terça-feira, 30 de abril de 2019

BOLSONARO AGORA INCENTIVA AS MILÍCIAS RURAIS

Bernardo Mello Franco, O GLOBO
Jair Bolsonaro recebeu apoio maciço dos ruralistas. Agora usa o cargo para pagar a fatura eleitoral. Ontem o presidente foi a uma feira agrícola e atacou os fiscais do Ibama. Criticou as multas a desmatadores e prometeu “uma limpa” no órgão que protege as florestas.
Num ambiente em que ainda é tratado como “Mito”, Bolsonaro não precisou se esforçar para agradar. Ele sinalizou uma nova interferência no Banco do Brasil para baixar juros cobrados aos ruralistas. Em seguida, anunciou uma espécie de salvo-conduto para o fazendeiro que matar alguém em sua propriedade. “Ele responde, mas não tem punição”, explicou.
Os afagos do presidente às milícias urbanas já eram conhecidos. Agora ele incentiva a atuação das milícias rurais. O Brasil tem uma longa tradição de pistolagem no campo. Com a mudança proposta ontem, os matadores podem se livrar de qualquer punição — desde que o alvo dos tiros seja rotulado como “invasor”.
O discurso de Bolsonaro alarmou religiosos que acompanham os conflitos pela terra. “Não sei se ele percebe a consequência dessas declarações irresponsáveis, que insuflam a violência”, critica a freira americana Jean Anne Bellini, coordenadora da Comissão Pastoral da Terra. “É um sinal verde para resolver os conflitos na base da força”, acrescenta.
Há 42 anos no Brasil, a freira diz que os relatos de intimidação armada têm aumentado nos últimos meses. “Os ânimos estão exaltados, e um pronunciamento desses só piora as coisas”, lamenta. “Já havia muito fazendeiro que pensava assim, mas eles tinham pudor de dizer. Agora perderam esse pudor”.
Mestre em educação pela Universidade Duke, ela explica que os bandos rurais costumam ter ligação com o Estado. “Há uma mistura entre pistoleiros, grileiros de terra e policiais de folga. São milícias de fato”, afirma.
Jean Anne era amiga da missionária Dorothy Stang, assassinada a mando de fazendeiros em 2005. O crime chamou a atenção do mundo para os riscos que os defensores da reforma agrária correm no Brasil. Passados 14 anos, perguntei à freira se ela se sente mais ou menos segura. “Menos segura, com certeza”, respondeu.
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A 'JARARACA' CONTINUA MUITO VIVA

Frederico Vasconcelos, Folha de S.Paulo
Faltou, na ótima entrevista de Luiz Inácio Lula da Silva à Folha e ao El País, uma avaliação sobre a insistência em sua inviável pré-candidatura à Presidência a partir da carceragem de Curitiba, opção política que abriu mais espaço para a eleição de Jair Bolsonaro.
Em contrapartida, diante do nível troglodita do debate atual nas redes sociais, considerando o que foi publicado, Lula soube preservar sua capacidade de criticar sem ofensas pessoais, algumas vezes com refinada ironia.
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segunda-feira, 29 de abril de 2019

DO MIMIMI PRESIDENCIAL À CRISE REAL

Carlos José Marques, ISTOÉ
E agora, presidente, como ficamos? A economia vai dando sinais claros de que volta a parar. Oito vezes, pelo menos, os números do PIB foram revistos para baixo em 2019. Um recorde sem precedentes na história estatística recente. Os índices de desemprego estão de novo em alta após dois anos de alguma estabilidade promovida pela gestão anterior. A maioria contabiliza o ano como perdido e empurra as expectativas de crescimento para 2020.
A essa altura do campeonato, decorridos mais de 100 dias desde a posse do mito Bolsonaro, seria por demais otimista dizer que o desempenho de seu governo naquilo que realmente interessa entraria pelo menos na classificação de sofrível. Está abaixo disso. Desastrosa são as práticas políticas que, em boa parte, desencadearam o cenário. Para além do “golden shower” e das demais prioridades de costumes e esquisitices que tomaram o tempo do mandatário, seus filhos, o guru da Virgínia e diversos ministros destrambelhados contribuíram, e muito, para a bagunça administrativa instaurada e que praticamente imobilizou o Executivo.
Travados pela inépcia do Estado nas tarefas mais elementares e assustado com as perspectivas, consumidores, empresários, brasileiros em geral, engavetaram planos e perderam o otimismo inicial. A confiança numa agenda de retomada, com mudanças estruturantes, foi para o espaço. A popularidade de Bolsonaro, logo na largada, caiu ao pior nível de um presidente eleito pelo voto desde a redemocratização. E segue em desabalada queda. Os números da pesquisa Ibope da semana passada comprovam.
O País agora teme bater de novo à porta da recessão. Seria o pior dos mundos e não está longe. A probabilidade de PIB negativo no trimestre entre janeiro e março é enorme. Ao menos três grandes instituições financeiras, os bancos Bradesco, Itaú e Fator, atestam essa perspectiva em suas análises de cenário, o que desloca e já compromete eventuais resultados positivos dos meses subsequentes. A verdade nua e crua é que entramos mais uma vez numa espiral de estagnação, com ameaça concreta de “crescimento negativo” – na terminologia técnica, significando na prática andar para trás – e ainda não há qualquer consenso sobre a estratégia para se sair dela e voltar a acelerar.
A desarticulação do Planalto no projeto da Reforma da Previdência (que foi colocada como pedra fundamental para o despontar de uma nova era) assombra inclusive a base aliada. Não é à toa que analistas são unânimes em dizer que a persistência das incertezas políticas, sem qualquer inversão de mão do Executivo, pode levar rapidamente a uma inviabilidade do governo, com pressões de todos os lados, inclusive de militares. Os agentes de mercado tomaram um duro golpe ao assistirem, desolados, à interferência do presidente, de maneira populista e equivocada, no preço do diesel. Foi como uma facada na credibilidade que ainda restava junto à opinião pública.
A criação de um ambiente favorável aos investimentos e às apostas das empresas tem como pressuposto fundamental a chamada previsibilidade de regras. Algo que Bolsonaro desconsiderou ao partir para atitudes atabalhoadas como essa. Com o festival de revezes econômicos contabilizados em tão pouco tempo de nova gerência, a dúvida que resta daqui para frente é se a experiência negativa motivará uma mudança de postura do chefe da Nação.
Ele sairá da inércia para um trabalho mais firme e ativo de recondução do País aos trilhos? Irá mobilizar as forças políticas para um rápido desenlace do projeto da Previdência? Buscará uma nova relação de entendimento com o Legislativo após a criação de um clima de animosidade a troco de nada? E o que esperar da influência sempre caótica do clã bolsonarista, onde cada filho abre a boca quase diariamente para criar seguidas crises? Presidente é bom que o senhor enxergue os fatos como eles são. A fórmula em uso por esses dias está se esgotando rapidamente.
E as razões do fiasco vão bem além da conjuntura. Tiroteios verbais, despachos por redes sociais, falta de comunicação direta com políticos, Judiciário e formadores de opinião escancararam uma gestão desastrosa. O Congresso retalia com pautas bombas, encurtando as ações do governo: orçamento impositivo, limitação de medidas provisórias e retardamento na análise de projetos do Executivo são apenas algumas das munições já usadas.
A estratégia kamikaze de Bolsonaro contabiliza até aqui o apoio apenas dos seguidores de sempre, numa adoração fanática, e abre margem a uma frustração generalizada. Para além do mimimi de perseguição, que ele costuma entoar, a crise é real. Os números não mentem. Nem atenuam. O presidente deve evitar a receita fácil de sobrepor populismo a liberalismo. Do contrário será engolfado pelos eventos.
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MORA NA FILOSOFIA

