O Congresso Nacional recorreu a votações a toque de caixa e,
em alguns casos, manobras heterodoxas para finalizar nesta quinta-feira seu
projeto de reforma política a tempo de que as novas regras já sejam aplicadas
nas eleições de 2018. Para isso, basta que os pontos sejam sancionados pelo
presidente Michel Temer (PMDB) até o próximo sábado, 7 de outubro. Uma das
mudanças de última hora, no entanto, provocou imediata polêmica: uma emenda
aprovada na madrugada de quarta-feira na Câmara abre caminho para que sejam
retirados das redes sociais mensagens que contenham "discurso de ódio,
disseminação de informações falsas ou ofensa em desfavor de partido ou candidato"
sem a necessidade de uma decisão judicial. Para que isso aconteça, basta que
uma pessoa denuncie uma publicação, segundo o texto da emenda proposta pelo
deputado Áureo (Solidariedade-RJ).
Se não for vetada pelo presidente, a emenda terá alto
impacto em redes sociais como Google, Facebook ou Twitter e espalhou
preocupação tanto entre executivos das gigantes tecnológicas como nas poderosas
associações de rádio e TV, revistas e jornais que lançaram nota de repúdio.
"A Abraji considera a aprovação deste dispositivo uma grave ameaça ao
regime democrático", disse a organização que reúne jornalistas
investigativos no país. "Agora, apenas o veto do presidente Michel Temer
pode garantir a liberdade de expressão na internet no pleito de 2018", seguiu
a associação.
Fontes do setor tecnológico se dizem preocupadas porque,
segundo o texto aprovado, a simples denúncia de um usuário será suficiente para
que a publicação seja derrubada em até 24 horas. Em tese, as plataformas terão
que suspender as publicações denunciadas para analisar se houve disseminação de
ódio ou informação falsa. Uma vez confirmada, a postagem deverá ser eliminada.
Contudo, espera-se, na prática, que o grande volume de denúncias durante uma
campanha eleitoral faça com que essa análise de conteúdo não seja possível e
que as publicações fiquem suspensas indefinidamente, avaliam as mesmas fontes
do setor. Outra preocupação é que a medida poderia fazer, por exemplo, com que
as equipes de campanha fiscalizem os perfis dos usuários e denunciem as publicações
críticas — mas não necessariamente ofensivas — que causam danos a seus
respectivos candidatos.
A emenda contraria o Marco Civil da Internet, que regula o
uso da rede no Brasil e estabelece que apenas o Judiciário tem a competência
para dizer se um conteúdo é ofensivo ou ilegal — salvo os casos que vão contra
as regras de uso de uma rede social, como o compartilhamento de pornografia
infantil, por exemplo; nesses casos, a própria plataforma pode derrubar o
conteúdo. Assim, no modelo brasileiro não existe, em tese, uma censura prévia.
Mas a emenda aprovada acaba, na visão de integrantes do setor, com esta
"presunção de liberdade de expressão".
Outra preocupação é o fato do texto aprovado na Câmara ser
vago e confuso. Por exemplo, fala-se em "publicações" na Internet,
mas não se sabe se faz referência apenas às postagens feitas por usuários ou
também à páginas inteiras — algo que poderia afetar perfis engajados como o da
Mídia Ninja ou do Movimento Brasil Livre (MBL).
O deputado Áureo, líder do Solidariedade na Câmara e autor
da emenda, explicou ao jornal Folha de São Paulo que medida trata de
"evitar uma guerrilha com fakes". "A única coisa que a gente
quer é que o Facebook tenha agilidade do que tem na lei. "É um crime já
[fazer comentários com perfis falsos]. Isso pode mudar o resultado de uma
eleição. A diferença é que queremos agilidade porque se ficar provado que o
autor não é verdadeiro, aí já passou o resultado das eleições", disse o
deputado ao jornal. O deputado Vicente Cândido (PT-SP), relator da reforma
política na Câmara, também defendeu a medida, que para ele precisa ser usada
com "lisura e decência", segundo disse à Folha.
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