O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal
(STF), deve se transformar no juiz que vai impactar novamente a política
brasileira. Ele conduz o inquérito do tribunal para investigar dezenas de
pessoas ligadas a Bolsonaro, incluindo seus filhos, deputados e empresários
responsáveis pelo desenvolvimento de uma sofisticada estrutura de fake news nas
redes sociais para atacar reputações de autoridades e de adversários do
presidente. O inquérito do STF, questionado pelos bolsonaristas, mas que a
maioria dos onze integrantes do colegiado deve reconhecer como legal na sessão
plenária da Corte nesta quarta-feira, 10, cruzou informações com as da CPMI das
Fake News, em andamento na Câmara e no Senado, e está fornecendo subsídios para
o Supremo criminalizar essa organizada rede criminosa. O grupo conta com
dinheiro de poderosos empresários para o financiamento de robôs e perfis falsos
na rede, e também com substanciais recursos públicos. Afinal, blogs de direita,
ligados ao mandatário, como Allan dos Santos, recebem verdadeiras fortunas
mensais da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) para abastecer esse
esquema ilegal. A operação contra eles já está em andamento há duas semanas. Em
breve, os integrantes do grupo organizado devem começar a responder
criminalmente por seus atos e muitos podem até ir para a cadeia, como aconteceu
na Lava Jato. Até porque, também na quarta-feira, 10, o Senado começa a votar a
Lei das Fake News, que deve estabelecer severas punições aos produtores e
distribuidores de notícias falsas, além dos que financiam e mantêm redes de
robôs e perfis fakes nas redes sociais na Internet. A lei dará base legal às
prisões que o STF pode impor a essa associação criminosa.
“As provas apontam para a real possibilidade de que o
gabinete do ódio seja uma associação criminosa” Alexandre de Moraes,
ministro do STF
O projeto da Lei das Fake News, apresentado pelo senador
Alessandro Vieira (Cidadania-SE), na semana passada, estava pronto para ser
votado na terça-feira, 2, mas ele sofreu várias mudanças feitas na véspera pelo
relator da matéria, o senador Ângelo Coronel (PSD-BA), levando a sua retirada
da pauta da sessão virtual do Senado. Os senadores pediram mais uma semana para
estudar melhor a questão. Na verdade, o projeto foi alvo de críticas de
entidades progressistas, provedores de Internet e também de aliados de
Bolsonaro. A ideia do projeto é punir as pessoas que financiam as redes de
robôs ou contas falsas que cometem crimes de difamação na rede mundial de
computadores. Para evitar o que aconteceu na campanha eleitoral de 2018, e que
continua acontecendo impunemente nas redes sociais, os senadores querem que
essas pessoas sejam enquadradas nas leis de organização criminosa e de lavagem
de dinheiro, que prevêem penas de 3 a 10 anos de prisão. São penas semelhantes
às fixadas para a maioria dos criminosos flagrados na Operação Lava Jato,
acusados de terem dilapidado os cofres da Petrobras.
A lei das fake news
A nova Lei das Fake News vai obrigar as pessoas que abrem
uma conta nas redes sociais a apresentarem CPF, CNPJ, RG e comprovante de
endereço para que sejam mais facilmente identificadas pela polícia e MP. A
obrigatoriedade das empresas em fornecerem esses documentos à polícia recebeu
críticas das empresas do setor e também das entidades que temem que o
endurecimento do processo acabe criminalizando os usuários da rede e ameaçando
a liberdade de expressão. O objetivo da nova lei é acabar com as contas falsas
e redes automatizadas não identificadas. O relator do projeto, senador Ângelo
Coronel, que também é o presidente da CPMI das Fakes News, espera que o banco
de dados dos usuários seja mantido. “Hoje, a polícia persegue os conteúdos
criminosos até chegar ao IP, mas muitas vezes as empresas se negam a revelar os
dados do usuário”, diz Coronel. Como o projeto de Vieira foi escrito em
parceria com os deputados Tábata Amaral e Felipe Rigone, o presidente da
Câmara, Rodrigo Maia, decidiu conversar com o presidente do Senado, Davi
Alcolumbre, para chegar a um texto conjunto. “A sociedade está cansada das fake
news utilizadas por pessoas que usam informação falsa de má fé, robôs para
disseminar o ódio e postagens negativas contra os adversários e instituições”,
disse Maia.