Do Blog do Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense
Devido ao suicídio de Getúlio Vargas no ano anterior, um presidente de enorme prestígio popular, o carnaval de 1955 era esperado com muito baixo-astral, mas o que aconteceu foi exatamente o contrário. O povo foi pra rua se divertir e a festa pegou fogo, com muitos sambas e marchinhas de sucesso. Foi o caso de Mora na filosofia, de autoria de Monsueto Menezes com Arnaldo Passos (parceiro de Geraldo Pereira), na voz de Marlene.
Regravado na década de 1970, no LP Transa, por Caetano Veloso, com um arranjo espetacular de Jards Macalé, é ainda hoje considerado um dos mais belos sambas da história da nossa música popular: “Eu vou lhe dar a decisão / Botei na balança/ Você não pesou/ Botei na peneira / Você não passou / Mora na filosofia / Pra que rimar/Amor e dor”. Aquele carnaval foi uma lição de que “a arte existe porque a vida não basta”, como diria mais tarde o poeta Ferreira Gullar.
Judeu de origem sefardita, o antropólogo, sociólogo e filósofo Edgar Morin, cujo verdadeiro sobrenome era Nahoum, foi um herói da Resistência francesa durante a II Guerra Mundial, o que lhe valeu as tarefas de adido ao Estado-maior do Primeiro Exército francês na Alemanha ocupada, em 1945. Sua principal obra são os seis volumes de O método, no qual questiona o fechamento ideológico e paradigmático das ciências. Diante dos problemas complexos que as sociedades contemporâneas enfrentam, dizia, em meados da década de 1970, apenas estudos de caráter interpolitransdisciplinar poderiam resultar em análises satisfatórias de tais complexidades. “Somos complexos”, dizia.
Para Morin, o conhecimento complexo não está limitado à ciência, pois há na literatura, na poesia, nas artes, um profundo conhecimento. Todas as grandes obras de arte possuem um profundo pensamento sobre a vida. Segundo o próprio Morin, devemos romper com a noção de ter as artes de um lado e o pensamento científico do outro. Certo estava Paulo Vanzolini, o dublê de cientista e sambista, autor de Ronda, o hino na noite paulista, entre outras canções antológicas: “De noite eu rondo a cidade / A lhe procurar sem encontrar / No meio de olhares espio / Em todos os bares você não está / Volto pra casa abatida / Desencantada da vida / O sonho alegria me dá / Nele você está”.
Compositor de Volta por cima e Na boca da noite, Vanzolini era zoólogo e foi um dos idealizadores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Com seu trabalho, a USP aumentou a coleção de répteis do seu Museu de Zoologia de cerca de 1,2 mil para 230 mil exemplares. Com o geógrafo Aziz Ab’Saber e com o norte-americano Ernest Williams, desenvolveu a Teoria do Refúgio em suas expedições pela Amazônia.
Ética
A mais recente polêmica protagonizada pelo presidente Jair Bolsonaro é sobre o ensino de filosofia, sociologia e história nas universidades, segundo ele, um desperdício de recursos públicos, diante das deficiências do país em outras áreas, como engenharia, medicina e veterinária. Realmente, existe um subinvestimento nessas áreas, que exigem muito mais infraestrutura para a formação dos alunos. A maioria das faculdades não dispõe de recursos materiais nem humanos do nível, por exemplo, do Instituto Militar de Engenharia (IME), do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), da Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).
Por ironia, as ideias defendidas por Bolsonaro estão ancoradas na filosofia medieval: a escolástica. Seu expoente foi São Tomás de Aquino, cuja teologia tinha por objetivo provar a existência de Deus ou de seus atributos por modos puramente filosóficos. O “tomismo” conciliou as posições e os métodos de Aristóteles com o cristianismo, tornando-se a corrente filosófica oficial da Igreja Católica na Idade Média, com influência na ética, na teoria política e na metafísica, até o Renascimento e o Iluminismo.
Tomás de Aquino foi o grande teólogo da guerra (justa por uma boa causa, se declarada por uma autoridade legítima e com objetivo de alcançar a paz). Muito criticado por Maquiavel, o “tomismo” (aristotelismo cristão) foi uma ruptura com o pensamento de Platão, aquele filósofo da fábula do homem da caverna, que enxergava as sombras na escuridão, mas quando vê a luz fica cego e, ao voltar pra caverna, não enxerga mais. Aessência da civilização é o humanismo. A ciência sem a ética, a antropologia e a sociologia é um perigo. Exemplos não faltam, como o de Josep Mengele em Auschwitz.
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"A AVESTRUZ"

Antonio Carlos Prado, ISTOÉ
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, afasta-se cada vez mais do magistrado que foi, mas não consegue se aproximar do político de prestígio que pretende ser — prestígio que poderia lhe dar até a chance de sonhar com uma eventual candidatura ao Palácio do Planalto em 2022, abrindo mão, assim, de seu projeto inicial que é o de ser indicado para o Supremo Tribunal Federal. Moro inquieta-se, e, recentemente, demonstrou isso pelo Twitter afirmando que em relação ao seu pacote de catorze medidas anticrime, enviado em fevereiro ao Congresso, não pode o governo comportar-se “como uma avestruz”. Ou seja: Moro não quer que o governo enfie a cabeça na terra e deixe de articular uma base parlamentar que garanta a aprovação do pacote.
O ministro tem todo o direito de lutar pelas medidas que criou e nas quais acredita no combate à criminalidade. A sua pressa, no entanto, tem também outras razões. A principal delas é que, naturalmente, o pacote anticrime ficou ofuscado pelo tema da reforma da Previdência, que tramita na Câmara. Nem poderia ser diferente. Por mais que a violência se espalhe pelo chão brasileiro, o certo é que colocar a Previdência nos trilhos é mais urgente, porque, sem a tal reforma, nem o País existirá mais. Outro motivo é que entre as medidas propostas sobrevive uma que abrirá um desgastante debate no Congresso, justamente no momento em que se precisa da união para salvar a agonizante economia.
Sergio Moro aceitou o fatiamento de seu projeto, acenando aos parlamentares com a minimização criminal da prática de caixa dois. Não adiantou nada. Os deputados e senadores sabem que existe um ponto nas catorze medidas que precisa ser descartado. Trata-se da “excludente de ilicitude” na legítima defesa por parte de policiais, se ela decorrer de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Trocando em miúdos, nessas hipóteses o policial mata mas não pode ser punido penalmente. O governo e os parlamentares não vão colocar as mãos nesse vespeiro, sobretudo tendo consigo as estatísticas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública: policiais civis e militares, em todo o País, estando ou não em serviço, mataram 5.159 pessoas em 2017.
O estudo, esse número é cotejado com o de 2013, quando a polícia matou 2.202 pessoas. O aumento é estrondoso e a proposta de Moro tende a cair. Sem ela, o seu pacote não é nada diferente do que já se tentou fazer no País e não funcionou. Essa é a cartada de Moro para aumentar a sua popularidade, mas ele tende a ficar com par de sete nas mãos.
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HOMENAGEM À MARIELLE

GENEBRA Pela primeira vez, uma brasileira é eleita ao Parlamento da Espanha. Trata-se de Maria Dantas que, há 25 anos, vive em Barcelona. Em entrevista ao UOL, ela contou que sua plataforma será a de defender o direito de imigrantes e refugiados, além de uma ampla agenda de direitos humanos, combate à extrema-direita e promoção da ecologia. 
Neste domingo (28), Maria vestia uma camisa com o rosto de Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 2018. A sergipana de Aracaju promete aproveitar a entrada no Parlamento para denunciar o governo de Jair Bolsonaro.
“Meu primeiro recado a ele [Bolsonaro] é que Marielle vive”, disse. “Além disso, vou dar visibilidade às suas atrocidades”, disse ela, que promete ações em toda a Europa para “expor o caráter racista e homofóbico” do governo. 
Maria Dantas conta que sempre se negou a entrar para a política, apesar de proliferar iniciativas entre ativistas. “O que me empurrou desta vez foi a força da extrema-direita que, pela primeira vez em 40 anos, volta ao Parlamento”, apontou, uma referência ao sucesso eleitoral do partido Vox.
Maria Dantas foi eleita pelo partido Esquerda Republicana da Catalunha (ERC). Nascida em 1969, a nova deputada é advogada e chegou a Barcelona para realizar estudos de direito ambiental, filosofia jurídica, moral e política. Atualmente trabalha em uma empresa catalã na área de finanças. 
Ao longo dos anos, fez parte de iniciativas como a Unidade Contra o Fascismo e o Racismo, Stop Mare Mortum e da Plataforma Brasileiras contra o Fascismo de Barcelona, entre outras organizações. 
Ao saber que havia sido eleita, Maria não deixou de lembrar de sua origem humilde no Brasil e garantiu que vai trabalhar em questões sociais por já ter “sofrido na pele” as dificuldades de ser estrangeira. 
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OS EXPULSOS DO BANCO DO BRASIL

Eugênio Bucci, Folha de S.Paulo
O presidente da República já deu mostras enfáticas, reiteradas e indisfarçáveis de que não hesita em atear fogo no interesse público para promover suas predileções moralistas, antiquadas e fascistizantes.
Foi assim quando, para bajular o governo de extrema-direita de Israel, criou uma enorme confusão nas relações comerciais do Brasil com os países árabes. Foi assim quando abriu mão do princípio da reciprocidade e, unilateralmente, dispensou os americanos de terem visto para entrar no Brasil (embora os brasileiros sigam obrigados a trilhar as catacumbas da burocracia para ter um carimbo no passaporte que lhes permita pisar em solo estadunidense) –tudo para prestar vassalagem ao seu ídolo Donald Trump, eleito pelas falanges bolsonáricas como o farol do conservadorismo mundial. Foi assim, de novo, quando interveio atabalhoadamente numa decisão interna da Petrobras e travou o reajuste do preço do diesel e derrubou o valor da companhia em dezenas de bilhões de reais.
A mesma coisa aconteceu na semana passada, quando Bolsonaro ordenou que o Banco do Brasil tirasse do ar um anúncio de TV dirigido ao público jovem, cujos hábitos são menos caretas do que preconiza o discurso hoje em voga no Planalto.
De uma tacada, o presidente desrespeitou a Petrobras, enxovalhou (de novo) suas vãs promessas liberais, humilhou gays, trans, bissexuais e jovens em geral, feriu a dignidade de todos e todas que não cultivam intolerância sexual de nenhuma espécie e decretou a expulsão simbólica do Banco do Brasil de todos os homens que não se definam por usar apartamentos funcionais para “comer gente” e de todas as mulheres que não achem que as meninas devam se vestir de rosa e os meninos de azul.
Para o presidente, qualquer pessoa que não partilhe de sua doutrina de gênero é “persona non grata” no Banco do Brasil. Com ele, o sexismo se tornou critério ordenador da estética publicitária e filtro de seleção de correntistas de uma casa bancária que se definia como pública. Ele quer um Banco do Brasil em que somente os heterossexuais possam abrir conta, e se isso implicar perda de clientes, de valor, de capital, não importa. Para ele, o patrimônio do povo brasileiro está hierarquicamente subordinado à moral sexual que ele professa (ou acha que professa).
Sigmund Freud, certa vez, em correspondência ao amigo suíço Oskar Pfister, escreveu que às vezes era preciso agir como o artista que compra suas tintas com o dinheiro do orçamento doméstico e depois, ao pintar suas telas, põem fogo nos móveis para que sua (ou seu) modelo não sinta frio. Freud via nessa atitude do pintor um compromisso radical com a arte. O artista, porém, queima os móveis da casa dele, particular. Freud jamais fez a mesma recomendação a um governante.
Já tivemos por aqui presidentes que vendiam estatais para pagar salários correntes e outros assaltavam o erário para comprar gravata de butique e financiar divertimentos de pouco decoro. Mais raros são os que põem fogo na coisa pública. O imperador romano Nero fez isso em Roma, já sabemos, mas ele pelo menos achava bonito ver a cidade em chamas. O caso presente está mais para a feiura do que para a beleza. O presidente não se deleita ao ver as cifras em combustão, apenas acha feia, repulsiva, a imagem de quem não é como ele acha que é, acha feio o marcador sexual que não é igual ao que ele julga ser o seu.
O chefe de governo age como se precisasse, doentiamente, extirpar de seu horizonte visual qualquer signo de sexualidades não convencionalíssimas. Contemplá-las, para ele, parece ser insuportável. Freud certamente não o classificaria como um “artista” doido. Talvez tivesse outra pista para interpretar tamanha obsessão, mas isso não é da nossa conta.
Voltando então ao estrito interesse público, é o caso de alertar: se deixarmos –e até aqui estamos “médio” deixando–, esse governante vai seguir usando o Estado como combustível de suas fogueiras inquisitoriais. Primeiro, vai lançar suas labaredas obscurantistas (que as há) para expulsar a homoafetividade do Banco do Brasil. Depois, vai passar aos expurgos mais definitivos.
Eugênio Bucci, Jornalista e professor da ECA-USP
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O PODER BRIGA COM A SOMBRA

