sexta-feira, 19 de junho de 2015

PAES DE ANDRADE, O AUTÊNTICO

A trajetória de Paes de Andrade foi um compromisso com a democracia. Uma vez, ainda nos tempos de Coluna Política, o chamei de “mandacaru”. Foi a maneira de explicar a capacidade de resistência política do então deputado federal do PMDB. Na época, resistência contra a tese de fazer o PMDB sentar no colo do PSDB.
Mas o melhor de Paes se deu em momentos muito mais difíceis. Em plena ditadura militar, o deputado cearense compôs o “Grupo dos Autênticos” do MDB, o partido permitido pelo autoritarismo fardado. Era a ala mais à esquerda, que assumiu uma luta radical contra a ditadura.
Radical? Sim, radical. Para a esquerda tradicional, radical é quem pega em armas. A diferença é que Paes queria uma democracia com as plenas liberdades que lhe são peculiares. Sua arma foi a fala e alguns livros que assinou. Já o outro tipo de radical desejava derrubar a ditadura de então para instalar outro tipo de ditadura ainda mais feroz.
No “Grupo dos Autênticos” aglutinaram-se democratas como Paes, Franscisco Pinto, Alencar Furtado, Marcos Freyre e Fernando Lyra. Eram poucos, mas barulhentos. Faziam política pura. Utilizavam-se dos limites da institucionalidade para pregar os ideais de democracia. Lamentavelmente, hoje são personagens pouco reconhecidos. Talvez, por não terem empunhado um fuzil.
Há um livro, lançado em 1998, que conta a trajetória desse grupo. Chama-se Autênticos do MDB. Semeadores da Democracia (editora Paz e Terra). Na época do lançamento, a autora do livro, a professora da USP, Ana Beatriz Nader, contou que o trabalho surgiu do interesse de evitar que o tempo enterrasse a história de um grupo de oposição não intelectual, não insurrecional, não terrorista, mas de parlamentares que foram a “sementeira da resistência democrática no País”.
O livro mostra que o “Grupo dos Autênticos” era formado por políticos de diferentes correntes ideológicas, mas que se uniram em torno de um objetivo comum: a volta ao Estado democrático. “A proposta de levar o País para o regime democrático, enfatiza a autora, passava pela convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, ideia lançada desde o início da existência do grupo, durante seminário, em Recife, em 1971” (Folha de S.Paulo, 1998).
O auge da resistência civil encabeçada pelo grupo se deu em 15 de janeiro de 1974, quando 23 deputados do MDB denunciaram como farsa a sessão da Câmara para a eleição indireta, pelo Colégio Eleitoral, do general Ernesto Geisel para a Presidência da República. Foi quando o grupo divulgou um documento na ocasião, devolvendo o voto a quem consideravam o grande ausente, o povo brasileiro.
Foi um marco político que causou repercussão internacional. O livro de Ana Beatriz relata que, a partir desse momento e das posteriores eleições legislativas de 1974 que deu ampla vitória para o MDB nas disputas pelas vagas de senador (Mauro Benevides ganhou no Ceará), a sociedade passou a se organizar buscando a volta do Estado de Direito.
Paes e seu grupo de autênticos fizeram muito mais pela democracia do que os patriotas que organizaram guerrilhas, promoveram assaltos a bancos, explodiram bombas e fizeram sequestros. Afinal, não há um só documento oriundo de tais movimentos que falasse em democracia parlamentar, em liberdades de imprensa e de expressão, em direitos individuais ou coisa que o valha.
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