governança global, do combate às desigualdades, à fome, crise sanitária, situação climática e o desmatamento. Servem também para redimensionar o Brasil no exterior. O país é sempre bem-vindo ao debate mundial sobre temas globais relevantes e contemporâneos. Porém, é ignorado quando a agenda é a da mediocridade do cercadinho, medieval, bizarra, belicista e antidemocrática. A diplomacia do cercadinho foi um tiro no pé que não encontrou, obviamente, eco no mundo.

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SALTO PATRIMONIAL

Guilherme Amado, METRÓPOLES

Patrimônio de deputado do Novo saltou de R$ 7 mil para R$ 188 mil

Principal liderança do Novo na Câmara dos Deputados, Marcel Van Hattem ampliou seu patrimônio declarado em 2.295% nos quatro anos de seu primeiro mandato. O parlamentar gaúcho, que na eleição de 2018 dizia ter R$ 7.871 em bens, registrou a candidatura à reeleição com R$ 188.513 de patrimônio.

Van Hattem tinha apenas quatro depósitos bancários como patrimônio em 2018, segundo os dados que o deputado forneceu ao TSE. Desde que foi eleito, ele comprou dois veículos, avaliados em R$ 55.900 e R$ 41.000, dois terrenos, um de R$ 33.100 e outro de R$ 3.000, aplicou R$ 47.665 em renda fixa e transferiu R$ 6.875 para uma conta no exterior.

O salário mensal de um deputado federal é de R$ 33.763.

Van Hattem foi o deputado mais votado no Rio Grande do Sul no pleito de 2018, com 349.855 mil votos. Na Câmara, ele se notabilizou como um dos maiores defensores do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Procurado pela coluna, Van Hattem disse que a “única atividade [exercida] durante esse mandato foi a parlamentar”.

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sexta-feira, 29 de julho de 2022

URNAS ELETRÔNICAS

Eliane Costa Ribeiro, OS DIVERGENTES

– “Vocês já sabem o que fazer” ! – diria o Comandante Supremo em uma de suas recentes aparições públicas.

Assim teria sido deflagrado o grande plano e a divulgação da tão esperada senha. O dia “D” e a hora “H” seriam oportunamente definidos pelo inesquecível diretor de logística.

Precisamente às 23h55 do dia 30/10/2022, na calada da noite, os insurretos sairiam às ruas, encapuzados, para a concretização da “grande missão patriótica” (GMP).

Sim, por ocasião do 2º turno das eleições presidenciais e apenas algumas horas após o encerramento da votação, os integrantes da GMP invadiriam todas as zonas eleitorais e carregariam, em suas próprias cabeças, as urnas eletrônicas, retirando-as do local,  não sem antes envolvê-las cuidadosamente em tecidos verde e amarelo, para o necessário disfarce.

Do lado de fora, filas de caminhoneiros vindos de todas as partes do país estariam de prontidão, aguardando o carregamento da “muamba”. Emocionados, tal como estiveram no mês de setembro do ano precedente, quando comemoraram um fracassado golpe de estado, estariam agora confiantes. Patriotas incansáveis, seriam eles os encarregados da honrosa missão de levar as urnas eletrônicas para local incerto e não sabido. Abnegados, fariam esse enorme sacrifício em prol da Grande Nação, muito embora tivessem exigido o pagamento adiantado do diesel necessário para o sucesso da “operação”. Imaginaram-se heróis nacionais, com estátuas de bronze erigidas nas ruas das principais capitais do país.

À Turma das Panelas seria destinado o trabalho remanescente, ou melhor, as urnas remanescentes. Passariam a madrugada inteira destruindo, a paneladas, as urnas eletrônicas que eventualmente sobrassem nos rincões afastados, de difícil acesso.

Qual não foi a surpresa dos insurgentes quando, ao nascer do sol, os principais noticiários do país anunciaram o resultado das eleições presidenciais, com a previsível derrota do candidato da situação.