Artigo de Fernando Gabeira
O governo deu um passo na reforma da Previdência, mas continua no clima de barraco eletrônico, com grupos internos se atacando.
Não entro em detalhes, nem me interesso por personagens. Persigo um quadro um pouco maior.
Nele, a primeira ideia que surge dessas incessantes brigas é a ausência da oposição, ocupando ampla e seriamente o seu espaço. Na falta dela, o governo não tem com quem brigar e resolve brigar consigo próprio.
A cena agora revela mais abertamente uma tensão entre presidente e vice. É uma dupla singular para quem observa o recente período democrático. Na última viagem a Brasília, o fotógrafo Orlando Brito me mostrou a imagem da posse de Fernando Henrique Cardoso. No carro aberto, o vice Marco Maciel levantava a mão, de olho na altura da mão de Fernando Henrique. Ele não queria que acidentalmente seu braço estivesse mais elevado.
Marco Maciel era rigoroso na interpretação do papel do vice. Entre Temer e Dilma, houve um período em que a relação esquentou, terminando com aquela carta em tom de bolero: você não se importa comigo, sou apenas um vice decorativo.
Era, na verdade, uma carta de despedida. Temer já se preparava para substituir Dilma.
No caso Bolsonaro-Mourão, teoricamente tinham tudo para se complementar. Poderiam ter até combinado uma divisão de trabalho: Bolsonaro falaria para seus adeptos; Mourão faria a ponte com os setores que, por pura rejeição ao PT, votaram sem concordar com tudo.
Mas a política não se faz apenas com teorias. Ela é mediada por nossas paixões humanas. Sem combinar suas posições, agindo desorganizadamente, acabaram caindo na armadilha de sempre: até que ponto o vice pode ser protagonista?
No princípio da campanha, Mourão parecia tão ou mais conservador que Bolsonaro. Com o tempo, foi abrandando seu discurso, voltado para o mercado financeiro, a imprensa, a diplomacia.
Até que ponto Mourão quis apenas manter a amplitude da frente que elegeu Bolsonaro, até que ponto seu protagonismo é a maneira de se diferenciar dele, mostrar-se como uma alternativa?
Isso dá margem para tantas nuances interpretativas que prefiro avançar um pouco na tese inicial. Não importa o que aconteça com Mourão, um governo tão estreito como o de Bolsonaro certamente terá novas tensões internas, sobretudo pela ausência de uma forte oposição. Um efeito colateral dos confrontos entre alas do governo é o tiroteio contra as Forcas Armadas. O que se diz sobre os militares em posts e lives da direita, não se dizia nem nos panfletos da extrema esquerda no tempo da Guerra Fria.
Não me importo com textos que tentam interpretar o golpe de 64 como algo realizado pelos civis, muito menos com a afirmação de que os militares destruíram os políticos de direita.
O mundo da internet é recheado de interpretações, eletrizado por teorias conspiratórias. Por que perder tempo em desfazê-las?
As coisas mudam de figura quando os ataques às Forcas Armadas são postados na conta do próprio presidente da República.
É algo tão grave, em termos políticos, como a postagem do golden shower. Não creio que Bolsonaro compartilhe realmente da tese de que as Forcas Armadas no Brasil são uma nulidade. Todo os que viajam pelo Brasil podem testemunhar a ação positiva do Exército. Se quiser reduzir o aprendizado a duas situações, basta ir à fronteira com a Venezuela, ou mesmo às cidades mais secas do Nordeste, onde o Exército organiza o abastecimento de água.
Quem gosta de ler também pode ter acesso às obras que militares têm publicado. Outro dia, resenhei o livro do coronel Alessandro Visacro sobre “A guerra na era da informação”. Acabo de receber o livro “Direito internacional humanitário”, do coronel Carlos Frederico Cinelli. Um estudo sobre a ética em conflitos armados.
As Forcas Armadas não divagam sobre filosofia ou política, mas cuidam de temas ligados à sua atividade principal.
Quem escolheu um general como vice foi o próprio Bolsonaro. Tem de arcar com sua escolha. Se quiser trocar de vice, que o faça em 2022, se for candidato.
A comparação das fotos de posse de Fernando Henrique e Bolsonaro é sintomática. No carro de FH, Marco Maciel obcecado em ser discreto; no carro de Bolsonaro, a ausência. Em seu lugar, Carlos Bolsonaro, protegendo o pai.
O protagonismo de Mourão foi suprimido no ritual. Naquele momento, o drama, como dizia o poeta Drummond, já se precipitava sem máscaras. Era só olhar.
Artigo publicado no Globo em 29/04/2019
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O MOTORISTA DO BRASIL

Leandro Colon, Folha de S.Paulo
“Decisão nossa: não teremos mais nenhuma nova lombada eletrônica no Brasil”, declarou o presidente Jair Bolsonaro no dia 7 de março. Segundo ele, “é quase impossível viajar sem receber uma multa”.
Na visão do chefe da República, o problema não é o motorista imprudente, mas o suposto excesso de vigilância com objetivo de dar lucro a quem explora o setor.
Dias depois daquela declaração, o governo anunciou o envio ao Congresso de projeto para aumentar de 20 para 40 pontos o limite exigido para a suspensão da carteira de habilitação, em um período de 12 meses. 
Bolsonaro já tentou, sem sucesso, emplacar uma proposta parecida quando era deputado. Além de diminuir o rigor da punição, ele pretende aumentar o prazo de renovação da CNH de cinco para dez anos.
Reportagem publicada pela Folha neste domingo (28) mostrou que a família do presidente está longe de ser um exemplo de boa conduta no trânsito. Tem de tudo nos prontuários: avanço no farol vermelho, excesso de velocidade, estacionar em local proibido, falar ao telefone durante a viagem e falta de licenciamento.  
A primeira-dama, Michelle, e Flávio Bolsonaro, senador e filho do presidente, estouraram o limite de 20 pontos. O Detran-RJ alega que ainda não abriu processo para suspender a carteira da mulher do presidente por causa de um inacreditável passivo de 697 mil ações do tipo.
Em cinco anos, Bolsonaro cometeu seis infrações, duas delas “gravíssimas”. O presidente, segundo os registros do Rio, trafegou em uma faixa exclusiva para ônibus, em Niterói.
Bajulado com motoristas e carros oficiais, Bolsonaro nem precisa dirigir mais. Mesmo assim, conseguiu a proeza de cometer uma infração ao dar uma escapada de moto no Guarujá no feriado de Páscoa. 
Folha mostrou que caiu o número de mortes onde há radares. Bolsonaro não está nem aí. Age com
argumentos e teorias que muitas vezes não fazem sentido. Dirige o país como ele e sua família conduzem os próprios carros.
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A POLÍTICA EXTERNA

