Duas semanas após o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) ter
provocado uma crise diplomática ao publicar um tuíte acusando os chineses de
terem escondido informações sobre o início da pandemia do novo coronavírus, o
que levou o embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming, a divulgar uma nota na
qual afirmava que o filho do presidente Bolsonaro contraíra um “vírus mental
que infectou a amizade entre os povos”, o ministro da Educação, Abraham
Weintraub, fez uma bobagem semelhante. Em tuíte postado no sábado, usou a
imagem do Cebolinha, personagem da Turma da Mônica, na Muralha da China, e
substituiu o “r” pelo “l”, ironizando o modo como ele acha que os chineses
falam português. “Quem podeLá saiL foLtalecido, em teLmos Lelativos, dessa
cLise mundial?”, escreveu o ministro.
Essa iniciativa irresponsável foi marcada por três importantes
coincidências. Entre segunda e terça-feira da semana passada, o governo
brasileiro foi surpreendido com a decisão do governo chinês de enviar material
médico-hospitalar para os Estados Unidos, em detrimento de acordos que já
haviam sido firmados com o Brasil. Na quinta e na sexta-feira, o ministro da
Saúde, Luís Henrique Mandetta, deu declarações explicando o quanto o Brasil
depende do fornecimento de equipamentos provenientes da China, a principal
fonte mundial de material médico-hospitalar, para poder enfrentar a pandemia do
novo coronavírus de modo eficiente. Além disso, no dia em que Weintraub postou
seu tuíte, o cônsul-geral da China no Rio de Janeiro publicou um artigo no
jornal O Globo refutando as declarações ofensivas do filho do presidente
Jair Bolsonaro.
Após a inconsequente atitude do ministro da Educação, que
deu a medida de seu despreparo, a embaixada da China distribuiu nota
classificando suas palavras e ironias como “absurdas e desprezíveis”, com
“cunho fortemente racista e objetivos indizíveis”. A nota também afirma que, ao
estigmatizar os chineses, o tuíte de Weintraub vai na contramão da “cooperação
proativa internacional necessária para acabar com a pandemia e restabelecer a
saúde pública mundial com brevidade”.
Nas duas notas de protesto divulgadas pela embaixada em
resposta às tolices do filho de Bolsonaro e de seu ministro da Educação, o
denominador comum foi a menção ao fato de que as falas de ambos “causaram
influências negativas no desenvolvimento saudável das relações bilaterais
China-Brasil”. Isso dá a medida do descalabro com que o governo Bolsonaro vem
se comportando em matéria de política externa. Justamente no momento em que o
Brasil mais precisa da China para salvar vidas, a população brasileira colhe os
ventos e os raios da tormenta criada pela copa e cozinha do presidente da
República.
No primeiro incidente, em vez de pedir desculpas exigidas
pela China, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, saiu em defesa
do filho do presidente, limitando-se a afirmar que a opinião do deputado
Eduardo Bolsonaro não refletia a posição do governo brasileiro. O que dirá
agora após o segundo incidente, quando tolices semelhantes foram postadas por
um ministro de Estado? Ainda no primeiro incidente o presidente Bolsonaro
tentou remediar os efeitos negativos da fala de seu filho e ligou para o
presidente chinês, Xi Jinping, a pretexto de “reforçar os laços de amizade”. Se
for atendido, o que poderá alegar agora, depois do texto difamatório que
Weintraub postou em seu Twitter?
Em matéria de relações exteriores, os países têm de fazer
escolhas. Como qualquer nação soberana, a China escolhe os beneficiários do
material médico-hospitalar que produz conforme seus interesses estratégicos e
com base na qualidade de seus relacionamentos bilaterais. Diante do estrago
feito primeiramente pelo deputado Eduardo Bolsonaro e, agora, pelo ministro
Weintraub, qual será o comportamento do governo brasileiro, uma vez que nada
fez para merecer tratamento favorecido ou prioritário do governo chinês nesta
crise sanitária?


Nenhum comentário:
Postar um comentário