Uma reunião emergencial foi marcada para a análise de conjuntura. Após horas de discussão, palavrões e insultos, chegaram a um consenso: a culpa teria sido da preposição. Malditas preposições comunistas!

Falava-se tanto, tanto e tanto, e todos os dias, no roubo nas urnas eletrônicas que tudo isso deu a entender aos organizadores da GMP que aquela era a frase ou a palavra de ordem. Cometeram apenas um erro: entenderam que a palavra de ordem era o roubo das urnas. E trataram de planejar a operação.

Mas ainda daria tempo de consertar o engano.

Utilizariam o roubo das urnas como prova cabal e inconteste do roubo nas urnas. Usariam a maldita preposição a seu favor. Afinal, como seria possível os jornais terem publicado o resultado das eleições se as urnas foram roubadas? Seria a prova inconteste e insofismável da fraude eleitoral. A prova que há tanto buscavam. Iriam aos Tribunais Superiores. À ONU, à Corte de Haia, se necessário.

Confiantes na vitória da Causa nos tribunais internacionais, tomariam antecipadamente o poder.

Já teriam até preparado o primeiro ato institucional a ser publicado pelo novo governo:

Artigo 1º : Fica declarado extinto o Ministério da Educação.

Artigo 2º : O uso da preposição fica definitivamente abolido da língua portuguesa.

Artigo 3º : Fica decretado o sigilo de cem anos das imagens relacionadas ao roubo das urnas eletrônicas e de seu esconderijo secreto.

Artigo 4º : Revogam-se as disposições em contrário

(ou seria ao contrário?)

– Eliane de C. Costa Ribeiro é juíza do Trabalho aposentada 

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AUXÍLIO BRASIL É A ÚLTIMA CARTADA DE BOLSONARO PARA CRESCER NAS PESQUISAS

Edna Lima, OS DIVERGENTES

A última pesquisa Datafolha, divulgada nesta quinta-feira, mostra um quadro estável em relação à corrida presidencial. Ciro Gomes e Simone Tebet permanecem com os mesmos índices de intenção de votos, mantendo a polarização entre o ex-presidente Lula e o presidente Bolsonaro, com uma diferença bastante significativa a favor do petista. Esse resultado nada mais é do que o reflexo de uma gestão inteira de brigas e trapalhadas.

Bolsonaro tentou minimizar os resultados na live desta quinta-feira (28), mas algumas de suas atitudes demonstram o desespero com a possibilidade real de derrota. Para tentar justificar a  pesquisa, avaliação do presidente é de que a “virada” a seu favor ocorrerá no final de agosto, quando o Auxílio Brasil turbinado começar a entrar no bolso da população mais pobre, assim como as ajudas aos taxistas e caminhoneiros. O início do horário eleitoral na televisão, também no mês que vem, é outra esperança de melhora de sua imagem.

A queda no preço da gasolina, que poderia ter aumentado o apoio ao presidente, não surtiu efeito. Não houve  mudanças no quadro em relação ao mês anterior. A variação foi dentro da margem de erro. Em junho, Bolsonaro tinha 28% das intenções de votos, contra 48% de Lula.

É possível que o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600,00 possa ajudar a alavancar a candidatura do presidente, mas é muito difícil que essa virada inverta as posições. Lula tem uma situação confortável, se não houver nenhuma catástrofe, ele pode até ganhar ainda no primeiro turno. Já Bolsonaro, com mais de 50% de rejeição, precisa de um milagre pra virar esse jogo.

Talvez por isso a turma do Planalto ande tão preocupada. As trapalhadas cometidas por Bolsonaro, como a infausta reunião com embaixadores de 40 países para tentar desmoralizar o sistema eleitoral brasileiro e as urnas eletrônicas, afetaram ainda mais a já combalida imagem do presidente. E as reações foram as piores possíveis para a campanha do capitão.

