Da ÉPOCA
No fim da tarde de uma segunda-feira recente, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu ao palco de um evento organizado
pelo PT em Brasília. Empunhou sua melhor arma: o microfone. Aos profissionais
da imprensa que cobriam o evento, um seminário para discutir os rumos da
economia brasileira, o ex-presidente dispensou uma ironia: “Essa imprensa tão
democrática, que me trata maravilhosamente bem e, por isso, eu os amo, de
coração”. Lula estava a fim de debochar. Não demorou para começar a troça sobre
os cinco processos criminais a que responde na Justiça. Disse que há três anos
ouve acusações sem o direito de se defender, como se não tivesse advogados. “Eu
acho que está chegando a hora de parar com o falatório e mostrar prova. Eu acho
que está chegando a hora em que a prova tem de aparecer em cima do papel”,
disse, alterado. Lula repetia, mais uma vez, sua tática diante dos casos em que
é réu: sempre negar e nunca se explicar. E prosseguiu: “Eu quero que eles
mostrem R$ 1 numa conta minha fora desse país ou indevida. Não precisa falar
que me deu 100 milhão, 500 milhão, 800 milhão... Prove um. Não estou pedindo
dois. Um desvio de conduta quando eu era presidente ou depois da Presidência”.
Encerrou o discurso aplaudido, aos gritos de “Brasil urgente, Lula
presidente!”.
A alma mais honesta do Brasil, como o ex-presidente já se
definiu, sem vestígio de fina ironia, talvez precise consultar seus advogados –
ou seus processos. Há, sim, provas abundantes contra Lula, espalhadas em
investigações que correm em Brasília e em Curitiba. Estão em processos no
Supremo Tribunal Federal, em duas Varas da Justiça Federal em Brasília e na
13ª Vara Federal em Curitiba, aos
cuidados do juiz Sergio Moro. Envolvem uma ampla e formidável gama de crimes:
corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa, crime contra a
Administração Pública, fraude em licitações, cartel, tráfico de influência e
obstrução da Justiça. O Ministério Público Federal, a Polícia Federal, além de
órgãos como a Receita e o Tribunal de Contas da União, com a ajuda prestimosa
de investigadores suíços e americanos, produziram, desde o começo da Lava Jato,
terabytes de evidências que implicam direta e indiretamente Lula no cometimento
de crimes graves. Não é fortuito que, mesmo antes da delação da Odebrecht, Lula
já fosse réu em cinco processos – três em Brasília e dois em Curitiba. Também
não é fortuito que os procuradores da força-tarefa da Lava Jato, após anos de
investigação, acusem Lula de ser o “comandante máximo” da propinocracia que
definiu os mandatos presidenciais do petista, desfalcando os cofres públicos em
bilhões de reais e arruinando estatais, em especial a Petrobras.
A estratégia de Lula é clara e simples. Transformar
processos jurídicos em campanhas políticas – e transformar procuradores,
policiais e juízes em atores políticos desejosos de abater o maior líder popular
do país. Lula não discute as provas, os fatos ou as questões jurídicas dos
crimes que lhe são imputados. Discute narrativas e movimentos políticos. Nesta
quarta-feira, dia 10, quando estiver diante de Moro pela primeira vez, depondo
no processo em que é réu por corrupção e lavagem de dinheiro, acusado de
receber propina da OAS por meio do tríplex em Guarujá, Lula tentará converter
um ato processual (um depoimento) num ato político (um comício).
Se não conseguir desviar a atenção, saindo pela tangente política,
Lula terá imensa dificuldade para lidar com as provas – sim, com elas. Nesses
processos e em algumas investigações ainda iniciais, todos robustecidos pela
recente delação da Odebrecht, existem, por baixo, cerca de 3 mil evidências
contra Lula. Elas foram analisadas por ÉPOCA. Algumas provas são fracas –
palavrórios, diria Lula. Mas a vasta maioria corrobora ou comprova os crimes
imputados ao petista pelos procuradores. Dito de outro modo: existe “prova em
cima de papel” à beça. Há, como o leitor pode imaginar, toda sorte de
evidência: extratos bancários, documentos fiscais, comprovantes de pagamento no
Brasil e no exterior, contratos fajutos, notas fiscais frias, e-mails, trocas
de mensagens, planilhas, vídeos, fotos, registros de encontros clandestinos,
depoimentos incriminadores da maioria dos empresários que pagavam Lula. E isso
até o momento. As investigações prosseguem em variadas direções. Aguardem-se,
apesar de alguns percalços, delações de homens próximos a Lula, como Antonio
Palocci e Léo Pinheiro, da OAS. Renato Duque, ex-executivo da Petrobras, deu um
depoimento na sexta-feira, dia 5, em que afirma que Lula demonstrava conhecer
profundamente os esquemas do petrolão. Existem outras colaborações decisivas em
estágio inicial de negociação. Envolvem crimes no BNDES, na Sete Brasil e nos
fundos de pensão. Haja prova em cima de papel.
Trata-se até agora de um conjunto probatório, como gostam de
dizer os investigadores, para lá de formidável. Individualmente e isoladas, as
provas podem – apenas – impressionar. Coletivamente, organizadas em função do
que pretendem provar, são destruidoras; em alguns casos, aparentemente
irrefutáveis. Nesses, podem ser suficientes para afastar qualquer dúvida
razoável e, portanto, convencer juízes a condenar Lula por crimes cometidos,
sempre se respeitando o direito ao contraditório e à ampla defesa – e ao
direito a recorrer de possíveis condenações, como qualquer brasileiro. Não é
possível saber o desfecho de nenhum desses processos.
Ainda assim, os milhares de fatos presentes neles, na forma
de provas judiciais, revelam um Lula bem diferente daquele que encanta ao
microfone.
Leia a reportagem
completa em ÉPOCA desta semana.
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