A economia brasileira passa por um momento aparentemente
paradoxal.
A recuperação da produção, ainda que desigual nos diversos
setores, está bastante forte. Algumas estimativas indicam expansão de cerca de
9% neste trimestre, outras têm resultados mais modestos, mas acima de 6%. Tudo
indica que a recessão deste ano pode ficar em torno de 5%, bem melhor do que
muitos esperavam em abril.
Esses bons dados correntes, porém, não se refletem nos
preços dos ativos, que estão bem piores do que em outros países. A Bolsa de
Valores anda de lado, a taxa de câmbio se desvalorizou muito mais do que o
previsto e as taxas de juros de longo prazo passam de 8%.
A razão desse descolamento é a incerteza sobre a condução da
política fiscal e da agenda de reformas.
Os efeitos da política econômica ocorrem com retardo. A
monetária demora cerca de um ano para afetar a economia. A expansão fiscal
estimula rapidamente a atividade, mas a ameaça de uma trajetória insustentável
da dívida pública leva ao aumento dos juros longos, desestimula o investimento
e compromete o crescimento.
Os indicadores recentes de atividade, e os que vão sair nos
próximos meses, resultam da imensa queda recente da taxa de juros de curto
prazo, assim como da expansão fiscal decorrente do auxílio emergencial
implementado durante a pandemia.
Os preços dos ativos, por sua vez, refletem os riscos que
ameaçam a economia nos próximos anos.
O governo está em uma encruzilhada e parece dividido sobre
qual caminho tomar. Há quem defenda continuar com a política fiscal
expansionista, com a extensão do auxílio emergencial para o ano que vem e o
aumento do investimento público, sem afetar os demais benefícios concedidos
pelo governo.
Outros recomendam que o Orçamento para 2021 respeite a regra
do teto. Neste caso, expandir o Bolsa Família ou ampliar o investimento
verde-amarelo requer reduzir despesas em outros programas.
A tentação dos governos populistas é ignorar as restrições,
expandir o gasto público e distribuir benesses sem o ônus das más notícias. A
conta, porém, acaba por chegar. Nas circunstâncias atuais, uma nova crise pode
ocorrer antes da eleição.
Caso o Planalto opte pela saída fácil, poderemos vir a ter
saudade das taxas de câmbio e de juros deste ano e ser assombrados pela volta
da inflação, provavelmente já em 2021.
O caminho da política amadurecida e calejada pela gestão,
por outro lado, seria reconhecer os problemas, enfrentar os dilemas e dialogar
francamente com a sociedade sobre as difíceis escolhas a serem feitas.
Maturidade e diálogo, porém, até agora, não parecem ser
atributos do atual governo.
Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do
Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia.
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