Ainda teremos muita discussão até a implantação do juiz de
garantias, que vai dividir os processos criminais com um juiz de julgamento.
Afinal, o diabo está nos detalhes, e é disso que tratam os membros do grupo de
trabalho do Conselho Nacional de Justiça, reunidos pelo presidente Dias Toffoli
para regulamentar a medida.
Mas os juristas que a aprovam acham que está havendo muito
barulho por nada. Foi o que disse, por exemplo, o presidente do Supremo
Tribunal Federal e do CNJ, ministro Dias Toffoli, para quem a implantação do
sistema é “perfeitamente factível”. O ministro Gilmar Mendes, também do STF, é
da mesma opinião, e considera que a medida “é mais fácil de implementar do que
parece”
Outro ministro do Supremo, Alexandre de Moraes, ressalva que
a proposta não estava no seu projeto, nem no do Moro. Ele considera que não é
urgente a adoção de tal instrumento, mas também acha um absurdo dizer que ele é
inconstitucional, como alegam a Associação dos Magistrados do Brasil e a
Associação dos Juízes Federais.
Moraes e Gilmar conversaram ontem sobre o tema, e algumas
sugestões foram passadas para Toffoli, especialmente por Alexandre de Moraes,
que tem conhecimento da experiencia com esse instrumento em São Paulo.
Sugere, por exemplo, para a Justiça estadual, onde a
instalação será mais difícil, a criação de um Juizado de Garantias, com alguns
juízes só para essa tarefa, no estilo do que já existe em São Paulo no
Departamento de Inquéritos Policiais (DIPO).
Esse Juizado se instalaria na sede da circunscrição, com
competência para todas as Comarcas que dela fizerem parte. Em São Paulo, são 13
uízes no DIPO, que fazem toda a parte de garantia do Foro Central (crimes de
reclusão), com 60 juízes. Além disso, fazem todas as audiências de custódia.
Esse, alias, é outro ponto controverso da lei anticrime
aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Bolsonaro. Por ela,
qualquer preso tem que ser apresentado a um juiz de custódia em 24 horas, caso
contrário o preso terá que ser libertado. Essa exigência já existe no Código de
Processo Penal (CPP), mas a nova lei a reafirma para impedir que seu
descumprimento seja normalizado.
Há quem considere que os Juízes de Garantias não terão tempo
hábil para realizar também as audiências de custódia, e que o exemplo do DIPO
paulista não pode ser disseminada pelas comarcas brasileiras, muitas das quais
têm apenas um juiz, e muitas nem isso, o que ocasionará um congestionamento de
processos.
Em São Paulo, e nas principais cidades e capitais, os
processos são todos digitalizados, mas esta não é a realidade do país, alegam
os críticos. Alexandre de Moraes considera que com 20 juízes para todo o
interior paulista, divididos nas 10 regiões que já existem para fazer execução
criminal, o problema estará resolvido.
A Justiça criminal ficaria dividida em Juizados especiais,
que são excetuados pela lei, e Juízes de garantia/processo. A lei prevê o
rodízio nas comarcas em que há apenas um juiz, mas não traz detalhes de como
isso funcionará. O ministro Sérgio Moro, que não escondeu sua decepção com a
sanção da figura do juiz de garantias, voltou ontem ao Twitter para ironizar:
“Leio na lei de criação do juiz de garantias que, nas
comarcas com um juiz apenas (40 por cento do total), será feito um ‘rodízio de
magistrados’ para resolver a necessidade de outro juiz. Para mim é um mistério
o que esse ‘rodízio’ significa. Tenho dúvidas se alguém sabe a resposta”.
Não há uma concordância entre os ministros do Supremo sobre
o alcance da medida. Como o ministro Marco Aurelio Mello declarara, o
presidente do Supremo acha que a aplicação do instituto do juiz de garantias
não vale para os processos em curso e, portanto, não atinge os abertos contra o
ex-presidente Lula e o senador Flavio Bolsonaro, filho do presidente.
Outros ministros, como Celso de Mello e o próprio Alexandre
de Moraes, acham que sim. Os advogados criminalistas poderão reivindicar ao
Supremo um tratamento isonômico, pois no artigo 3 D está dito especificamente
que juizes que tiverem tido acesso às investigações não poderão julgar o caso,
terão que se considerar impedidos. Esta seria uma causa de nulidade da decisão.
Toffoli e Gilmar entendem também que a decisão só vale para
a primeira instância, não havendo necessidade para os tribunais regionais, e
muito menos para os tribunais superiores, como o Superior Tribunal de Justiça
(STJ) e o STF.
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