À primeira vista, parece paradoxal que a maior floresta
chuvosa, a Amazônia, e a mais vasta planície alagada do planeta, o Pantanal,
venham há meses ardendo em fogo, como atestam os dados oficiais.
Mas a lógica costuma ser desafiada no Brasil sob Jair
Bolsonaro, cujo governo vê a preservação como inimiga do desenvolvimento,
encoraja o desrespeito às normas ambientais e eleva o negacionismo a política
de Estado.
O
mês de setembro demonstrou mais uma vez a realidade trágica a que
estão entregues esses dois biomas de riquíssima biodiversidade —e que a
administração federal tanto se esforça para mascarar.
Enfrentando a pior estiagem em 60 anos, o Pantanal contabilizou
8.106 focos de queimadas. Trata-se da maior cifra para o mês e quase o triplo
do registrado há um ano.
As chamas na região superaram, em apenas nove meses, o
recorde anterior para um ano inteiro, consumindo até o momento 23% de todo o
bioma. Nada menos, portanto, que um cataclismo para a fauna e a vegetação
locais.
Embora menos crítica, a situação da Amazônia também
preocupa. A maior floresta tropical do mundo teve 32.017 focos de calor,
aumento de 60,6% em relação ao mesmo mês do ano passado e o maior número para o
período desde 2017.
Comum aos dois biomas é a origem da devastação. A
intervenção humana explica a maior parte dos incêndios, seja pela queima
intencional dos despojos de áreas previamente desmatadas, seja pelo descontrole
acidental do fogo usado para limpar pastagens.
Contra esses e outros fatos insurge-se o presidente,
secundado por seu vice, Hamilton Mourão, e pelo ministro do Meio Ambiente,
Ricardo Salles. Numa catadupa incessante de engodos, desinformação e má-fé, o
trio se alinha para confundir o debate público e desviar o foco sobre a incúria
estatal.
Para Bolsonaro, por exemplo, as más notícias não passariam
de uma campanha internacional para prejudicar o país, e o fogo seria causado
pela agricultura de subsistência de índios e caboclos em áreas já
desflorestadas, como
afirmou na Assembleia Geral da ONU.
Com declarações facilmente falseáveis como essas, que ecoam
apenas entre os apoiadores mais fanáticos, o presidente e seus cúmplices só
contribuem para calcinar a imagem do país no exterior.
Já não há dúvida de que nessa seara o governo guia-se apenas
pela paranoia das guerras culturais, em vez de ouvir instituições oficiais,
cientistas e organizações que atuam nas regiões afetadas.
Talvez só reste esperar que as pressões e os
constrangimentos vindos de investidores e parceiros comerciais cumpram o papel
que as evidências não têm conseguido.
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