Artigo de Marina Silva
Nos debates sobre o Código Florestal, duas linhas opostas de
argumentação se formaram. Os movimentos sociais e ambientais diziam que a
anistia aos desmatadores e a redução das áreas de proteção induziriam a novos
desmatamentos. Parlamentares e governantes garantiam que o "novo
código" não só reduziria como poderia até chegar ao sonhado desmatamento
zero.
A coisa vem de longe. Em abril de 2008, o líder do PMDB no
Senado, Valdir Raupp (RO), informou que apresentaria projeto de lei para o
desmatamento zero na Amazônia, pois considerava possível triplicar a produção
sem desmatar mais, usando novas tecnologias. No ano seguinte, o governador de
Mato Grosso, Blairo Maggi, disse ser possível dobrar a produção de alimentos em
seu Estado reduzindo a área utilizada para o desenvolvimento da pecuária.
Na campanha de 2010, a candidata Dilma Rousseff assegurava
"tolerância zero ao desmatador", descobrindo, no segundo turno das
eleições, que, "sem a redução do desmatamento, não há
sustentabilidade". No exercício da Presidência, não pareceu tão enfática.
Mas seus líderes no Congresso descreveram o "consenso" no Código
Florestal como um avanço, uma legislação mais simples e fácil de ser cumprida e
que, além de reduzir o desmatamento, recuperaria a floresta em lugares onde já
havia sido devastada. Uma maravilha.
Agora o governo anuncia que o desmatamento aumentou 28% no
último ano. Parte desse aumento vem de terras públicas, onde aumentou a
grilagem e a ocupação predatória. Os que ganharam politicamente com a mudança
nas leis ganham com seu resultado, mas sem falar muito.
A política ambiental anterior vinha reduzindo o desmatamento
e colocando o Brasil na liderança mundial de combate às mudanças climáticas.
Agora podemos ter grave prejuízo no cumprimento das metas de redução de CO2 e
quebra na liderança brasileira sobre o assunto, no momento de uma nova rodada
de negociações internacionais sobre o clima, em Genebra.
Quem tem boca vai a Roma e o papel aceita tudo, dizia-se
antigamente. Depois vem o pedido: esqueçam o que eu disse ou escrevi. As
justificativas para o aumento do desmatamento não seriam legítimas, porém
soariam mais sinceras se adotassem esse alheamento, em vez de tentarem nos
fazer crer que não tem nada a ver com as mudanças no Código Florestal e no
retrocesso pactuado entre governo e parlamentares para a revisão das leis
ambientais.
Espera-se que, pelo menos, as palavras e promessas sejam
mais moderadas na tentativa de mostrar uma face "ambientalista" antes
das eleições do ano que vem.
Marina Silva, ex-senadora, foi ministra do Meio Ambiente no
governo Lula e candidata ao Planalto em 2010. Escreve às sextas na versão
impressa da Folha de S. Paulo, página A2.
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