Os filhos do presidente
As investigações da CPMI das Fake News e o inquérito do
ministro Alexandre de Moraes já identificaram um número expressivo de
deputados, empresários e blogueiros que fazem parte dessa rede criminosa,
contando inclusive com o uso de recursos públicos. Afinal, são pelo menos doze
deputados federais, e dois estaduais, que utilizam a estrutura de seus
gabinetes, operados por funcionários públicos e computadores das casas
legislativas, para produzir e disseminar o ódio nas redes. Entre esses
deputados federais estão Bia Kicis (DF), Carla Zambelli (SP), Daniel Silveira
(RJ), Filipe Barros (PR) e Luiz Philippe de Orleáns e Bragança (SP), todos do
PSL bolsonarista, além do deputado Eduardo Bolsonaro, filho 03 do presidente.
Segundo depoimento à CPMI da deputada Joice Hasselmann, líder do PSL, Eduardo
usava o gabinete na Câmara para distribuir fake news por meio do perfil falso
Bolsofeios, operado por Eduardo Guimarães, seu chefe de gabinete. Outro filho
do presidente investigado, tanto pela CPMI como pelo STF, é o vereador Carlos
Bolsonaro, acusado de ser o coordenador do “gabinete do ódio”, que funciona no
terceiro andar do Palácio do Planalto. Joice diz que Carluxo é responsável pela
produção de “dossiês” e notícias falsas contra adversários do presidente.
Carluxo, inclusive, deve ser o próximo alvo da investigação
determinada pelo STF. O ministro Alexandre afirmou que as provas apontam para
“a real possibilidade de que o gabinete do ódio seja uma associação criminosa”.
Levantamento feito pela CPMI das Fake News, no entanto, tem
provas contundentes contra vários blogueiros que participam do esquema
bolsonarista e que recebem dinheiro do governo federal, a partir da Secom,
dirigida por Fábio Wajngarten. De acordo com a comissão, o governo distribuiu 2
milhões de anúncios pagos para os blogs sustentarem o jogo sujo na Internet. Do
total dos anúncios, 653.378 foram publicados em 47 canais de notícias falsas e
até distribuidores de pornografia, em apenas 38 dias (de 6 de junho a 13 de
julho de 2019). Um dos que mais receberam recursos oficiais é o canal de fake
news Terça Livre, do blogueiro Allan dos Santos, hospedado no YouTube. Ele
recebeu 1.447 anúncios pagos pela Secom. A comissão parlamentar não divulgou os
valores dos anúncios, mas certamente representam uma pequena fortuna mensal.
Além da propaganda paga pela Secom, o canal Terça Livre de Allan dos Santos
também recebeu 3.490 anúncios da Petrobras e outros 398 da Eletrobrás, de um
total de 28 mil comerciais patrocinados pelas estatais, que, assim, acabaram
sustentando o esquema criminoso das fake news.
Mentiras à CPMI
A descoberta do uso de verbas públicas para manter o blogueiro em operação pode levá-lo ao indiciamento na CPMI por perjúrio. No dia 5 de novembro, Allan prestou depoimento aos parlamentares negando receber dinheiro da Secom. O blogueiro, que foi alvo da operação do STF, se julga acima da lei. Depois de ter sido conduzido pela PF a prestar depoimento, ele fez uma live no seu canal atacando o ministro Alexandre de Moraes. “Você não vai me calar, seu careca, idiota, moleque”, disse Allan. Na mesma linha de hostilidade está a aloprada Sara Giromini, a Sara Winter, que montou a farsa do “acampamento dos 300” (que não passa de 30 gatos pingados) para atacar os adversários de Bolsonaro e pedir o fechamento do STF. Após ter sido alvo da investigação do Supremo, ela radicalizou nas suas redes sociais, dizendo que vai “infernizar” a vida do ministro Alexandre: “Vou te perseguir nas ruas e você nunca mais vai ter paz”. Além dos políticos e blogueiros, os empresários bolsonaristas também correm o risco de parar atrás das grades, como é o caso de Luciano Hang, da Havan; Edgard Corona, das academias Bio Ritmo e Smart Fit; e de Otávio Fakhoury, dono do site Crítica Nacional. O enredo da nova Lava Jato já está dado. Agora, só falta surgir o genérico do “japonês da federal”, já que o original, Newton Ishii, se aposentou.
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