Matias Spektor, Folha de S.Paulo

É hora de construir a política externa pós-Bolsonaro

Esta é minha última coluna neste espaço.
Quando este jornal me convidou para escrever, há sete anos, a ideia era inusitada. Nenhum grande veículo tinha um colunista dedicado à política externa brasileira. Para minha sorte, muitos leitores fizeram da agenda internacional a sua pauta.
Esses anos assistiram à expansão do debate público sobre temas internacionais. Hoje, dezenas de profissionais expressam opiniões sobre o assunto no Twitter e no Facebook.
Isso é muito positivo. A velha redoma que limitava a conversa a um punhado de embaixadores aposentados se estraçalhou, aumentando a diversidade e a densidade do debate.
Acontece que essa transformação também trouxe coisas negativas. Nas redes sociais, a competição por “likes” premiou argumentos de apelo fácil, muitas vezes inverídicos ou incapazes de resistir ao mínimo escrutínio. O debate ficou menos qualificado.
Isso é um problema sério porque ocorre ao mesmo tempo em que colapsa o que havia de consenso na política externa da Nova República. Quem termina ocupando o espaço é a turma que hoje comanda a agenda internacional do governo Bolsonaro.
Eu admito a minha parcela de culpa: como tantos outros acadêmicos, não percebi que um dos efeitos da vitória de Donald Trump seria o nascimento do antiglobalismo messiânico à brasileira.
O resultado é nefasto porque a direita populista que hoje dá as cartas é perigosa. Não se trata de um bando tresloucado: em suas decisões, há método e projeto. A direção do que vem por aí é péssima para o país.
É por isso que chegou a minha hora de parar. A partir de agora, vou trabalhar para promover o pensamento e o debate sobre o futuro da política externa de outras formas.
Trata-se de uma tarefa urgente porque o grupo que se encontra no poder um dia será posto para fora pela força do voto popular. Eles deixarão um rastro de destruição, e cabe à sociedade começar a imaginar a reconstrução.
Seria um erro grotesco acreditar que isso ocorrerá por força da natureza. Afinal, nem direita, nem esquerda têm alternativas decentes para pôr no lugar.
Na esquerda, muita gente acredita ser possível reeditar a diplomacia de Lula. Na direita, vozes influentes ainda defendem a volta à plataforma de política externa elaborada pelo tucanato para as eleições de 1994.
Como sociedade, podemos e devemos fazer melhor. Deixo a coluna para pôr em prática aquilo que defendi durante todo esse tempo: um esforço coletivo para conceber uma política externa nova, capaz de ajudar a sociedade brasileira a sair do buraco em que se encontra.
Obrigado, leitor, por me acompanhar nesta jornada.
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sábado, 27 de abril de 2019

RECRUTA ZERO

Ruy Castro, Folha de S.Paulo

São mesmo outros tempos. Hoje, pode-se dizer qualquer coisa do Exército sem que nada aconteça. Mas, nos anos 60, quando houve o que Jair Bolsonaro afirma que não foi ditadura, era diferente. Estudantes, jornalistas ou simples cidadãos, tínhamos de andar na ponta dos pés. Uma referência aos militares como “gorilas”, feita de passagem para um amigo na porta do seu prédio, podia ser ouvida pelo porteiro e relatada ao general de pijama que morava no seu andar. Sei disso porque meu vizinho general, aliás, de pijama, veio me cobrar no hall do elevador.

Em 1966, Nara Leão, a musa do protesto, disse a um jornal que os militares “podiam entender de canhão e metralhadora, mas não ‘pescavam’ nada de política”. E que, mesmo assim, no dia do golpe, tinham usado “veículos com pneu furado”. Costa e Silva, ministro da Guerra, quis enquadrar Nara na Lei de Segurança Nacional. O que motivou Ferreira Gullar a escrever: “Moço, não se meta/ Com uma tal de Nara Leão/ Que ela anda armada/ De uma flor e uma canção”.

Dois anos depois, quando o deputado Marcio Moreira Alves, em discurso para as cadeiras vazias da Câmara, exortou as moças brasileiras a se recusarem a dançar com os cadetes nos bailes do dia 7 de setembro, o governo tentou processá-lo, no que foi barrado pelo Congresso —e, por isso, decretou o AI-5, que nos asfixiou por dez anos.

Hoje, o astrólogo Olavo de Carvalho pode tachar os militares de “covardes”, “pústulas”, “incultos”, “preguiçosos”, “um bando de cagão”, e chamar o general e vice-presidente Hamilton Mourão de “idiota” e até acusá-lo de pintar o cabelo.

Como minha carreira militar, de reles reservista de terceira categoria, limitou-se a namorar a filha de um coronel, por acaso cassado em 1964, não concordo nem discordo. Mas o presidente Bolsonaro, cuja passagem pelo Exército lembra a do Recruta Zero, parece concordar com as opiniões de seu mestre.
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POR QUE TEMOS TANTO ÓDIO ?

Do O GLOBO
Por que temos tanto ódio? Especialistas apontam raízes da atual ira nacional
Afinal, o que houve com a imagem do brasileiro pacífico e cordial?
RIO — O texto de apresentação da exposição que começará a percorrer o Brasil nas próximas semanas é taxativo: “Se você aprendeu na escola que este é um país pacífico e conciliador, nas próximas páginas vai desaprender.” Foram as palavras escolhidas pela historiadora Angela Alonso (USP) para sintetizar a mostra “Conflitos; fotografia e violência política no Brasil 1889-1964”.
Convidadas pelo Instituto Moreira Salles (IMS), Alonso e as também historiadoras Heloisa Murgel Starling (UFMG) e Angela Castro Gomes (UNI-RIO) chamam a atenção para um sentimento que o Brasil não tem conseguindo disfarçar: o ódio. A imagem do brasileiro como um povo pacato e cordial, vendida e comprada durante décadas, está na berlinda. Segundo especialistas, já fomos mais afáveis, mas nas últimas décadas a hostilidade assumiu um papel banal em nosso cotidiano. Um exemplo tão tolo quanto verdadeiro: o atual mascote da seleção de futebol é um pássaro que teria tudo para ser pacífico, mas ganhou popularidade justamente por seu semblante enfezado, pronto para a briga: o Canarinho Pistola.
Após passar por Rio e São Paulo, a mostra do IMS foi compactada num Caminhão Museu e visitará vários estados levando imagens que chocam e levam a refletir sobre a origem de nossa ira e sua face atual.
— O que vejo de novo hoje é que essa violência está disseminada na sociedade como uma prática banal. Conflito e repressão sempre existiram, mas hoje é algo vazio, sem pensamento e sem propósito — afirma Heloísa Starling.
A culpa é do outro
Alguns exemplos recentes expõem o fenômeno. O massacre de 10 pessoas na escola Raul Brasil, em Suzano (SP); a ação de um guarda civil de Ouro Preto, durante a Páscoa, que pisoteou um tapete de serragem em homenagem à vereadora Marielle Franco (vereadora do Rio assassinada em 2018); ameaças em universidades cariocas contra mulheres e gays, entre outros.
— Vejo reações ressentidas de pessoas que se sentem vítimas — diz Heloísa Starling. — E quando as pessoas se sentem vítimas e culpam os outros, surge a intolerância.
A esta altura de sua análise sobre o atual contexto social brasileiro, a historiadora cita o personagem que dá título a um conto e um livro de Rubem Fonseca, “O cobrador” (1979): um homem ressentido que anda pela vida cobrando o que considera que a sociedade lhe deve.
Dentro dessa lógica captada pelo escritor carioca há 40 anos, o outro passa a ser visto como um inimigo em função de um pensamento binário — o certo e o errado, o bom e o mau. Nos últimos anos, técnicas para lidar justamente com esta matriz de pensamento têm se tornado mais conhecidas no Brasil, entre elas a da Comunicação Não Violenta (CNV), criada pelo psicólogo americano Marshall Rosenberg.
Dois de seus principais promotores no país são Sandra Caselato e Yuri Haasz, que nos próximos dias realizarão um grande seminário sobre o assunto, com mais de 120 pessoas de diferentes países. Segundo contou Sandra, a demanda por cursos de CNV tem crescido de forma expressiva.
— Uma das metas da CNV é mudar o paradigma do ganha-perde para um ganha-ganha. A ideia é tornar a vida melhor para todos e não somente para alguns. As pessoas precisam se conectar mais, é preciso transformar as relações, todo o sistema — diz Sandra Caselato.
Sandra e Yuri têm trabalhado em diferentes setores, entre eles no Judiciário, para tentar aproximar posições e criar ambientes de maior empatia. Para ambos, “se for mantido o paradigma do certo e o errado ficará aberta a porta que legitima a violência em nossa sociedade”.
A imposição de uma lógica binária, o sim ou o não, também é vista como parte essencial da problemática do ódio e da consequente violência no Brasil pelo filósofo Eduardo Jardim. Basicamente, salienta ele, “porque não deixa opção de saída”.
— Um lado sempre vê o outro como inimigo, principalmente no contexto político, e disso nada sai — assegura Jardim.
Antagonismo e admiração
O desafio de conviver com outro que é diferente é um dos elementos centrais do livro “Correspondência” (Editora PUC), que revela cartas entre o escritor Mário de Andrade (1893-1945) e o pensador católico Alceu Amoroso Lima (1893-1983)trocadas durante anos, até meados da década de 1940. Jardim participou recentemente de um debate sobre o livro e destacou como, neste caso, duas figuras totalmente antagônicas conseguiram preservar a amizade e o respeito mútuo. Em carta de dezembro de 1943, Mario de Andrade diz ao amigo: “quaisquer que sejam os motivos de nossas recíprocas incompreensões, qualquer que seja a variedade de nossos caminhos, quero dizer-lhe quanto bem lhe quero desde os tempos remotos do seu primeiro livro, o quanto admiro a gravidade, a importância, a originalidade e a força de sua obra”.
— Já fomos muito mais tolerantes, e este livro é prova disso — defende o filósofo. — Este ódio e esta intolerância não levarão a nada, temos de ir além disso e aceitar o convívio das diferenças.
Seu amigo e colega Renato Lessa, professor associado da PUC-Rio e pesquisador associado à Universidade Sorbonne, de Paris, diz nunca ter visto “este ódio na política brasileira” e responsabiliza, em grande medida, autoridades extremistas que “disseminam este ódio ao resto da sociedade”.
— Muitas pessoas ouvem certos estímulos e resolvem passar ao ato, sentem que agora podem, que a violência foi liberalizada — observa Lessa.
A violência e o ódio na política não são novos, admite Heloísa. E faz um alerta:
— Esta violência que estamos vendo hoje é perigosa porque indica que a política, que é pluralismo, está morrendo. A sociedade não está praticando valores democráticos.
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MORRE CACAU

