Do EL PAÍS
Os conceitos de pátria, patriotismo, povo e estrangeiros,
relacionados com os de soberania, segurança e liberdade, foram citados dezenas
de vezes no discurso com que Marine Le Pen inaugurou sua campanha para as
eleições presidenciais francesas de 23 de abril. A líder da ultradireitista
Frente Nacional, que lidera todas as pesquisas, apresentou ante milhares de
seguidores em Lyon as 144 promessas de seu programa. Entre elas, cobrar um
imposto dos estrangeiros que trabalham na França.
Le Pen expôs um de seus habituais raciocínios, segundo o
qual os muitos males da controvertida globalização acabam, no caso da França,
resultando em atentados jihadistas: “Nossos dirigentes escolheram a
globalização desregulada, que conduz à financeirização da economia e a uma
imigração em massa, o que resulta às vezes no fundamentalismo islâmico”.
Mais adiante em seu discurso, ela insistiu: “A globalização,
de um lado, e a falta de reação, por outro, levam-nos a ter uma imigração
descontrolada e, daí, ao islamismo em casa”. Frente a isso, a receita no bolso
de Le Pen: o “patriotismo econômico”, o “protecionismo inteligente”.
Interrompida com o grito de “on est chez nous” (“estamos em
nossa casa”, ou “esta é nossa casa”) cada vez que pronunciava as palavras
estrangeiro, imigrante ou islamismo, Le Pen negou que seu partido seja xenófobo
ou islamofóbico. Mas suas declarações deram munição a seus detratores.
Isso ocorreu, por exemplo, quando Le Pen defendeu a expulsão
imediata de todos os estrangeiros em situação ilegal, o fim do direito de solo
− a nacionalidade automática para quem nasce na França − e o fim do direito ao
reagrupamento familiar.
Para defender os franceses − que, segundo a candidata, foram
“despojados de seu patriotismo, sofrendo em silêncio por não ter o direito de
amar seu país” −, Le Pen expôs uma enxurrada de receitas protecionistas que se
resumem em: recuperação da moeda e das fronteiras nacionais, rompimento de
laços com a União Europeia (incluindo a remoção das bandeiras europeias dos
edifícios oficiais), sobrecarregar com um imposto de 3% todas as importações,
dar preferência às empresas francesas nos contratos públicos, ampliar a ajuda
de natalidade aos casais franceses e expulsar os imigrantes sem documentos
franceses (“jamais poderão se naturalizar”).
“Estamos a favor do local, contra o global”, afirmou,
acrescentando que as ajudas sociais, as casas para necessitados e qualquer
outro programa solidário serão só para os franceses, não para os estrangeiros.
Nessa linha, a proposta 38 das 144 diz textualmente: “Incluir um imposto sobre
a contratação de assalariados estrangeiros com o objetivo de assegurar a
prioridade nacional dos franceses no emprego”.
Portanto, guerra ao trabalhador estrangeiro na França ante
“o desemprego em massa” (10%), e anulação imediata das normas da “tirânica”
União Europeia sobre trabalhadores desempregados. E anulação, é claro, dessas
liberdades tão valorizadas como desprezadas por Le Pen: as de comércio,
movimento de pessoas (“é preciso sair do tratado de Schengen”), fluxo de
capitais e serviços.
Todo isso porque “sem soberania não há segurança”, segundo
Le Pen. Portanto, linha dura no terreno policial e militar. E “tolerância zero”
com o terrorismo e a delinquência. Os islamistas radicais estrangeiros serão
expulsos e as mesquitas com imãs extremistas serão fechadas. Haverá 15.000
policiais a mais e será reconhecida a presunção de legítima defesa cada vez que
eles utilizem suas armas.
E em relação aos muçulmanos não radicais, embora Le Pen diga
defender o laicismo, seria promovido o catecismo da “assimilação”. Como muitos
dos que tentam atualmente chegar à França como imigrantes são muçulmanos, outra
proposta radical: receber apenas 10.000 imigrantes por ano. Só pela partilha de
refugiados da UE, cabe à França acolher mais de 40.000 estrangeiros.
A candidata da Frente Nacional também prometeu reforçar o
poderio militar da França, único país que ficará na UE com armas nucleares
depois da saída da Grã-Bretanha. Haverá 40.000 militares a mais e o orçamento
de Defesa subirá de 1,7% para 2% do PIB num primeiro momento e, depois, para 3%
− um compromisso que seria incluído na Constituição. Outra promessa é que a
França também terá um segundo porta-aviões de propulsão nuclear, que Le Pen já
batizou de Richelieu, em referência ao cardeal e político que obteve a unidade
do país.
Um gasto de pelo menos 2% com a defesa é o nível que a
Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) exige, mas Le Pen não faria
isso por esse motivo, pelo contrário: ela propõe que a França abandone o Comitê
Militar da aliança, como ocorria até os anos noventa. “A França não deve estar
em guerras que não são suas”, afirmou. “Sem soberania não há proteção
possível.”
Como já repetiu centenas de vezes, Le Pen também prometeu
realizar dois referendos em seis meses, caso seja eleita: um para mudar a
Constituição − reduzir parlamentares, mudar a lei eleitoral em favor da Frente
Nacional, adotando um sistema proporcional − e outro para sair da UE.
Todas estas promessas de Le Pen − ela retirou a da pena de
morte − são apresentadas “em nome do povo”, seu lema de campanha, porque ela
afirma ser “a candidata do povo”, como reiterou. Por isso, aos habituais gritos
de “Viva a República” e “Viva a França”, ela acrescenta agora “Viva o Povo”. Le
Pen disse que cumprirá essas promessas ao pé da letra. Citou como exemplo o
novo presidente americano, Donald Trump. Nesse momento, só foi aplaudida por
uma dezenas de pessoas. Um dado importante.
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