domingo, 18 de junho de 2017

SOPRANDO VELINHAS

Fernando Henrique Cardoso foi Presidente da República do Brasil por dois mandatos consecutivos, de 1º de janeiro de 1995 a 1º de janeiro de 2003. É sociólogo, autor de vários livros sobre mudança social e os condicionantes políticos do desenvolvimento do Brasil e da América Latina.
 Nasceu no Rio de Janeiro em 18 de junho de 1931, em uma família de militares. Foi casado com a antropóloga Ruth Corrêa Leite Cardoso, com quem teve três filhos. Licenciado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), da qual se tornou professor em 1953, obteve também os graus de doutor e de livre docente.
Engajado nas lutas pela melhoria do ensino público e pela modernização da universidade, foi perseguido depois do golpe de 1964. Viveu exilado no Chile e na França, pesquisando, escrevendo e lecionando. Voltou ao Brasil em 1968 e assumiu por concurso público a cátedra de Ciência Política da USP. Em 1969, foi aposentado compulsoriamente e teve seus direitos políticos cassados pelo Ato Institucional nº 5.
Em 1969 criou em São Paulo com outros professores e pesquisadores cassados, o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), que se tornaria um importante núcleo de pesquisa e reflexão sobre a realidade brasileira. Paralelamente, lecionou em universidades americanas (de Princeton e da Califórnia, em Berkeley) e europeias (Paris, Cambridge e UK). Em palestras e artigos publicados em vários órgãos de imprensa, destacou-se como crítico do regime militar e defensor de uma transição pacífica para a democracia. Desde 2003, acompanha a política brasileira em coluna mensal de O Globo e O Estado de S. Paulo.
O político
Em 1974, a convite de Ulysses Guimarães, presidente do MDB, coordenou a elaboração da plataforma eleitoral do partido. Em 1978, concorreu ao Senado pelo MDB e se elegeu suplente de Franco Montoro. Em 1983, com a eleição de Montoro para o governo de São Paulo, assumiu sua vaga no Senado. Teve participação destacada na campanha das Diretas-Já e na articulação da candidatura de Tancredo Neves à Presidência da República em 1984.
Indicado por Tancredo, líder do governo no Congresso Nacional, conduziu em nome do governo as mudanças na legislação eleitoral e partidária que abririam caminho para a democratização da vida política do país.
 Em 1985, foi candidato a prefeito de São Paulo e perdeu por 30.000 votos para o ex-presidente Jânio Quadros do PTB. No ano seguinte, reelegeu-se para o Senado com 6 milhões de votos, a segunda maior votação no Estado numa eleição majoritária.
 Foi líder do PMDB no Senado e um dos relatores do Congresso Constituinte de 1987/88. No fim de 1988, inconformado com a falta de definições do PMDB em relação ao governo do presidente José Sarney e a temas polêmicos da Constituinte, saiu do partido para fundar o PSDB, ao lado de Mario Covas, Franco Montoro, José Serra e lideranças vindas de outras agremiações.
Depois do impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, em outubro de 1992, assumiu o Ministério das Relações Exteriores do governo do presidente Itamar Franco. Em maio de 1993, atendendo a uma convocação do Presidente, mudou-se para o Ministério da Fazenda. A inflação beirava os 30% ao mês e temia-se a deterioração da situação política do país. Contra a opinião dos que só julgavam ser possível atacar a inflação depois da posse do próximo governo em 1995, conseguiu mobilizar uma maioria parlamentar e amplo apoio de opinião pública a favor do seu plano de estabilização, o Plano Real. Este incluiu medidas drásticas de controle do déficit público e uma reforma monetária que se completou com a entrada em circulação de uma nova moeda, o real, em julho de 1994.
Deixou o Ministério da Fazenda em abril de 1994 para assumir a candidatura à Presidência da República pela coligação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), da Frente Liberal (PFL) e Trabalhista do Brasil (PTB). Foi eleito presidente em 3 de outubro de 1994, no primeiro turno, com 54,3% dos votos, sendo empossado em 1º de janeiro de 1995. Veja aqui o curriculum-vitae completo de FHC.
O governante
Em 4 de junho de 1998, o Senado aprovou a emenda que permitia a reeleição para mandatos do Executivo nos âmbitos federal, estadual e municipal. Em 4 de outubro de 1998, FHC e o vice Marco Maciel foram reeleitos no primeiro turno pela coligação PSDB, PFL, PTB e PPB. FHC obteve 53,06% dos votos válidos contra 31,71% conferidos a Luiz Inácio Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores (PT) e 10,97% a Ciro Gomes, do Partido Popular Socialista (PPS). Tomou posse em 1º de janeiro de 1999.