Do O POVO
A histórica militante de esquerda Maria do Carmo Serra Azul, mais conhecida como Cacau, morreu aos 68 anos na madrugada deste sábado, 27. Ela ficou conhecida pela atuação política durante a ditadura militar, no qual foi presa e torturada durante 15 dias no 23º Batalhão de Caçadores (23º BC). O velório acontece na tarde deste sábado, na funerária Ethernus, na Aldeota.
A ativista começou sua militância ainda na adolescência, aos 13 anos, na Juventude Estudantil Católica. Quatro anos depois, Cacau foi diretora dos estudantes secundaristas do Ceará e participou da chamada Revolta das Saias.
Em 1970, durante o período ditatorial, a militante foi detida e interrogada devido à suspeita de ligação com o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR). Dois anos depois, foi presa e brutalmente torturada no DOI-Codi, órgão de repressão do governo brasileiro subordinado ao Exército. Cacau sofreu três paradas cardíacas devidos aos choque e afogamentos, tendo que ser reanimada pelo médico presente nas sessões de tortura.
Em um encontro de vítimas da ditadura militar, realizado na Assembleia Legislativa em 2014, Cacau ressaltou que a tortura era uma prática comum no regime. “Diziam que as torturas não eram institucionalizadas, mas é mentira", relata.
Ela ainda comentou no evento que inicialmente as manifestações de protesto contra o regime militar eram pacíficas, mas que isso mudou devido ao comportamento do governo. "Devido à violenta repressão, formaram-se grupos de autodefesa, que se tornaram posteriormente os grupos da luta armada”, afirmou a militante.
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MAIA RESSUSCITA A CENTRO-ESQUERDA

Do Blog do Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense

A instalação da comissão especial que vai discutir a proposta de mudanças na Previdência enviada ao Congresso pelo governo Jair Bolsonaro vai muito além do debate de mérito da reforma, altera o eixo da relação da Câmara com o governo e neutraliza a polarização PT versus PSL, que vem dando o tom nos debates de plenário e comissões. Rodrigo Maia, presidente da Casa, prestigiou o chamado Centrão ao entregar o comando da comissão ao deputado Marcelo Ramos (PR-AM); ao mesmo tempo, ressuscitou a centro-esquerda, ao decidir que o relator da comissão será o tucano Samuel Moreira (PSDB-SP). Esse blocão reagrupa o chamado “centro democrático” e aprova o que quiser na Câmara.

A comissão é formada por 49 integrantes titulares e 49 suplentes. A distribuição das vagas entre as legendas é proporcional às respectivas bancadas na Câmara. Ramos assumiu a tarefa com o discurso de que seguirá as regras regimentais na condução das atividades da comissão e que respeitará os partidos de oposição. Trocando em miúdos, pretende adotar uma linha de independência em relação ao governo: “O regimento vai orientar os nossos trabalhos”, disse.

A indicação de Moreira foi uma carta tirada da cartola de Maia, porque o relator da reforma da Previdência participa de um grupo de deputados experientes, ligados a PSDB, PMDB e Cidadania, partidos que ficaram de fora do segundo turno das eleições presidenciais de 2018. Em silêncio, o grupo rearticulou a centro-esquerda na Câmara, em aliança com Maia, que assim passou a caminhar com duas pernas. A outra é o chamado Centrão (PP, PR, DEM, PRB e Solidariedade). Na primeira entrevista, Moreira deu a linha que pretende adotar na construção do relatório, negociando com o governo e a oposição: “A Previdência é um direito social; porém, uma responsabilidade fiscal. Vamos trabalhar dentro de duas premissas”, avisa.

Gordura

A liberação dos estudos realizados pelo governo para elaborar seu projeto de reforma da Previdência mostrou que realmente havia gordura para queimar no plano do governo. Os R$ 127,2 bilhões de economia previstos com as mudanças no BPC e na aposentadoria rural equivalem a 10% da economia total estimada pelo governo. De acordo com o documento divulgado pelo Ministério da Economia, a contenção de gastos com a reforma seria de R$ 1,236 trilhão também em 10 anos. O ministro Paulo Guedes, publicamente, sempre estabeleceu como meta R$ 1 trilhão. Isso explica o fato de os números terem sido mantidos em sigilo até a aprovação da admissibilidade da reforma pela Comissão de Constituição e Justiça, na terça-feira passada.

Com a instalação, começa a contar o prazo regimental de 10 sessões do plenário para a apresentação de emendas à proposta por parte dos deputados. Mas a o debate somente vai esquentar depois do feriadão do 1º de maio. Ninguém tem dúvida de que a reforma será aprovada, pois a esquerda que se opõe não tem votos suficientes para barrá-la, a não ser naqueles pontos que realmente atingem os trabalhadores de mais baixa renda, contra os quais até o Centrão se manifestou. Mas o tamanho da economia a ser feita dependerá muito do empenho do governo para chegar perto do R$ 1 trilhão desejado por Guedes.

Rodrigo Maia cobra do governo mais articulação de sua base. O presidente Bolsonaro já disse que espera uma economia de pelo menos R$ 800 bilhões em 10 anos. Maia alerta, porém, que o tamanho da economia dependerá do empenho do governo nas negociações. Paulo Guedes insiste numa economia de pelo menos R$ 1 trilhão. O pano de fundo é o regime de capitalização, cuja transição custaria pelo menos R$ 370 bilhões. Por enquanto, a capitalização está no telhado.

Mais um

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao Supremo Tribunal Federal a condenação do senador Fernando Collor de Mello (PROS-AL), pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, a uma pena de 22 anos e oito meses de prisão. Acusado de receber mais de R$ 30 milhões em propina por negócios da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras na venda de combustíveis, Collor é mais um ex-presidente da República enrolado no escândalo da Petrobras, investigado pela Lava-Jato. A defesa de Collor afirma que a denúncia não traz provas concretas de que o senador recebeu o dinheiro de propina. O relator é o ministro Edson Fachin.
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JOGO DE EMPURRA

Zeina Latif, O Estado de S.Paulo

Não se trata de apontar vilões. Mas é inegável que o País precisa discutir medidas urgentes, não só para conter o crescimento dos gastos com o funcionalismo, mas também reduzi-los. O Estado, que deveria servir aos cidadãos, tem seus recursos fiscais bastante comprometidos com a folha dos servidores.

No nível federal o quadro é menos grave. Em 2018, o gasto com a folha consumiu 24% da receita líquida, cifra que já foi mais elevada no passado. A reforma da Previdência de 2003, que eliminou a integralidade das aposentadorias para os servidores que ingressaram a partir daquele ano, vai contribuir para reduzir esse valor adiante.

É nos Estados que o quadro é dramático. De todos os lados, os números são muito ruins: o déficit previdenciário na casa de R$100 bilhões e a conta de restos a pagar em mais outros R$100 bilhões. Fora os repasses constitucionais a municípios atrasados. A maioria dos Estados não consegue cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que estabelece um teto de 60% da receita líquida corrente para o pagamento da folha. O gasto com a Previdência (mais de 40% da folha) é o que mais cresce: média de 7,6% ao ano descontada a inflação, segundo o Ipea, entre 2013 e 2018.

Pior, esse gasto vai crescer em ritmo mais acelerado nos próximos anos, partindo de um patamar já elevado – em 2017, para cada 100 funcionários na ativa, havia 88 inativos, segundo o Ibre-FGV. O Ipea aponta que, em 2015, 40% do funcionalismo tinha 49 anos ou mais. Os próximos anos serão de avalanche de aposentadorias. Teremos, pois, ainda muitos anos de deterioração dos serviços públicos.

A reforma da Previdência seria a luz no fim do túnel para os Estados, mas há um longo caminho a ser percorrido até que a reforma se traduza em redução dos gastos com inativos como proporção do PIB. É crucial, portanto, que seja aprovado o aumento da contribuição previdenciária. Impor idade mínima e aumentar o tempo de contribuição não é suficiente para estancar o agravamento da crise dos Estados.

É essencial que o Supremo Tribunal Federal vote a favor do dispositivo da LRF que permite que os governadores reduzam a jornada de trabalho e a remuneração do funcionalismo em caso de crise fiscal. A pressão de corporações do setor público sobre a Corte para não derrubar a liminar que congelou esse dispositivo não deve ser pequena.

Outro tema que o Brasil precisa discutir é a flexibilização da estabilidade dos servidores. Ela deveria ser restrita às carreiras de Estado e condicionada ao mérito. Passado um período probatório, com comprovação de bons serviços, a estabilidade poderia ser conquistada.

Diante desse cenário de inevitável ajuste, a elite dos servidores, com capacidade de bloquear reformas, reage. Além da pressão no Congresso e os sinais de força emitidos por várias corporações, haverá certamente propostas de emendas à PEC da Previdência. Acredito que a negociação com os servidores será a batalha mais difícil do governo.

Os diferentes graus de crise fiscal entre entes da federação e entre Estados acabam estimulando um jogo de empurra. Jair Bolsonaro, que pouco faz para defender sua reforma da Previdência, muito menos fará para ajudar os Estados. Assim, há o risco de a reforma da Previdência estadual ficar de lado, deixando para as assembleias estaduais a tarefa de aprová-la. Os governadores, por sua vez, não parecem muito dispostos a defender publicamente a reforma. As promessas de apoio feitas em Brasília não sobrevivem ao caminho de volta para casa. A briga, que deveria ser de todos, acaba não sendo de quase ninguém.