Assessores próximos ao presidente temem que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sob o comando do ministro Alexandre de Moraes, negue o registro da candidatura de Bolsonaro à reeleição. Dizem que as declarações de alguns ministros apontam nesse sentido. Pode até ser, afinal, motivos não faltam.

Ao longo dos três anos e meio em que esteve à frente do Executivo, Bolsonaro passou o tempo inteiro conspirando contra o Legislativo e o Judiciário. Se alinhou ao Congresso após entregar os anéis, os dedos e até às mãos ao Centrão, por meio do famigerado orçamento secreto.

Além disso, Bolsonaro tem nas suas costas, nada menos que 533 processos, alguns nos inquéritos que investigam os atos antidemocráticos. Muitas dessas manifestações foram estimuladas ou contaram com a participação do próprio presidente.

Talvez por isso suas baterias tenham se voltado com toda força contra o Judiciário, sobretudo contra o Supremo e o TSE. Os ministros não parecem dispostos a tolerar novas ameaças vindas de Bolsonaro ou dos seus seguidores. A prisão de Ivan Rejane Fonte Boa Pinto, semana passada, foi o aviso final. O bolsonarista postou em suas redes sociais ataques aos ministros do Supremo e à democracia.

Se insistir nessa danosa brigar contra o sistema eleitoral, Bolsonaro corre o risco não só de ficar isolado, como de perder o registro da sua candidatura. O seu filho 03, deputado Eduardo Bolsonaro, parece ter entendido o recado e já baixou o tom em suas redes sociais. Resta saber até quando.

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HÁ NO FUTEBOL MUITOS ALIADOS DESSE GOVERNO COVARDE

Walter Casagrande Jr., Folha de S.Paulo

Comentarista e ex-jogador. É autor, com Gilvan Ribeiro, de "Casagrande e seus Demônios", "Sócrates e Casagrande - Uma História de Amor" e "Travessia"

Antes de qualquer coisa, sou um cidadão brasileiro, adoro o meu país e não posso ficar de camarote apreciando a nossa destruição. Não é só a destruição da Amazônia, mas também a dos valores e a dos princípios, coisas que esse governo nunca demonstrou ter.

Venho de uma geração inquieta, corajosa, que sempre se posicionou contra tudo o que acontecia no período da ditadura. Ter sido um componente importante da Democracia Corinthiana, para mim, não foi só uma atitude de passagem: eu acreditava e continuo acreditando na democracia.

Lutei por ela e não meço esforços para defendê-la. Não sou de baixar a cabeça –mas sempre sem violência, que isso não faz parte da minha personalidade.

Luto pela minha liberdade. O nosso Brasil democrático está sendo atacado há quatro anos sem parar. O pior é que os ataques vêm das pessoas que deveriam nos proteger e dar condições dignas de vida à população.

A destruição também ocorre na educação, na saúde e na cultura. Tem muita gente incompetente e sem preparo nenhum liderando essas pastas e secretarias.

É ministro do Meio Ambiente facilitando garimpo ilegal, desmatamento e venda irregular de madeira. É ministro da Saúde que mostra o dedo do meio para as pessoas, dificulta a compra de vacinas, faz propaganda de medicamentos ineficazes e ainda arruma uma boquinha para o filho.

A Cultura ficou nas mãos de um recalcado que tem inveja dos bons atores. É por isso que o seu objetivo sempre foi reduzir a nossa arte.

E na Educação tentam inibir a todo custo as investigações sobre o envolvimento da chefia com alguns pastores em um esquema de corrupção.

Estamos vivendo ainda dentro de diversas pandemias sociais que esse governo causou.

Não quero, daqui a alguns anos, olhar para trás e perceber que poderia ter feito mais para o meu país. As minhas armas, além das urnas, estão nos espaços onde escrevo e falo. É por isso que tenho que usá-los da melhor maneira possível.

