Só crescimento gera empregos de forma sustentável, mas o
enorme desemprego ocasionado pela pandemia tende a frear o crescimento. O
Brasil enfrenta de novo essa velha charada, sempre repetida, em todo o mundo,
depois de uma grande crise. A desocupação chegou a 13,8% da força de trabalho,
no trimestre maio-julho, com 13,1 milhões de pessoas procurando uma vaga. Se a
esse grupo se juntarem os afastados por desalento e os muitos trabalhadores
subutilizados, chega-se a um total de 32,9 milhões. É um contingente maior que
a população do Peru, 32,5 milhões, incluídos velhinhos e criancinhas.
A reativação dos negócios, a partir de maio, foi puxada
principalmente pelo consumo. O poder de compra das famílias foi em boa parte
sustentado – e até ampliado, em alguns casos – pelo auxílio emergencial. O
último levantamento oficial indicou 67,7 milhões de beneficiários. Esse auxílio
foi reduzido de R$ 600 para R$ 300 a partir de setembro e será extinto em
janeiro, se nenhuma forma de financiá-lo for encontrada pelas autoridades.
A crise devastou o poder de compra da população. O
rendimento médio habitual até subiu 4,8% em relação aos três meses anteriores e
8,6% em relação a igual período de 2019. Nas mesmas comparações, no entanto, a
massa de rendimento habitual de todos os trabalhos caiu 3,8% e 4,7% e foi
reduzida a R$ 203 bilhões, com perda real de R$ 8 bilhões em três meses e de R$
10 bilhões em um ano. A redução do emprego mais que anulou, no conjunto, o
avanço registrado na média.
A ajuda emergencial possibilitou a retomada do consumo e as
vendas do comércio varejista retornaram ao nível pré-pandemia. Com a redução do
auxílio e, depois, com a sua extinção, a continuação da retomada será muito
menos segura. O horizonte fica ainda mais nebuloso quando se considera a hipótese
de maior deterioração nas condições de emprego.
Empresários têm-se mostrado mais otimistas, ou menos
pessimistas, segundo a Confederação Nacional da Indústria e a Fundação Getúlio
Vargas. A melhora do humor é compreensível, embora vários setores nem sequer
tenham voltado às condições de fevereiro. Além disso, economistas do governo e
do mercado têm melhorado suas expectativas em relação ao resultado final de
2020.
Em quatro ou cinco semanas a contração econômica estimada
para este ano passou de mais de 6% para cerca de 5%. Projeta-se para 2021
crescimento na faixa de 3,2% a 3,5%, insuficiente para o retorno ao nível de
2019. Os números mostram, de toda forma, uma aposta na continuação da retomada.
A melhora das expectativas pode contribuir para a recuperação
sustentada, pelo menos por alguns meses. Mas empresários ainda exibem muita
cautela quanto à contratação de pessoal e aos investimentos produtivos.
Em agosto houve contratação líquida de 249.388 trabalhadores
com carteira, segundo o Ministério da Economia. Foi uma rara notícia positiva,
mas no mercado formal ainda se perderam, no ano, 849.387 postos de trabalho.
Além disso, as condições gerais do mercado, com trabalhadores formais,
informais, desalentados e subutilizados, aparecem mais claramente nos dados do
IBGE.
A velha charada – como impulsionar o crescimento mesmo com o
desemprego elevado – tem sido resolvida, com frequência, por meio de estímulos
fiscais e monetários excepcionais. O BC poderá manter os estímulos monetários
por um bom tempo, se nenhuma grande incerteza forçar uma alta de juros. O
Ministério da Economia, no entanto, continua devendo pistas de como poderá
contribuir para a sustentação da retomada.
A discussão sobre como financiar a Renda Cidadã, ainda sem
solução, refere-se às preocupações eleitorais do presidente. O País ganharia
muito mais se a equipe econômica se concentrasse num plano de mobilização de
recursos, apesar das limitações orçamentárias, para sustentar a retomada e
abreviar a recuperação do emprego. Seriam medidas temporárias, ao contrário de
um novo programa social, mais administráveis e mais palatáveis para o mercado.
Seriam, além de tudo, ações típicas de um governo de verdade.
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