Da BBC Brasil
Embora por uma margem apertada - 51,9% a 48,1% -, o Reino
Unido votou pela saída da União Europeia (UE) no plebiscito realizado nesta
quinta-feira.
Trata-se de uma decisão histórica, que muda a relação do
país com seus vizinhos e com o mundo. O país pertenceu ao bloco desde a
fundação de seu embrião, a Comunidade Econômica Europeia, há 43 anos.
Veja abaixo, o que deve ocorrer daqui pra frente.
Como fica o governo do país
O primeiro-ministro britânico, David Cameron foi a principal
liderança na campanha pela permanência do país na UE e anunciou, na manhã desta
quinta-feira, que deixará o cargo, ainda que não imediatamente - em seu
discurso, ele disse esperar que o Reino Unido tenha um novo premiê até outubro.
Não se sabe ainda quem será seu sucessor; é provável que
seja um dos figurões do Partido Conservador que estiveram engajados na campanha
pela saída da UE, como o ex-prefeito de Londres Boris Johnson ou o ex-ministro
da Educação Michael Gove.
Durante a campanha, Cameron disse que uma vitória da saída
no plebiscito o levaria a ativar a Cláusula 50 do Tratado de Lisboa, que desde
2009 funciona como uma espécia de Constituição Europeia - dando início ao
processo formal de retirada do bloco.
Uma vez que o Artigo 50 é acionado, não dá para voltar
atrás: um país só pode voltar à UE com o aval unânime dos outros
países-membros.
O processo de saída, porém, não é automático - ele tem de
ser negociado com os membros do bloco.
Essas negociação têm prazo máximo de dois anos e o
Parlamento Europeu tem poder de veto sobre qualquer novo acordo formalizando o
relacionamento entre o Reino Unido e a União Europeia.
Michael Gove e Boris Johnson, os principais líderes da
campanha pela saída, disseram que não há necessidade imediata de ativação da
cláusula. Seu raciocínio é que um pouco de "tempo para respirar"
poderia convencer os outros líderes europeus a aceitar uma saída amigável dos
britânicos, sobretudo no que diz respeito ao acesso do país ao mercado comum.
O grande problema é a incerteza, já que nenhum país da União
Europeia até hoje deixou o bloco desde sua criação.
As negociações de saída ainda não têm data de início, mas
prometem ser complexas, pois envolvem a recisão de tratados internacionais e,
sobretudo de legislação interna britânica. Para começar, o Parlamento britânico
precisa derrubar os atos que dão primazia à lei europeia sobre a britânica.
Para se ter uma idea da complexidade, há pelo menos 80 mil
páginas de acordos entre o Reino Unido e a União Europeia.
E a reação dos mercados?
Todo os olhos agora estão nos mercados, incluindo a Bolsa de
Londres, mas o resultado do plebiscito já foi o suficiente para derrubar a
cotação da moeda britânica, a libra esterlina, para seu menor valor em relação
ao dólar desde 1985.
O Banco Central Britânico já anunciou que intervirá para
tentar manter a estabilidade da moeda, mas mesmo os partidários da saída
britânica da UE dizem esperar um período de incerteza nos mercados.
Com será a reação da Europa
Os líderes dos países da UE manifestaram seu desejo de que o
Reino Unido permanecesse no bloco, e o resultado do plebiscito vai causar
consternação do outro lado do Canal da Mancha. É bastante provável que um
reunião de cúpula de emergência já ocorra durante o fim de semana.
É difícil prever o que vai acontecer. Em Bruxelas, o centro
nervoso da UE, já há rumores sobre uma oferta de concessões de última hora para
tentar impedir o "Brexit" - fala-se em um tipo especial de presença,
em que o Reino Unido ficaria no bloco, mas teria maior controle sobre a
imigração, um dos tópicos que mais influenciaram o voto pela saída.
No entanto, políticos britânicos dos dois lados da discussão
já afirmaram a importância de respeitar o resultado das urnas.
E o presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker,
disse essa semana que os britânicos não poderiam esperar boa vontade de
Bruxelas caso optassem pela saída. Uma atmosfera pesada de negociações é uma
possibilidade bastante real.
Os líderes europeus temem também que o resultado britânico
estimule o "separatismo" em outros países.
A maioria dos 650 deputados federais britânicos é favorável
à permanência dos Reino Unido na UE, e apesar da necessidade de respeitar o
desejo do povo, expressado pelo resultado do plebiscito, eles não serão testemunhas
silenciosas do processo de saída.
Há pelo menos 450 deputados de diversos partidos articulando
o lobby para que as negociações com a UE tenham a permanência britânica no
mercado europeu como condição fundamental.
Isso, porém, forçaria o Reino Unido a manter suas fronteiras
com a UE abertas para trabalhadores europeus e continuar contribuindo para o
orçamento do bloco - um ponto controverso para os defensores da saída.
E deputados favoráveis à saída querem a aprovação de
legislação especial para pavimentar as negociações da retirada. E já
identificaram justamente o objetivo de derrubar o ato parlamentar que em 1972
trouxe o Reino Unido para a então Comunidade Econômica Europeia.
E o impacto sobre as nações do Reino Unido?
O placar final apertado do plebiscito não foi o único
indicador de imensa divisão entre os britânicos.
Houve imensa disparidade na distribuição regional dos votos,
e o fato de que a Escócia votou em peso pela permanência na UE não passou
despercebido (66% votaram para ficar no bloco).
Em 2014, o país realizou um plebiscito de independência em
que 55% da população defendeu a manutenção da união estabelecida em 1707.
Mas agora, seus líderes têm argumentos para forçar uma nova
consulta.
Durante a campanha do plebiscito da UE, o Partido Nacional
Escocês (SNP) alertou que a Escócia não aceitaria ser "removida à
força" do bloco e que o processo poderia ressuscitar a causa separatista.
Na Irlanda do Norte, onde 56% votaram pela permanência,
lideranças republicanas, favoráveis a uma reunificação com a Irlanda ventilaram
a possibilidade de um plebiscito sobre independência.
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