Não podemos esquecer que há no futebol muitos aliados desse governo covarde, times com muitas torcidas e com uma grande história nas mãos de pessoas reacionárias acostumadas a dar carteiradas, algumas delas também investigadas.

Fui educado politicamente por meio da música, da leitura, das charges de grandes artistas como Henfil. E a nossa arte continua, mesmo com todas as sabotagens, a educar politicamente as pessoas. Esse é um dos motivos do ódio à cultura brasileira: querem formar uma geração com pouco esclarecimento para que ela seja mais facilmente controlada.

Por isso, temos que dar tudo de nós nas urnas para mudar esse cenário macabro.

Apesar de tudo, quero acreditar, como Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Tony Bellotto, que o pulso ainda pulsa.



Fome, violência, desmatamento, inflação

Má-fé, intolerância, ódio, corrupção

Racismo, ignorância, homofobia, agressão

Ataque às urnas e às leis, de armas na mão

E o pulso ainda pulsa, o pulso ainda pulsa


Censura, desprezo, misoginia, machismo

Covid, 650 mil mortos, deboche, egoísmo

‘E daí?’, ‘Não sou coveiro’, ‘Gripezinha’

‘Histórico de atleta’, ode à tortura, golpe

E a vacina ainda atrasa, e o escárnio ainda é pouco

E o pulso ainda pulsa, o pulso ainda pulsa


Fake news, rachadinha, cheque, mansão

Loja de chocolate, milícia, sem demarcação

E a boiada ainda passa, e o crime ainda avança

E o pulso ainda pulsa, o pulso ainda pulsa


Mentira, crueldade, covardia, perversidade

Garimpo ilegal, bravatas, desigualdade

Genocídio, feminicídio, desprezo, desumanidade

E a empatia é zero

E o pulso ainda pulsa, o pulso ainda pulsa

Pulso, pulso, pulso, pulso


"A gente não quer só comida,

A gente quer comida, diversão e arte

A gente não quer só comida,

A gente quer saída para qualquer parte"

(livremente inspirado em "O Pulso", de Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Tony Belotto, e "Comida", de Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Britto, com o devido aval de todos os autores)

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FÔLEGO NA LARGADA

Editorial Folha de S.Paulo

Passada a agitação das convenções que oficializaram as principais candidaturas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mantém a liderança da corrida presidencial, com grande vantagem sobre Jair Bolsonaro (PL).

A nova pesquisa do Datafolha mostra o petista com 47% das intenções de voto, o mesmo que tinha em junho. Ele está 18 pontos porcentuais à frente do presidente, cujas preferências oscilaram um ponto em um mês e agora somam 29%.

Descontados os eleitores dispostos a votar em branco ou anular, e os sem candidato definido, Lula teria hoje 52% dos votos válidos —teoricamente suficientes para a vitória no primeiro turno, raspando na margem de erro da pesquisa.

Mas o levantamento mostra também que Bolsonaro teve ganhos significativos em segmentos do eleitorado que lhe opõem forte resistência, ainda que o avanço se mostre insuficiente, até aqui, para modificar o quadro geral da eleição.

É possível que Bolsonaro tenha sido favorecido pela incipiente recuperação da economia e pelo anúncio dos novos benefícios sociais aprovados a toque de caixa neste mês. Quando eles começarem a ser pagos, em agosto, esse efeito poderá ser amplificado.

Entre os mais pobres, com renda familiar de até dois salários mínimos, a avaliação do desempenho do governo segue muito negativa, mas teve pequena melhora. O apoio à reeleição de Bolsonaro também cresceu nesse estrato, que reúne mais da metade dos votantes.

Mesmo assim, os pontos ganhos pelo presidente entre os pobres estão longe de atingir o nível de popularidade que ele alcançou no fim de 2020, quando o governo pagou o auxílio emergencial a trabalhadores prejudicados pela pandemia.

