Tânia Fusco, Blog do Noblat
Ainda que não particularmente medrosa, tenho pavor dos
violentos de vários matizes - aí cabendo de psicopatas aos covardes haters. No
meio desses, a intolerância, o preconceito, a ignorância e a caretice.
Morro de medo da caretice – esse universo escuro habitado
pela ignorância consentida, seara de conservadores e reacionários - à direita,
no centro e à esquerda. É gente que cultiva seus antolhos, ignora a realidade
e, trocando figurinhas (repetidas) entre si, resiste às mudanças, renega
avanços.
Não há universidade, pós-graduação, mestrado, doutorado,
máster capaz reverter suas certezas imutáveis. Agarrado às suas crenças –
religiosas ou não -, com unhas, dentes, advogados e juízes, eles defendem-se de
qualquer coisa fora da sua estreita estradinha.
Sozinhos são o obscurantismo em pessoa. Juntos formam a tribo da maioria silenciosa.
Viram monstro. Sempre capaz de fazer o mundo andar em marcha ré. Para não ir
muito longe, na conta deles podemos debitar nazismo, fascismo, ditaduras ou
Trumps de várias nacionalidades, intensidades ou etnias.
Bom lembrar que quem primeiro usou a expressão – maioria
silenciosa - foi Nixon, justamente para reivindicar apoio à Guerra do Vietnã,
nos seus estertores de extrema violência.
Sempre incapazes de apreciar (ou alcançar) as artes, pedem
censura. Nada é mais ameaçador do que a censura às artes e aos costumes – itens
obrigatórios da cartilha de repressão dos que cultuam e cultivam sua sempre
arrogante caretice. Não sei, não quero saber. Tenho raiva de quem sabe.
Frágeis no saber, confiam zero no seu taco. Assim, quando
isolados, sonham com governos duros. Juntos, exigem censura e repressão para
ajuda-los na tarefa de impedir os seus – filhos particularmente - de ver e
apreciar tudo que esteja fora do seu reduzido menu permissões, onde não estão
incluídas democracia e liberdade de escolha.
Neste setembro, eles andam arrepiando. Antes mesmo do
calendário marcar a primavera, conseguiram fechar a exposição Queermuseu, no
Santander Cultural, da capital gaúcha. Lá estavam 263 obras sobre o universo
LGBTQ, alegorias criadas por artistas brasileiros de talento e qualidade
reconhecidos mundo afora, como Lygia Clark, Candido Portinari, Alfredo Volpi,
Adriana Varejão.
O ignorante consentido prefere nem saber quem são. Assim
seguirá sua profissão de fé na ignorância. (Que não tem na a ver com letras e
formação profissional. Os ignorantes consentidos de raiz podem estar entre
letrados e diplomados. É opção mesmo. Cagaço do novo).
Da abertura, em 15 de agosto, até 10 de setembro, quando
fechada pela revolta dos eriçados das cavernas, a exposição tinha média diária
de 700 visitantes. Público grande para um país em que 92,5% da população não
costuma ir às exposições de arte, mas suficiente para excitar ignaros, que
viram na mostra cobras e lagartos – de pornografia ao incentivo à pedofilia e à
zoofilia.
A mesma fobia de liberdade motivou censura ao teatro,
absolvição de pai espancador, chegou à liminar pró cura gay. Numa penada, sua excelência permitiu “tratar”
comportamento como doença. Também, claro, anunciar, cobrar e receber pelo
“tratamento”.
Na peça censurada em Jundiaí, Jesus vinha aos dias de hoje
como uma transgênero. Uma alegoria. Dessas permitidas às artes. Puro
“desrespeito” entendeu o juiz-censor no país recordista mundial em matar
“desrespeitosos” LGBTTT.
A ignorância consentida, com seus juízes de plantão, recusa
aceitar que visitar exposições e assistir peças de teatro são ações de livre
escolha. O que (ainda) é direito constitucional. Não quer ver, não gosta?
Exerça seu sagrado direito de não ir.
Os mesmos também recusam admitir que não há liminar capaz de
transformar em patologia o que não é. A norma do Conselho Federal de
Psicologia, que o juiz pretendeu derrubar, tenta evitar charlatanices,
exploração, reforço e incentivo ao preconceito.
Opção sexual não é doença. Nem será por decisão judicial.
Estão carecas de saber. Ignorância consentida é sim moléstia social. Grave.
Consome energia e permite manter opressões, desigualdades e violências. Trava
avanços.
Ontem a Oxfam, organização não governamental britânica,
divulgou seu relatório anual das desigualdades. No Brasil das censuras e
liminares pró atraso, os 10% mais ricos pagam tributos menores do que os 10%
mais pobres. Esses mais pobres gastam
com impostos 32% de tudo que recebem, enquanto os do topo da pirâmide
ficam nos 21%.
Impostos indiretos, sobre produtos e serviços, levam 28% do
que ganham os mais pobres e 10% dos ricos. Suave?
Os remediados pagam a mesma alíquota de Imposto de Renda dos
que ganham 55 salários mínimos por mês. Isso porque a tal da alíquota deixa de
crescer para quem ganha acima de 44 salários mínimos mensais. Bacana, não?
Negros e mulheres ainda são três em cada quatro dos mais
pobres. Também os que mais morrem vitimas de violências.
O Rio de Janeiro explode em guerra de traficantes.
Silêncio da maioria. Não há juiz de plantão que emita
censura ou liminar contra as desigualdades.
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