Num domingo de abril, o presidente Jair Bolsonaro foi à
porta do Quartel-General do Exército, subiu na caçamba de uma caminhonete e
estimulou seguidores que bradavam por “intervenção militar” e AI-5. “Nós não
queremos negociar nada! Nós queremos ação pelo Brasil!”, vociferou.
Menos de seis meses depois, Bolsonaro toma café com Rodrigo
Maia, almoça com o centrão e janta com Gilmar Mendes. No último domingo, ele
foi à casa de Dias Toffoli comer pizza e assistir a um jogo do Palmeiras. A
imagem dos dois abraçados, como amigos que se reencontram para torcer pelo
mesmo time, é um retrato dos novos tempos em Brasília.
O extremista que prometia romper com o establishment passou
a dançar conforme a velha música. A indicação de Kassio Marques ao Supremo faz
parte da metamorfose. O presidente consultou Gilmar e Toffoli, inimigos jurados
da Lava-Jato, antes de oficializar a escolha do futuro ministro.
Eles não são os únicos a festejar o indicado. “Para além das
diferenças que nós temos, ele (Bolsonaro) pode deixar um grande legado para o
Brasil, que é o desmonte desse estado policialesco que tomou conta do nosso
país”, celebrou o senador Renan Calheiros. À CNN Brasil, ele listou outras
medidas que agradaram à classe política: o desmantelamento do Coaf, a demissão
de Sergio Moro, a nomeação de Augusto Aras.
Os elogios de Renan produziram um curto-circuito no
bolsonarismo raiz. Chamado de traidor, o capitão tenta contornar as críticas.
“Eu não quero acabar com a Lava Jato. Eu acabei com a Lava Jato, porque não tem
mais corrupção no governo”, gracejou ontem, no Planalto.
É ilusão pensar que o exercício do poder moderou Bolsonaro.
Estamos diante de um acordão, que o uniu a políticos que demonizava. A turma
quer blindagem e sossego, mercadorias que Gilmar sempre soube entregar. A
fantasia da conciliação pode ser rasgada a qualquer momento: basta que o
capitão se sinta seguro para chutar os aliados de conveniência. Enquanto essa
hora não chega, todos celebram a paz com brindes de tubaína.
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