Um esforço coordenado dos governadores para aprovar a reforma da Previdência (e outras mais) parece algo distante. Ter comportamento de “caroneiro”, esperando que os demais assumam o desgaste político, é tentador. Nesse caso, o resultado final é conhecido na literatura econômica: uma reforma tímida, aquém do que ocorreria em caso de esforço coletivo. Fica a angustiante pergunta: quanto terá de piorar para melhorar?

*Economista-chefe da XP Investimentos
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A JUSTIÇA QUE QUEBRA O BRASIL

Da Folha de S.Paulo

A maioria dos ministros do Supremo decidiu que o governo vai deixar de arrecadar uns muitos bilhões de reais em impostos, em benefício de grandes empresas. Pelo menos R$ 10 bilhões por ano, talvez até R$ 16 bilhões.

Foi nesta quinta-feira (25), em decisão que beneficiou firmas que fazem (ou farão ainda mais) negócios com a Zona Franca de Manaus, um processo que rolava desde 2008.

De onde vai sair o dinheiro? Ninguém sabe ainda, mas o governo federal terá de fazer mágicas e milagres sinistros.

A alternativa é mudar parte da lei de impostos sobre produtos da Zona Franca, o que é sempre uma guerra que mobiliza de políticos do Amazonas e do Norte a empresas do Sudeste e do Sul.

Não vai rolar, pois o governo terá de mendigar votos pela reforma previdenciária, não deve arrumar mais briga. Logo, vai haver corte.

Onde, repita-se?

Por exemplo, no ano passado, todo o investimento federal em obras viárias (estradas etc.) foi de pouco mais de R$ 10 bilhões. Neste ano, deve ser ainda menos.

Ou seja, a fim de pagar de uma talagada a graça ofertada pelo Supremo, seria necessário na prática fechar o Ministério dos Transportes ou enormidade equivalente, como cortar o dinheiro do Bolsa Família pela metade.

Noutro exemplo, a graça tributária decretada pelo Supremo levaria um pedação do esforço de contenção de gastos da Previdência.

Caso a reforma seja aprovada sem modificações, o governo estima que deixaria de gastar R$ 174 bilhões com aposentadorias “do INSS” nos primeiros cinco anos de vigência da mudança (para ser preciso, com despesas do Regime Geral de Previdência Social, o que não inclui servidores). A decisão do Supremo, pois, no limite vai custar o equivalente a 46% dessa economia suada em meia década.

A decisão do STF é um caso enrolado, não cabe aqui e agora nestas colunas. Mas, em suma, empresas que compram insumos na Zona Franca de Manaus terão direito a um desconto de imposto que apenas faz sentido no mundo do malabarismo jurídico.

Além de fazer mais um buraco no cofre furado e vazio do governo, a medida tende a causar outras distorções e consequências impremeditadas.

Empresas que conseguirão grandes descontos de impostos, por assim dizer, com a decisão do Supremo, podem passar a comprar apenas insumos básicos na Zona Franca, deixando a produção mais complexa em uma fábrica de outra região do país. Manaus ficaria com a produção rudimentar.

Há mais. Em tese, as empresas que mais se beneficiam da medida são aquelas com cadeias de produção mais complexa e têm a capacidade e a organização de manter fornecedores distantes. Parece a descrição de uma empresa grande ou já bem estabelecida na praça, certo?

Essas reduções de impostos, de resto, criam distorções menos visíveis, mas daninhas. Uma empresa mais eficiente (que faz por menos e/ou com mais qualidade) é prejudicada pela concorrência da firma que paga menos impostos.

O monte de tributações especiais do Brasil causa várias outras distorções, que também não cabem aqui e agora nestas colunas, mas são motivos sérios de ineficiência econômica e transferências injustificáveis de renda.

O Supremo acaba de criar um novo capítulo no imenso compêndio nacional de demências e iniquidades tributárias. De quebra, arruinou ainda mais um governo que em breve não terá como pagar contas básicas, embora os salários do Judiciário estejam garantidos. Né.

Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).
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sexta-feira, 26 de abril de 2019

BOLSONARO É O SEU PIOR ADVERSÁRIO

Do Blog do Noblat, VEJA
Quando ele abre a boca é um desastre
O problema não é Bolsonaro meter-se em tudo e em qualquer coisa. Lula chegou a opinar sobre o cardápio de comidas servidas pelo Itamaraty em recepções oficiais. E Dilma em campanhas de propaganda do governo.
O problema é Bolsonaro vetar a exibição de um comercial de TV do Banco do Brasil só porque a maioria dos personagens ali mostrados era negra, jovem, e dançava rap. O diretor de marketing do banco perdeu o emprego por isso.
O presidente do banco, não. Havia aprovado o comercial. Mas ao receber um telefonema de reclamação de Bolsonaro, concordou com ele, proibiu o comercial e pôs a culpa no diretor demitido em seguida.
Essa foi só mais uma trapalhada das tantas protagonizadas pelo presidente da República desde que tomou posse. Cada uma delas subtrai ao governo mais um naco de popularidade, conforme atestam as pesquisas.
No campo do comportamento, chamemos assim, Bolsonaro, ontem, cometeu outra atrapalhada. Perguntaram-lhe sobre turistas estrangeiros atraídos pela liberalidade dos costumes brasileiros. Então Bolsonaro respondeu assim:
– Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade. Agora, não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay aqui dentro.
Ouviu de volta do escritor Paulo Coelho: “Mulheres brasileiras não são uma commodity. Turismo sexual não é razão para visitar o Brasil”.
Racismo “é a discriminação social baseada no conceito de que existem diferentes raças humanas e que uma é superior às outras”.
Homofobia significa “aversão irreprimível, repugnância, medo, ódio, preconceito que algumas pessoas, ou grupos nutrem contra os homossexuais, lésbicas, bissexuais e transexuais”.
Misoginia “é a repulsa, desprezo ou ódio contra as mulheres”.
Com essas e outras, Bolsonaro dá razão aos seus adversários que o acusam de ser racista, homofóbico e misógino.
Segura essa, ô Flávio!
Me inclua fora!
O presidente Jair Bolsonaro chamou seu filho Flávio, o 01, para uma conversa e avisou: se os rolos do Queiroz pesarem para o seu lado não conte comigo. Arranje-se sozinho. Minha proteção como presidente não terá.
Daí o nervosismo do senador conferido pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, em um encontro recente. Flávio está uma pilha, recolhido à máxima discrição. Teme o futuro do próprio mandato.
Para completar, a Justiça do Rio negou liminar pedida por ele para suspender a investigação contra Queiroz. No pedido, Flávio apontou razões parecidas com as apresentadas por ele antes e negadas pelo Supremo.
Não fosse Queiroz um ex-assessor de confiança de Flávio e amigo de mais de 40 anos de Bolsonaro, e a essa altura já estaria preso. Mas operado de um câncer no estômago, desapareceu. À justiça só deu explicações por escrito.
É acusado de ter movimentado R$ 1,2 milhão em sua conta sem ter renda suficiente para tal. Suas ligações com milicianos também estão sendo apuradas. Ele empregou parentes de milicianos no gabinete de Flávio quando o 02 era deputado estadual no Rio.
Paulo Guedes agradece!
Pode sobrar também para Moro
Se pudesse, o ministro Paulo Guedes, da Economia, já teria dito com todas as letras ao presidente Jair Bolsonaro: Se não quer ajudar na aprovação da reforma da Previdência, pelo menos não atrapalhe tanto.
Para variar, Bolsonaro, ontem, tornou mais difícil a aprovação da reforma nos termos pretendidos por Guedes. A reforma do ministro prevê uma economia de 1 trilhão. Bolsonaro disse que Guedes aceita uma redução para 800 bilhões.
Se de saída você admite um abatimento desse tamanho, imagine o que não será obrigado a conceder mais tarde quando a negociação com o Congresso começar para valer. Ou Bolsonaro é tosco ou está sendo desleal com Guedes.
Com o ex-juiz Sérgio Moro ele foi desleal ao revelar que não se opõe em devolver o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para o Ministério da Economia.
A principal função do Coaf é a de examinar e identificar possíveis práticas relacionadas à lavagem de dinheiro, corrupção e financiamento do terrorismo.
Uma das condições exigidas por Moro para assumir o ministério da Justiça e da Segurança Pública foi ter o Coaf sob seus cuidados. Bolsonaro concordou sem pestanejar. Agora, fraqueja.
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DO CRACK AO ÁLCOOL

Editorial Folha de S.Paulo

Políticas públicas acerca da dependência química constituem um campo minado por convicções arraigadas, muitas ancoradas em concepções ideológicas diametralmente opostas. Por isso mesmo há que fundamentá-las em dados objetivos, como os obtidos em pesquisas sobre padrões de consumo.

Preocupa, assim, a revelação de que o governo bloqueia há mais de um ano a divulgação do 3º Levantamento Nacional Domiciliar sobre o Uso de Drogas, completado em 2016 pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) —uma entidade da estrutura federal.

A Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, encomendou o estudo por R$ 7 milhões, mas depois considerou que não haviam sido cumpridos termos do edital e, por isso, estaria comprometida a comparação com resultados anteriores. O conflito é intermediado pela Advocacia-Geral da União.

