“Pelo menos ele não rouba.” Não era difícil ouvir essa frase
e similares durante a campanha eleitoral de 2018. Jair Bolsonaro fez
muita gente crer que ele encarnava o antipetismo não só no aspecto ideológico,
mas também no moral: um político impoluto contra os ladravazes
barbudos – lavando de brinde todo um sistema corrupto.
Quem acompanhava a história dos Bolsonaro na
política fluminense sabia ou ao menos desconfiava que a ascensão
material não era fruto de orações. E estranhava, para
dizer o mínimo, o apreço da família por notórios milicianos.
O material divulgado na quarta 18 pelo Ministério Público do
Rio, em seu pedido à Justiça por 24 ações de busca e apreensão, dá nomes e
números a mais de duas décadas de suspeitas. Amplia
bastante o que se sabia graças ao próprio MP e a investigações
da imprensa.
Dos muitos dados que chegaram ao noticiário, um tem sido
merecidamente destacado: na conta de Fabrício Queiroz, o ex-PM faz
tudo da família, caíram 483 depósitos feitos por ao menos 13 ex-assessores do
então deputado estadual (e hoje senador) Flávio Bolsonaro, num
total de R$ 2 milhões. É mais fácil acreditar em Papai Noel do que na
lisura dessas transações.
As revelações deixam poucas dúvidas quanto à prática da
“rachadinha” no gabinete do filho 01: parte dos salários dos funcionários era
desviada para outros fins. E muitos desses funcionários eram fantasmas, como
ÉPOCA e o jornal O Globo já mostraram em reportagens.
O trabalho do MP indica que os Bolsonaro criaram
sua fama de incorruptíveis enquanto chafurdavam nos subterrâneos da política do
Rio. Fizeram o mesmo que diversos outros grupos fazem. A diferença é que
chegaram ao Palácio do Planalto. E uma porção de lama
foi junto.
Ao poder central, pela primeira vez,
chegaram as milícias, fortíssimas no Rio, mas que ainda tinham
presença discreta em Brasília. Exemplo notório da relação da família agora
presidencial com essas organizações criminosas é a proximidade de Flávio com
Adriano Magalhães da Nóbrega.
Ex-integrante do Bope (a “tropa de elite”)
que acabou expulso da Polícia Militar em 2014, Nóbrega é acusado de liderar um
esquadrão da morte que comete execuções em nome dos seus muitos negócios
irregulares ou por encomenda. Já esteve preso diversas vezes. Hoje está
foragido.
Em uma de suas temporadas na cadeia, em 2005, recebeu a
notícia de que Flávio lhe concedera a Medalha Tiradentes, a mais alta honraria
da Assembleia Legislativa.
A ex-mulher de Nóbrega foi lotada no gabinete de
Flávio por 11 anos e repassava dinheiro a Queiroz. A mãe do ex-PM foi
lotada por dois e fazia o mesmo.
Até pela força política que tem hoje, o clã pode sair ileso
das provas que o MP do Rio vem levantando. Mas o figurino de incorruptível só
continuará cabendo ao presidente aos olhos dos que preferem não ver.
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