Editorial do O Estado de S.Paulo - "TCU põe governo contra a parede"
A chamada “contabilidade criativa”, inventada pelos petistas
para maquiar as contas públicas e disfarçar a desídia do governo no controle
fiscal, foi colocada a nu pelo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU)
que, com todas as letras, definiu como crime o flagrante desrespeito à Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF) representado pelas “pedaladas fiscais” praticadas
em 2013 e 2014.
A LRF, aprovada pelo Congresso em maio de 2000 contra o voto
do PT, “estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade
na gestão fiscal” (art. 1.º), inclusive a proibição de que bancos públicos
financiem seus controladores, os governos. Essa restrição objetiva impedir, por
exemplo, a quebradeira de bancos estaduais que até os anos 90 financiavam os
governos que os controlavam e não recebiam o dinheiro de volta. No plano
federal, a prática desse calote resultou frequentemente na necessidade de forte
capitalização do Banco do Brasil e da Caixa Econômica. A LRF baniu esse tipo de
irresponsabilidade.
Mas, coerente com a postura adotada quando era oposição, uma
vez no governo o PT se manteve fiel à irresponsabilidade fiscal, como demonstra
o minucioso relatório de quase 100 páginas do ministro do TCU José Múcio
Monteiro. Um exemplo: o repasse dos recursos do Tesouro para os beneficiários
do Bolsa Família é feito por intermédio da Caixa. O Tesouro deposita o dinheiro
no banco e o banco o transfere para os beneficiados pelo programa. No biênio
2013/2014, o Tesouro chegou a atrasar em 15 meses o repasse de verbas do Bolsa
Família para a Caixa, que obviamente foi forçada a desembolsar recursos
próprios para pagar em dia os beneficiários. Em outras palavras, para maquiar
suas contas, o governo usou os bancos públicos para cobrir despesas que
deveriam ser pagas pelo Tesouro.
“Operações” como essa, que se tornaram rotina da
“contabilidade criativa” e foram batizadas de “pedalada”, eram um recurso usado
pelo governo para reduzir as despesas contabilizadas, empurrando-as para a
frente e, assim, equilibrar suas contas naquele período. Um truque que, no
exemplo citado, implicava a Caixa financiar seu controlador, a União. O que,
mais uma vez, é claramente proibido pela LRF. Estima-se que a soma das
“pedaladas” financiadas pelos três bancos oficiais entre 2013 e 2014 – a Caixa,
o Banco do Brasil e o BNDES – supera a casa dos R$ 40 bilhões.
O ministro Joaquim Levy, a quem a presidente da República
delegou a responsabilidade de colocar em ordem as contas públicas, já deixou
claro que a era das “pedaladas” terminou. Quando mais não seja, o governo
estará deixando de infringir a lei.
Mas não é exatamente essa a opinião do advogado-geral da
União, ministro Luis Inácio Adams, que informou que vai entrar com um embargo
de declaração para que seja revista a decisão do TCU. Em termos que demonstram
claramente a intenção de confundir mais do que de revelar a verdade, “explicou”
Adams: “O que houve no caso de 2014 é que vivemos situação de estresse fiscal
maior, que também estressou essas dinâmicas de sistemática de pagamentos”. E
tentou ainda, como recomenda o manual de comunicação petista, lançar a culpa
sobre ombros alheios: “É muito estranho. Afinal, desde 2001 (sic), quando foi
criada a LRF, essa sistemática de pagamento acontece. Por que só agora estão
questionando isso?”.
São compreensíveis a preocupação do ministro Adams, notório
e fiel militante petista, e sua tentativa de levantar a suspeita de que existe
uma conspiração contra a presidente Dilma e o PT. O relatório do TCU, aprovado
por unanimidade – todos os ministros daquela Corte seriam conspiradores -, ao
evidenciar o descumprimento da lei pelo governo, oferece argumentos para
eventualmente embasar um pedido de impeachment da presidente da República.
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