 Com a reeleição, Fernando Henrique tornou-se o primeiro presidente da história do Brasil a ocupar a chefia do Executivo por dois mandatos consecutivos. A Presidência foi marcada pela consolidação da estabilidade econômica, por reformas na economia, Previdência Social e administração pública e pela democratização do acesso às políticas sociais. Em 2002, com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais, o presidente Fernando Henrique Cardoso encaminhou o processo de transição democrática com representantes do novo governo.
 Rotuladas de "neoliberais" e duramente combatidas durante seu governo, suas políticas nas áreas econômica, social e institucional foram em linhas gerais mantidas pela oposição depois que assumiu o governo em 2003.
Sob o impacto do êxito do Plano Real, o maior desafio do governo de FHC foi manter a estabilização da moeda e, ao mesmo tempo, promover o crescimento econômico. Com esse objetivo, o governo submeteu à aprovação do Congresso Nacional uma série de medidas para alterar a Constituição Federal de 1968 e, assim, promover uma mudança estrutural na feição do Estado brasileiro, na tentativa de adaptá-lo ao novo funcionamento da economia mundial. Assim, determinados temas passaram a fazer parte do cotidiano político nacional, tais como reforma administrativa e previdenciária, desregulamentação de mercados, flexibilização das regras de contratação de mão-de-obra e fim do monopólio estatal nas áreas de siderurgia, energia elétrica e telecomunicações.
 A reforma da Administração Federal e da Previdência Social, consideradas fundamentais na redução dos gastos públicos foram longamente debatidas no Congresso e sofreram diversas modificações. O programa de privatizações, objeto prioritário na estratégia do governo, foi alvo de críticas acirradas da oposição, que questionava as avaliações sobre o valor das empresas e, em alguns casos, como o da companhia Vale do Rio Doce (CVRD), o próprio valor estratégico do setor. Em maio de 1997, o controle acionário passou para um consórcio formado por bancos nacionais e estrangeiros, estes minoritários, e fundos de pensão nacionais. A despeito das críticas, o programa foi implementado com eficácia: o setor de energia elétrica, na área de distribuição e geração regional foi completamente privatizado; o setor das telecomunicações, incluindo a Telebrás e as empresas telefônicas estaduais, passou às mãos da iniciativa privada na segunda metade de 1998; teve fim o monopólio da Petrobras sobre a exploração e o refinamento do petróleo e sobre a exploração do gás natural.
Em 1994, com o lançamento do Real e a desindexação da economia, o governo proibira o reajuste automático dos salários pela inflação e estabelecera a livre negociação entre patrões e empregados. Em novembro de 1995, uma medida provisória ampliou os poderes do Banco Central para intervir, quando necessário, nas instituições bancárias, com o objetivo de evitar que a crise que atingiu o setor – resultante da queda das taxas de inflação, das medidas de contenção do consumo e da consequente diminuição dos lucros obtidos com a especulação financeira—se alastrasse e comprometesse o sistema financeiro e foi também regulamentado o Programa de Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer).
 Fortemente inserido nos mercados financeiros internacionais, o Brasil enfrentou, durante o governo FHC um quadro internacional adverso, com sucessivas crises externas, destacando-se a do México (dez. 1994) e a da Rússia (1998), que chegou a decretar moratória de sua dívida externa, verificando-se nessas ocasiões uma expressiva saída de divisas do país. Em que pese os fortes vínculos existentes entre a economia nacional e o capital estrangeiro, o Brasil demonstrou capacidade superior a de outros países para absorver as crises externas e se recuperar. A estabilização da economia, com a contenção do processo inflacionário, permitiu o crescimento da renda média dos trabalhadores assalariados. Contudo, os mecanismos utilizados na defesa da moeda nacional e a manutenção das altas taxas de juros implicaram um ritmo lento do crescimento econômico e, em decorrência, a elevação do índice do desemprego, que foi de 5,6% em 1997 a 7,6% em 1998 (Fundação IBGE) e a 10,7% no final do 2º mandato. Elevação atribuída à desconfiança dos mercados, à elevação do “risco Brasil” e à disparada da cotação do dólar provenientes do receio da vitória do candidato do PT.
