O procurador-geral da República, Augusto Aras, não consegue
nem mesmo entrar no elevador cheio na sede de Brasília da instituição que
preside, tamanho o desconforto que está provocando entre seus pares.
A proximidade excessiva, quase obscena, com o presidente
Bolsonaro, a quem cabe a Aras julgar no caso da interferência na Polícia
Federal, traz o descrédito ao corpo de procuradores. Não é por acaso que surgiu
o abaixo-assinado, com assinaturas de mais da metade dos componentes do
Ministério Público, para tornar lei a praxe de o presidente da República ter
que escolher de uma lista tríplice o ocupante do cargo.
Aras colocou-se à margem da corporação, não participando da
disputa, atitude que agradou a Bolsonaro. Mesmo assim, a revolta interna o
atinge, a ponto de ter havido uma reação branca dos procuradores, que se
recusaram a ajudá-lo a escrever a manifestação da PGR contra o inquérito das
fake news.
Em Brasília, já há quem o chame de procurador-geral do
Bolsonaro. Ou quem diga que o governo tem hoje três pessoas exercendo o cargo
de advogado-geral da União: o próprio, José Levi, o atual ministro da Justiça e
Segurança Pública, André Mendonça, e o procurador-geral da República, Augusto
Aras.
Os dois últimos, por sinal, disputando vagas no Supremo
Tribunal Federal, a cenoura com que Bolsonaro lhes acena para conseguir que
assumam tarefas incompatíveis com os cargos que ocupam. Por isso, há no
Congresso uma movimentação para aprovar uma lei que impediria que o
procurador-geral da República fosse reconduzido ao cargo, e também exigiria uma
quarentena para que pudesse assumir cargo no governo depois de terminar seu
mandato.
Mendonça, por exemplo, não seria o mais indicado para
assinar a petição do habeas corpus para o ministro da Educação, Abraham
Weintraub, no Supremo Tribunal Federal. Seria tarefa de José Levi, mas
Bolsonaro queria que o ato tivesse uma demonstração política de repúdio à
convocação de seu ministro e de todos os que foram alvo da ação da Polícia
Federal na quarta-feira. É esse tipo de solidariedade política que Bolsonaro
exigia, e nunca obteve, de Sergio Moro.
Aliás, este governo é tão disfuncional que, na fatídica
reunião ministerial, Bolsonaro estranhou que ministros fossem elogiados
enquanto ele recebia críticas da imprensa. Criou-se até uma campanha nas mídias
sociais estimulando elogios ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, para
que fosse demitido por ciúmes de Bolsonaro.
O humor tem sua razão de ser, mas, de repente, Weintraub,
que estava sob críticas de alas do Planalto que o consideram, além de
incompetente, um gerador de atritos com a sociedade, passou a ser um símbolo
dos extremistas após ter dito na reunião que colocaria “os vagabundos do
Supremo” na cadeia.
Temeu ser preso, exigiu uma proteção oficial, gerando o tal
habeas corpus. Chamado a depor, ficou em silêncio, numa atitude de protesto,
embora legal. Ganhou alguns meses de vida. Ontem, foi condecorado pelo
presidente Bolsonaro com a Ordem do Mérito Naval, ao lado do procurador-geral
da República (do Bolsonaro?), Augusto Aras.
A desenvoltura com que o presidente utiliza-se dos
instrumentos institucionais para fazer política é surpreendente. Usa
condecorações oficiais para mandar recados, vai a posse de procuradores sem ser
convidado para elogiá-los numa tentativa de constrangê-los, coloca Augusto Aras
oficialmente numa lista de nomes para o Supremo Tribunal Federal, humilhando-o
publicamente. Distribui cargos a rodo para o centrão, sem o menor pudor.
Talvez esteja indo com muita sede ao pote, temendo que os inquéritos em andamento o peguem desprevenido no meio do caminho. Tal qual o governador do Rio, Wilson Witzel, seu antigo amigo e hoje inimigo figadal, Bolsonaro e seus filhos foram apanhados muito cedo pela Justiça. Como Michel Temer, terá que dedicar o resto do mandato a salvar a sua pele e a dos seus. E daí?
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