Bolsonaro também ganhou terreno entre as mulheres e os eleitores do Nordeste. Mas suas taxas de rejeição continuam muito altas nos dois grupos, em que Lula exibe seus melhores números, com larga diferença sobre o incumbente.

Num cenário atípico para eleições presidenciais brasileiras a essa altura, 71% dos eleitores se declaram decididos e somente 28% cogitam a possibilidade de mudar de candidato. O grau de convicção é maior entre os apoiadores de Lula e Bolsonaro, alcançando 79%.

Isso mostra como é íngreme o caminho que o mandatário terá que percorrer para reduzir a distância entre eles e levar a disputa para o segundo turno. Somente 28% dos eleitores aprovam seu desempenho no cargo e 53% dizem que não votariam nele de jeito nenhum.

O que ajuda a entender sua radicalização na ofensiva contra as instituições democráticas. Se as medidas populistas não produzirem os resultados que espera, ele já deixou claro que fará de tudo para tentar tumultuar o processo eleitoral.

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SOFRIMENTO DUPLO

Editorial Folha de S.Paulo

O calvário das mulheres que precisam realizar um aborto no Brasil nem sempre termina nos procedimentos inseguros praticados em residências ou clínicas clandestinas a que a maioria é obrigada a recorrer.

Ele prossegue nos tribunais, onde processos e condenações por interrupção da gravidez acrescentam uma dose extra de humilhação e violência a pessoas já fragilizadas.

Como se isso não bastasse, as ações penais não raro se amparam em provas tênues, por vezes obtidas de forma ilegal, e que redundam em julgamentos eivados por preconceitos de promotores e juízes.

Esse quadro escabroso emerge de um relatório produzido pela Clínica de Direitos Humanos das Mulheres da Universidade de São Paulo, em parceria com a Universidade Columbia e a Clooney Foundation for Justice, a partir da análise de 167 decisões sobre abortos não previstos em lei, proferidas por tribunais estaduais e cortes superiores em 2021.

No Brasil, a lei autoriza o procedimento quando a gestação resultar de estupro, implicar risco para a vida da mãe, ou em caso de feto anencéfalo. Afora isso, a prática é considerada crime, com pena de um a três anos de prisão para a mulher.

Contam-se aproximadamente 400 novas ações por ano relacionadas a casos de autoaborto ou aborto consentido. Os processos costumam ter cor e classe social bem definidas. As denunciadas, em geral, são mulheres negras e de baixa renda, obrigadas a recorrer aos serviços públicos de saúde.

Nesses locais, em vez de receberem tratamento humanizado e baseado na confidencialidade, elas terminam, em muitos casos, expostas pelos médicos que as atendem.

De acordo com o relatório, em cerca de 10% dos processos foi possível identificar que partiu de profissionais da saúde a denúncia que gerou a investigação criminal —uma atitude oposta ao que preconizam o Código Penal, o Código de Ética Médica e pareceres de conselhos de medicina, como o Cremesp.

Ocioso dizer que tudo isso poderia ser evitado caso o aborto fosse tratado no Brasil não sob a ótica penal, mas como questão de saúde pública e dos direitos da gestante, como há muito esta Folha advoga. Assim também tem entendido um número crescente de países.

Por aqui, lamentavelmente, não só o Congresso se recusa a avançar nessa direção como o governo Jair Bolsonaro (PL) ainda se esforça para restringir o acesso a esse direito até nas poucas condições em que ele pode ser exercido.

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INACEITÁVEL CHANTAGEM

Editorial O Estado de S.Paulo

O Estadão informou que o governo de Jair Bolsonaro realiza uma operação de bastidores para tentar convencer o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a adotar propostas do Ministério da Defesa sobre as urnas eletrônicas nas eleições de outubro. Segundo fontes do governo, essa negociação tem o objetivo de evitar reações violentas de bolsonaristas no 7 de Setembro e no dia das eleições. Nessas tratativas, há a indicação de que o acatamento das propostas por parte da Justiça Eleitoral seria também um modo de acalmar o próprio presidente Jair Bolsonaro, evitando que ele adote alguma atitude de incentivo a distúrbios e outras confusões.