 No que diz respeito à política agrária, apesar da elevação das alíquotas de transmissão de propriedades improdutivas, da aprovação de leis possibilitando sua desapropriação imediata e do aumento do número de famílias assentadas, aumentaram as manifestações e ocupações de fazendas promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).
O segundo mandato iniciou com a ruptura da política cambial até então praticada: logo em janeiro, o real foi desvalorizado e o Banco Central adotou a livre flutuação do dólar, o que contribuiu para o aumento das exportações e a redução da taxa de juros. A implementação do acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), assinado no ano anterior, exigira o alcance de metas rígidas, entre elas um superávit fiscal elevado. Destacou-se então a aprovação, pelo Congresso Nacional, em maio de 2000, da Lei de Responsabilidade Fiscal, que dispôs sobre o planejamento, a execução e a elaboração de relatórios orçamentários por parte dos Estados e municípios. A necessidade de ampliar as exportações foi atendida pelo crescimento de 19% da produção agroindustrial entre 2000 e 2003. Entretanto, a crise de energia elétrica entre junho de 2001 e março de 2002 acarretou um racionamento de eletricidade para todos os setores da sociedade. Em meados de agosto de 2002, em meio ao processo eleitoral, a desconfiança dos mercados e a disparada da cotação do dólar levaram o governo a fechar um novo acordo de 30 bilhões de dólares. No final de 2002, a inflação estava em dois dígitos e a taxa de desemprego em 9,4%.
 As reformas, embora limitadas pela forte oposição no Congresso Nacional, abriram caminho para a modernização da infra-estrutura econômica, com a abertura para investimentos privados nos setores de telecomunicações, energia elétrica, petróleo, transportes e mineração. A expansão do déficit previdenciário foi parcialmente contida. Criaram-se as bases constitucionais para regimes mais flexíveis de contratação e gestão de pessoal no setor público, incluindo processos de avaliação de desempenho.
Começou-se a corrigir o viés historicamente regressivo das políticas sociais no Brasil, que costumavam privilegiar camadas médias e altas em detrimento das maiorias mais carentes da população. O acesso ao ensino fundamental por meio dos programas sociais: PETI - Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; Toda Criança na Escola; Bolsa-Escola; ao atendimento básico de saúde (Programa de Saúde da Criança e Aleitamento Materno; Programa de Saúde da Família; Programa de Agentes Comunitários de Saúde); a regulamentação dos remédios genéricos e à Previdência Social foi praticamente universalizado. Os pequenos agricultores tiveram acesso amplo à terra e ao crédito (Programa de apoio à Agricultura Familiar). A assistência aos idosos e portadores de deficiência foi ampliada. Uma rede de proteção social garantiu transferências de renda a mães e crianças abaixo da linha de pobreza e estimulou sua frequência à escola e à rede básica de saúde.
 Em 1999, a população era de 169 milhões de brasileiros. Permaneceu a desigualdade de renda – a metade mais pobre representava 12% da renda total, mas a taxa de analfabetismo caíra de 19.75 para 12.85. Pela evolução positiva dos indicadores sociais do Brasil em seu período de governo, recebeu das Nações Unidas em 2002, o prêmio “Mahbub ul Haq por Notável Contribuição ao Desenvolvimento Humano”.
 O intelectual
Além da Universidade de São Paulo, da qual é professor emérito, ensinou nas Universidades de Santiago do Chile; da Califórnia (Stanford e Berkeley) e de Brown nos Estados Unidos; de Cambridge na Inglaterra; de Paris-Nanterre, na École des Hautes Études en Sciences Sociales e no Collège de France, na França. Foi presidente da Associação Internacional de Sociologia (1982-1986). Recebeu o Doutorado Honoris Causa de mais de 20 universidades, das mais prestigiadas. Foi membro honorário estrangeiro da American Academy of Arts and Sciences.
Muitos dos seus livros foram publicados no Brasil e no exterior. O conjunto dos seus pronunciamentos e discursos quando presidente da República, Palavra do Presidente, foi publicado em dezesseis volumes pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Brasília, 2002). Tem artigos em periódicos de vários países. No Brasil, colaborou nas revistas Anhembi, Brasiliense, Novos Estudos Cebrap e Revista USP, entre outras. Veja aquia Bibliografia completa de FHC.
Em 2005, foi eleito um dos 100 maiores intelectuais públicos do mundo, em levantamento da revista britânica Prospect.
 Para uma visão panorâmica do Arquivo Fernando Henrique Cardoso clique aqui.
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