Uma equipe de 400 técnicos entrevistou mais de 16 mil pessoas em 351 cidades. A Fiocruz defende que empregou a metodologia recomendada e seguiu os parâmetros da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE. A pendenga passou a ser investigada pelo Ministério Público Federal.

A opacidade despertou inevitáveis desconfianças na comunidade de estudiosos da dependência, em particular entre os que defendem ações de redução de danos e não a abstinência incondicional.

Alimentou-se a suspeita de que os resultados das entrevistas conflitam com a política favorecida por setores conservadores desde o governo Michel Temer (MDB). Entidades ligadas à saúde pública e aos direitos humanos pediram a divulgação integral dos dados.

A polêmica ganhou fôlego com reportagem publicada pelo site The Intercept, segundo a qual os números contradizem a hipótese de que haja no país uma epidemia de consumo de drogas, tendo o crack como seu carro-chefe.

Apenas 0,1% da população brasileira teria fumado a pedra derivada da cocaína nos 30 dias anteriores à entrevista —enquanto 30% haviam consumido álcool no período.

Tais cifras em nada diminuem o drama das cracolândias que brotaram em algumas grandes cidades, a mais famigerada na capital paulista. Em contrapartida, tampouco justificam o alarme que leva a um endurecimento contraproducente da repressão policial.

Políticas malsucedidas devem ser reformuladas ou abandonadas à luz da melhor informação. O governo faria melhor em trazer a pesquisa ao debate público, mesmo sob eventuais ressalvas técnicas.
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quinta-feira, 25 de abril de 2019

CENSURA EPIDÊMICA

Eugênio Bucci, O Estado de S.Paulo
Ao trancafiar os cálculos sobre a reforma da Previdência, impedindo jornalistas e, no mais, qualquer brasileiro ou qualquer brasileira de ter acesso aos números, o governo federal ultrapassou (mais uma vez) as imagens mais claustrofóbicas da ficção científica mais pessimista. Nos filmes Blade Runner (baseado num conto de Philip K. Dick) ou Matrix (inspirado no livro Neuromancer, de William Gibson), conhecemos as engrenagens maquínicas de um poder que se desumanizou por inteiro para se converter ele mesmo num ciborgue-leviatã, mas até mesmo ali os seres humanos conseguem, de um jeito ou de outro, fazer contas com dados reais.
As mais famosas distopias do século 20, como 1984, de George Orwell, ou Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, também não nos ajudam nesse campo – embora no livro 1984 exista o Ministério da Verdade, cuja atribuição é construir e instalar as verdades oficiais que são mentiras absolutas. Essa coisa bolsonárica de decretar o sumiço das planilhas em que o governo trabalha para sustentar seu projeto de reforma da Previdência parece conter mais pulsões totalitárias do que o cardápio de expedientes tirânicos imaginado por George Orwell.
Não que o Brasil esteja virando um Blade Runner ou uma Laranja Mecânica (a obra-prima de Stanley Kubrick, cujos fantasmas nos vêm puxar a perna durante estas noites sufocantes de 2019). Não que o totalitarismo se tenha instalado no Brasil. O risco, por enquanto, é mais incipiente, mas é real.
A iniciativa de banir a aritmética do debate político escancara o que vai pela cabeça do comando do Executivo. Se ainda não temos aqui o Ministério da Verdade, e não temos, não é por falta de disposição do poder. Se ainda não viramos uma paródia depressiva de Admirável Mundo Novo, é só porque a malha institucional – um tanto pitimbada, mas efetiva – da nossa democracia tem resistido. Se dependesse dos novos inquilinos da Esplanada, o Ministério da Verdade já estaria em pleno funcionamento.
Nesta hora, a compreensão dos vetores que orientam os atos do poder é tão ou mais decisiva do que a análise do quadro objetivo. A subjetividade instalada no governo conta. As intenções contam – contam porque desnudam o projeto em curso. O governo que aí está pode parecer errático. Nada do que ele propõe dura. As idas e vindas – as tentativas erradas e os erros consumados – se embolam sem que se consiga extrair das condutas destrambelhadas uma linha coerente, lúcida. Para piorar a desorientação randômica das cabeçadas palacianas, há ainda as brigas internas entre facções que, também elas, são desorganizadas e violentas como gangues adolescentes. Num ponto, contudo, esse governo ostenta uma unidade coesa: esse ponto são as investidas contras as liberdades e os direitos. Nisso o impulso essencial da Presidência da República é uno e compacto. Trata-se de um denominador comum que dá uma racionalidade tanática ao desordenamento das aparências. É por isso, enfim, que se tornou essencial entender a subjetividade do delírio autoritário que tomou o poder no Brasil.
A intenção manifesta de reescrever os livros de História do Brasil para limpar a folha corrida da ditadura militar, o revisionismo de afirmar que o nazismo é de esquerda, as ações mais ou menos destrambelhadas para liberar (ainda mais) as armas de fogo se coadunam perfeitamente com essa medida de censurar os números. Vai ver, no entendimento de alguns deles lá em cima, esse negócio de conta de mais e conta de menos também é coisa de comunista. A mentalidade censória agora elegeu uma nova vítima: os algarismos e os sinais da aritmética.
Tudo já seria ruim se a mentalidade censória se restringisse ao Poder Executivo. Mas a situação é pior. O Supremo Tribunal Federal (STF), até ele, agora também enveredou por esse caminho. É sabido desde sempre que, em sua primeira e segunda instâncias, o Poder Judiciário tem cedido, e com frequência, à tentação de impedir que conteúdos jornalísticos alcancem o público. Mas a cúpula do Judiciário, o STF, vinha se pautando por princípios menos antimodernos, resguardando as liberdades e reformando decisões obscurantistas. Este jornal mesmo só se livrou da censura judicial graças ao STF. Em 31 de julho de 2009, o Estado foi proibido de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal. A situação só se normalizou 3.327 dias depois, em 8 de novembro de 2018, quando o Supremo desmontou a censura.
De duas semanas para cá, o cenário no STF mudou. A decisão de um de seus ministros de impor censura ao site O Antagonista e à revista eletrônica Crusoé discrepou da linha habitual da Corte sobre a matéria. Pior: o veto foi imposto no âmbito de um inquérito, sem que tivesse sido formalmente solicitado por uma parte que se declarasse prejudicada. O STF agiu de moto-próprio (de ofício). A medida censória foi revogada dias depois pelo ministro Alexandre de Moraes (pois a decisão era um disparate completo), mas a censura à revista Crusoé maculou a reputação da Corte e abalou a expectativa de segurança jurídica quando o que está em jogo é o livre exercício da profissão de jornalista.
Outra vez, aqui, a subjetividade faz toda a diferença. Por que o STF se desviou por esse caminho? O que vai na cabeça dos magistrados? A resposta a essas perguntas passa por uma incompreensão crônica da nossa cultura jurídica (e da nossa cultura política) do instituto da liberdade de imprensa. Já tratei dessa incompreensão em artigos anteriores (como em Não sabem o que é ‘news’ e querem caçar ‘fake news’, de 24 de maio de 2018).
O horizonte, que já era crítico, traz preocupações adicionais. Se o STF se afasta do papel de proteger as garantias fundamentais, de onde virão os freios e contrapesos para estancar os delírios autoritários do Executivo?
*Jornalista, é professor da ECA-USP
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UM DELÍRIO AMBIENTAL

Do Blog do Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense
Não tem risco de dar certo a intervenção policial-militar do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), com a nomeação de um coronel, dois tenentes-coronéis e dois majores da Polícia Militar de São Paulo para comandar a instituição. A transformação do tema da sustentabilidade num caso de polícia, por capricho pessoal do ministro, não tem precedentes na história das políticas públicas ambientais do país, inauguradas no governo José Sarney, quando foi lançado o programa Nossa Natureza, do qual resultou a fusão de vários órgãos e a criação do Ibama.
Nada contra os militares individualmente, até porque são homens que atuaram intensamente no policiamento florestal. Entretanto, a área exige interdisciplinaridade para uma boa gestão, o que a formação policial simplesmente não garante, embora seja importante para combater os crimes ambientais. Como diria o falecido astrofísico norte-americano Carl Sagan, é o tipo de decisão que somente pode ser atribuída ao “analfabetismo científico”, que está em alta em razão dos conceitos estapafúrdios do presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, com repercussão mundial desde a saída do governo norte-americano do Acordo de Paris.
A propósito de um comentário de Platão sobre o ensino de matemática às crianças do Egito Antigo, Sagan dizia que a ignorância em ciência e matemática nos dias atuais é muito mais danosa do que em qualquer outra época. A raiz dos problemas ambientais brasileiros é uma cultura atrasada, que estimula e protege agressões ao meio ambiente, muitas vezes insanáveis, tanto no meio urbano como no rural. É por isso que muitos ignoram e negam o aquecimento global, a diminuição da camada de ozônio, a poluição do ar, o lixo tóxico e radioativo, a chuva ácida, a erosão da camada superior do solo e o desflorestamento da Amazônia.
É óbvio que a linha adotada pelo governo em relação aos problemas ambientais provocará novos desastres, como os já ocorridos em razão de ações governamentais realizadas na marra, contra pareceres originais dos órgãos ambientais, como é o caso da Usina de Belo Monte, no Pará. Sem falar das licenças ambientais, da fiscalização e do controle que deveriam ter evitado as tragédias de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, nas bacias do Rio Doce e São Francisco, respectivamente. A agenda ambiental do governo está com sinal trocado; em vez da busca de soluções em base científicas, a opção é pela truculência administrativa contra pesquisadores e cientistas.
Há inúmeros exemplos históricos de resultados desastrosos em consequência de políticas que, por razões ideológicas e religiosas, trataram a ciência como caso de polícia, como a perseguição do Colégio de Roma aos matemáticos italianos, porque consideravam uma heresia o cálculo infinitesimal, que foi fundamental para o desenvolvimento da Ciência e a Revolução Industrial na Inglaterra. O mesmo aconteceu com a medicina europeia na Idade Média, com a perseguição aos médicos seculares e o desprezo pela cultura judaica e islâmica por parte da Inquisição espanhola. O fundamentalismo ideológico preside decisões como a tomada na intervenção policial-militar no ICMBio.
Chumbo trocado
O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, tentou, mais uma vez, pôr um ponto final no tiroteio entre o vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente da República, e o vice-presidente Hamilton Mourão. Disse que as declarações do general sobre os ataques que recebeu — “quando um não quer, dois não brigam” — estão de acordo com o pensamento do presidente Bolsonaro.
Aparentemente, os generais ganharam a briga no Palácio do Planalto com o guru do clã Bolsonaro, Olavo de Carvalho, que, ontem, declarou ser um “boi de piranha” que protege o presidente da República. Carlos Bolsonaro estaria fora do controle do pai, mas, quem conhece a família, diz que o “garoto” não se deixa enquadrar. Ontem mesmo, estava alfinetando o general Santos Cruz por causa do atraso na campanha do governo em defesa da reforma da Previdência. É a tal história, para Bolsonaro, chumbo trocado não dói.
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QUESTÃO DE DNA