Essa negociação é um completo disparate, rigorosamente inconstitucional. Em primeiro lugar, o Poder Executivo não tem nenhuma competência sobre as atribuições da Justiça Eleitoral a respeito das eleições. Toda pressão do governo federal para que o TSE faça mudanças nos procedimentos relativos às urnas é exercício abusivo da função pública.

Em segundo lugar, as sugestões do Ministério da Defesa, feitas no âmbito de um órgão consultivo da Justiça Eleitoral, são apenas isto: sugestões. O TSE não tem nenhuma obrigação de aceitar, tampouco de oferecer contrapartidas. Não existe, não pode existir, uma “negociação” entre Ministério da Defesa (ou outro órgão da administração federal) e Justiça Eleitoral, pelo simples e cristalino motivo de que o Ministério da Defesa (ou outro órgão da administração federal) não tem competência sobre as eleições.

Junto com outras entidades, o Ministério da Defesa foi convidado a oferecer sugestões sobre o processo eleitoral. Não lhe foi atribuída nenhuma competência adicional, como se pudesse interferir nas decisões da Justiça Eleitoral ou fazer barganhas públicas sobre as eleições.

Como se não bastasse essa atuação fora dos trilhos institucionais, há uma agravante muito séria nessa pretensão de interferir às vésperas das eleições no processo eleitoral: a chantagem. Quando o presidente e seu entorno sugerem que não têm como controlar a reação de seus apoiadores caso as propostas do Ministério da Defesa não sejam adotadas, configura-se inaceitável tentativa de coagir a Justiça Eleitoral.

Ora, não deveria ser necessário recordar que o respeito às leis e às normas eleitorais deve ser incondicional. Se Bolsonaro não aceita as regras do jogo nem reconhece a autoridade do árbitro, deve retirar-se da disputa. Insinuar que pode haver violência se Bolsonaro não puder ditar o regulamento das eleições beira o gangsterismo. Não é assim que funciona no Estado Democrático de Direito.

É preciso dizer, no entanto, que o presidente não se daria por satisfeito mesmo que todas as exigências bolsonaristas fossem atendidas, porque não lhe interessa o processo eleitoral, mas apenas o resultado da eleição: a esta altura já está claro que Bolsonaro não aceitará outro desfecho que não seja sua vitória.

Além disso, a chantagem sobre a Justiça Eleitoral é uma incrível inversão de responsabilidades. Desde a redemocratização, as eleições no País têm sido pacíficas. Mesmo nas mais ferrenhas disputas, nunca houve nada que se assemelhasse minimamente à confusão que vem sendo insinuada por bolsonaristas, a respeito de uma possível “convulsão social”, com participação de grupos armados. Se hoje há o risco de eventos violentos no 7 de Setembro ou no dia das eleições, isso é consequência direta do comportamento de Jair Bolsonaro, que não faz nenhum esforço para desestimular a violência. Ao contrário: o presidente estimula o tumulto com suas dúvidas sobre o processo de votação e suas invectivas contra a Justiça Eleitoral. 

Que a lei seja rigorosamente aplicada sobre todos os arruaceiros das eleições. A paz social e a ordem pública na campanha eleitoral e no dia do pleito são temas muito sérios. Não são moedas de troca. Assim como todos os que desejam se candidatar nas próximas eleições, o presidente Jair Bolsonaro tem o dever de promover a paz. Se não o faz, coloca-se à margem das regras do jogo, com consequências nefastas. Há lei no País, e deve valer para todos.

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COMO DAMARES FOI TRAÍDA

Germano Oliveira, Brasil Confidencial, ISTOÉ

Damares Alves sentiu na pele a força da traíção de Jair Messias. Ela esperava ser candidata ao Senado pelo DF com apoio de Bolsonaro, mas levou uma rasteira. 