Merval Pereira, O GLOBO
A disputa aberta de poder em que o vice-presidente Hamilton Mourão está envolvido, não por acaso, não tem paralelos históricos pela violência das palavras empregadas por Olavo de Carvalho e seus pupilos, entre eles Huguinho, Zezinho e Luisinho, como passaram a ser conhecidos no meio político os filhos de Bolsonaro, que ele denomina carinhosamente como 01, 02 e 03, como se recrutas fossem.
São os seus recrutas, “sangue do meu sangue”, e nada também acontece ali por acaso. Bolsonaro fala através de seu filho Carlos, o 02, especialista nas mídias sociais a quem Bolsonaro atribui grande parte de sua vitória. Quando Bolsonaro estava internado, depois da tentativa de assassinato que sofreu ainda na campanha eleitoral, Carlos já evidenciou o que achava de Mourão.
Tuitou afirmando que a morte do pai interessava não apenas aos inimigos declarados, mas a quem está por perto, principalmente após aposse. De lá para cá a disputa só fez escalar, inclusive porque Mourão assumiu o papel de moderador de um governo que vive de intrigas e embates permanentes como estilo de fazer política.
A paranoia familiar é alimentada pela História, pois nada menos que oito presidentes foram substituídos por seus vices desde o início da República, por motivos variados, desde a morte do titular até o afastamento por impeachment.
Desde o primeiro presidente, Deodoro da Fonseca, cujo vice Floriano Peixoto assumiu com sua renúncia e, em vez de convocar eleições, governou sob estado de sítio, até Temer, que, recusando o papel de “vice decorativo”, comandou uma conspirata política para assumir o lugar de Dilma, quando esta se enfraqueceu pelo fracasso econômico e se expôs ao cometer crimes de responsabilidade fiscal, a escolha dos vices sempre foi problemática.
Uma disputa aberta como a atual, mas não tão pouco sutil, aconteceu quando o general Figueiredo teve que viajar para a Clínica Cleveland para colocar pontes de safena. O político mineiro Aureliano Chaves assumiu o governo e fez o mesmo contraponto de Mourão em relação a Bolsonaro. Chegava cedo ao Palácio do Planalto, e saía altas horas da noite, a salientara fama de preguiçoso de Figueiredo. O entorno do ditador não escondia a irritação, e acusava Aureliano de deixar a luz acessa no gabinete presidencial para dar a impressão de que trabalhava.
A eleição presidencial deste ano teve uma característica especial: o protagonismo de candidatos a vice. Os dois primeiros colocados nas pesquisas ficaram fora da campanha, um definitivamente, outro temporariamente. Lula por estar condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro, tornando-se inelegível pela Lei da Ficha Limpa. Bolsonaro por ter sofrido um atentado à faca que quase o matou.
Muitos consideravam alguns candidatos a vice melhores que os titulares, co moera ocaso de Mourão, que já chamava a atenção por declarações polêmicas, mas com afala mansa e o jeito de quem desejava a pacificação política.
Admitiu intervenção militar mesmo fora da Constituição, falou até em autogolpe. Curioso é que sua escolha foi comemorada por Eduardo Bolsonaro, o 03, que disse que foi bom ter escolhido um candidato “faca na caveira” — referindo-se ao símbolo do Bope — para não valer apena pensarem impeachment.
No discurso pouco antes de ir para a reserva, que lhe valeu uma advertência do comandante do Exército, general Villas Bôas, que ele chama de VB, seu amigo de infância, disse sobre o governo petista: “Os Poderes terão que buscar uma solução. Se não conseguirem, chegará a hora que nós teremos que impor uma solução”.
De lá para cá Mourão vem afinando o tom, se aproximando do pensamento médio do cidadão de classe média, condenando a censura à imprensa, por exemplo, ou avaliando que a saída do ex-deputado Jean Wyllys era ruim para a democracia, combo ms ensoe sema visão tosca do grupo bolsonarista comandado por Olavo de Carvalho, que chamou Mourão de “moleque analfabeto” ao ser definido pelo vice como “astrólogo”.
Perguntado recentemente sobre as razões dessa mudança, Mourão disse que se devia à compreensão do papel institucional do cargo para o qual foi eleito. Estar na vice-presidência pelo voto, aliás, foi citado por ele como uma diferença fundamental com os militares do período ditatorial.
Que, aliás ele não renega, dizendo que era um momento de guerra. E também, assim como Bolsonaro, considera o torturador Brilhante Ustra “um herói”, embora tenha se abstido de falar no assunto ultimamente.
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APROXIME-SE PARA LÁ

Do Blog do Noblat, VEJA
A canelada de Rodrigo Maia em Bolsonaro
Bem que o presidente Jair Bolsonaro tentou agradar Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, no pronunciamento que gravou ontem a propósito da aprovação do texto da reforma da Previdência Social na Comissão de Constituição e Justiça. Foi uma menção rápida, mas ele a fez:
– Agradeço o empenho e o trabalho da maioria dos integrantes da comissão e também o comprometimento do presidente Rodrigo Maia.
Menos de duas horas depois, em entrevista à GloboNews, Maia deu-lhe uma forte canelada:
– Qual é a agenda do governo? Qual é a agenda do governo para a Educação? Eu não conheço. Qual é a agenda do governo nas relações internacionais? É um desastre.
E foi em frente. A falta de uma agenda, segundo ele, impede que os deputados decidam se estão dispostos ou não a apoiar o governo. Perguntado se sua relação com o presidente da República seria melhor do que já foi “como deputado”, Maia respondeu:
– Pessoalmente, é pior.
A canelada de Maia em Bolsonaro tem a ver diretamente com três coisas pelo menos. Primeira: o tratamento de segunda classe que Bolsonaro dá a ele e aos demais deputados. Maia acha que Bolsonaro contribui para demonizar a política e aposta no quanto pior, melhor.
Segunda coisa: o quase nenhum empenho de Bolsonaro para aprovar a reforma da Previdência. Bolsonaro comporta-se como se o Congresso fosse o único responsável pela aprovação ou não da reforma. E está pronto para culpá-lo caso a reforma seja rejeitada.
A terceira coisa foi apontada pelo próprio Maia durante a entrevista com uma frase curta: “Há um conflito dentro desse governo que o Parlamento não quer participar”. O conflito opõe militares, ministros com viés ideológico e os filhos do presidente da República.
É por isso que Maia quer distância do governo. Seu sentimento é também compartilhado pelos líderes dos partidos de centro. Se ao governo falta uma agenda, o Congresso tem a sua. E dela faz parte a reforma da Previdência e o fortalecimento do Estado de Direito.
Vai acabar mal
Governo movido a crises
Foi uma festa e tanto a que celebrou, ontem, os 89 anos do ex-presidente José Sarney. A mansão onde ele mora no Lago Sul de Brasília encheu-se de políticos da ativa e da reserva, e de ministros do Tribunal de Contas, além de parentes e amigos do aniversariante.
Nas rodas de conversa, prevaleceu o tema do momento: os ataques dos filhos do presidente Jair Bolsonaro ao general Hamilton Mourão, o vice-presidente. O comentário foi unânime: a continuar assim, o governo acabará mal, e talvez antes do tempo previsto.
Este é um governo que se alimenta de crises e que as produz à farta. Corre o risco de ser engolido por uma a qualquer instante.
A última do garoto mimado
Sem trégua
Em sua conta no Twitter, direta ou indiretamente, o vereador Carlos Bolsonaro, o queridinho do pai, disparou, ontem, mais três vezes contra o vice Hamilton Mourão, a quem acusa de conspirar para derrubar o presidente da República. Na véspera, Carlos havia atirado sete vezes em Mourão. Mas não foi só.
Ao retuitar uma mensagem postada pela deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) que elogiava a campanha de propaganda em defesa da reforma da Previdência a ser veiculada em breve na televisão, Carlos indicou que pelo menos mais um general entrou na sua mira – Santos Cruz, chefe da Secretaria de Governo.
Criticou-o por ter levado cinco meses para aprovar a campanha. Classificou a demora de “uma piada”.
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