O presidente optou por Flávia Arruda para a vaga de senadora na chapa bolsonarista encabeçada pelo governador Ibaneis Rocha. 

O marido de Flávia, o ex-governador José Roberto Arruda, preso por corrupção no passado, será candidato a deputado federal.

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PM DA RESERVA É DETIDO SUSPEITO DE FURTAR PASTA DE DENTE E SABONETE

Do O POVO

Um subtenente da reserva remunerada da Polícia Militar do Ceará (PMCE) foi detido na última quinta-feira, 28, suspeito de furtar produtos de higiene em um supermercado de Aquiraz, na Região Metropolitana de Fortaleza. Imagem obtida pelo O POVO mostra que os produtos subtraídos foram uma pasta de dente e um sabonete líquido

Conforme os policiais, eles foram acionados para uma ocorrência de furto em estabelecimento comercial. No local, foram informados de que haviam sido furtados produtos de higiene pessoal.

O suspeito foi contido pelos profissionais do supermercado e informou que era PM da reserva. Em seguida, a equipe constatou que se tratava de um subtenente

O furto foi flagrado por imagens do circuito de segurança. O caso foi levado ao supervisor de policiamento, e o militar foi conduzido à Delegacia Metropolitana de Aquiraz, onde foi realizado o flagrante por furto.

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PDT RIFA CIRO EM PALANQUES ESTADUAIS

Da Coluna do Mazzini, ISTOÉ

O presidenciável Ciro Gomes se consolidou no terceiro lugar das pesquisas de intenção de votos, mas isso não é suficiente para convencer o seu próprio partido do seu potencial de votos que ele diz ter, com o recall de eleições passadas.

Além das dificuldades nas tratativas em alguns Estados onde ele é ofuscado, o caso de Alagoas, divulgado pela Coluna ontem, evidencia um desprestígio do candidato.

Questionado pela Coluna, o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, ainda não se pronunciou sobre o atropelo que Ciro Gomes teve em Alagoas, onde ficou sem palanque. A executiva nacional do partido também não informou se haverá intervenção.

O silêncio indica que Ciro foi rifado. É que, conforme publicamos ontem, o ex-governador Ronaldo Lessa (PDT) será o vice de Paulo Dantas (MDB), e abrirá palanque para Lula da Silva (PT). Tudo com articulação de Renan Calheiros, quem Ciro detesta.

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quinta-feira, 28 de julho de 2022

BOLSONARO AGRIDE A CONSTITUIÇÃO E O PAÍS E PODE RECEBER CARTÃO VERMELHO

Andrei Meireles, OS DIVERGENTES

Em seu delírio de um golpe contra a vontade do eleitorado, Bolsonaro saiu das quatro linhas da Constituição, e atropelou os próprios parceiros ao estimular uma forte reação da nata do PIB e das principais forças da sociedade civil. Traçou, assim, o próprio caminho para morrer na praia. Ou até antes dela.

Em seu desespero sobre as consequências para si e seu clã por uma derrota eleitoral, voltou a apostar na mesma insanidade para uma virada de mesa no 7 de setembro do ano passado. Se lá teve que votar com o rabo entre as pernas na famosa cartinha redigida por Michel Temer, hoje o cenário é muito mais desfavorável. Essa pirueta ocorreria em plena campanha eleitoral com todos seus adversários surfando em propagandas nos rádios, nas tevês e nas redes sociais. Lula, Ciro Gomes, Simone Tebet e Janones podem aniquilá-lo e suas maluquices sem nenhuma dificuldade.

Se entre os malucos que fazem a cabeça de Bolsonaro o 7 de setembro é o momento de virar a mesa, quando chegar lá isso já virou pó. O país estará inteiramente ligado às eleições que ocorrerão 20 e poucos dias depois. Aliás, os despautérios na absurda reunião no Palácio da Alvorada com embaixadores de dezenas de países e surtos posteriores como no encerramento da Convenção do PL deram ruim, geraram um clima de basta. Até no que seria seu próprio terreiro.

Nessa quarta-feira (27), o general Luís Carlos Gomes Mattos, na sessão em que se despediu da presidência do Superior Tribunal Militar, foi na veia: “Não esquecendo que temos uma Justiça Eleitoral e ela é a responsável pelo funcionamento real daquilo. Nossa missão é diferente, não temos que nos envolver… temos que garantir que o processo seja legítimo. Essa é a missão das Forças Armadas”.  O recado foi dado diante de uma penca de generais bolsonaristas, como o candidato a vice-presidente Walter Braga Netto e o ministro Luiz Eduardo Ramos.

Depois do puxão de orelha do amplo manifesto da sociedade, que um ressabiado Bolsonaro chamou de cartinha, algumas peças se moveram em Brasília. Valdemar Costa Neto, dono do PL pelo qual Bolsonaro se candidata, nessa mesma quarta-feira foi bater ponto no gabinete do ministro Edson Fachin na presidência do Tribunal Superior Eleitoral. Lá, pregou paz e manifestou sua confiança no sistema eleitoral, contestado por Bolsonaro. Até Arthur Lira, depois de nove dias de silêncio, também manifestou nessa quarta-feira sua confiança no sistema eleitoral.

O que motivou toda essa mudança é a constatação de que Bolsonaro, que já havia recebido cartão amarelo, pode receber um cartão vermelho se voltar a cometer pênalti em 7 de Setembro, uma data histórica.

A conferir.

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LULA LÁ !

Igor Gielow, Folha de S.Paulo

Datafolha: Lula tem 52% dos votos válidos e poderia vencer no 1º turno

SÃO PAULO O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem 52% das intenções de votos válidos na disputa da sucessão de Jair Bolsonaro (PL), o que o faria ganhar a eleição que ocorrerá em 2 de outubro no primeiro turno se o pleito fosse hoje.

É o que indica a pesquisa do Datafolha feita nesta quarta (27) e quinta (28) com 2.566 eleitores em 183 cidades. Ela foi contratada pela Folha e está registrada com o número BR-01192/2022 no Tribunal Superior Eleitoral.

A posição de Lula é semelhante à registrada na pesquisa anterior feita pelo instituto.

Como a margem de erro do levantamento é de dois pontos percentuais para mais ou menos, Lula pode ter tanto 50%, necessitando um voto a mais para liquidar a fatura no primeiro turno, como pode ter mais confortáveis 54%.

Bolsonaro registra 32% dos válidos, mas aqui as atenções vão para os 9% auferidos por Ciro Gomes (PDT), que rejeitou qualquer possibilidade de diálogo no campo da esquerda para tentar firmar-se como opção para quem não quer nem o petista, nem o presidente no Planalto.

É um filme já visto em 2018, quando houve um ensaio de aproximação entre Ciro e o então candidato do PT, Fernando Haddad —que substituia a Lula, então vetado da disputa por ter condenação em segunda instância.

Ao fim, mágoas de lado a lado e o pedetista foi para a Europa após ficar em terceiro lugar no primeiro turno. Neste ano, o pedetista queria ser a tal terceira via, mas esbarrou no peso de Lula no campo em que concorre, o da esquerda.

Lula já disse em público, como em entrevista nesta semana ao UOL, que não vai lutar por voto útil, mas esse é um desejo de seus estrategistas. Eles não esperam o apoio de Ciro, mas sim uma migração por gravidade.

O petista já namorou o discurso de que vencer no primeiro turno seria ideal para conter a escalada golpista de Bolsonaro. Até aqui, o eleitor de Ciro não se mexeu —ele segue estável, após ter caído de um patamar usual de 12% para 8%.

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