Até quem já se acostumou com a incontinência verbal do governo Jair Bolsonaro se espantou ao saber que o ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou de burro o da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, numa reunião com deputados.
A pauta do encontro era a retirada de R$ 600 milhões do orçamento da pasta do astronauta para este ano. Os parlamentares foram a Guedes apelar para que reconstituísse a verba subtraída e ouviram então o ministro criticar o colega.
Pontes é um ministro decorativo, que mais parece orbitar a pasta sem nunca ter nela aterrissado para liderar um setor crucial para o desenvolvimento, sobretudo num governo dado à ignorância.
Em raro rompante na defesa da pesquisa, o ministro disse no início do mês que pensara em se demitir, chateado com a perda dos recursos, mas que a inclinação tinha passado. A ameaça implícita teve parca repercussão. Ainda assim, foi o que bastou para deixar Guedes irritado.
Pontes é irrelevante, mas a comunidade científica tem razão para reclamar. Em 2020, o investimento em ciência e tecnologia foi o menor em 12 anos, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério da Economia.
Em 2013, no pico das verbas do setor, investiram-se R$ 27 bilhões. Em 2020, a cifra retrocedeu para R$ 17 bilhões —isso num ano de pandemia, em que seriam de esperar vultosos dispêndios na pesquisa de vacinas e outras iniciativas.
Pontes, entretanto, preferiu ocupar-se com terrenos na Lua, remédios ineficazes contra a Covid-19 e um spray à base de nióbio para limpar as mãos e combater o coronavírus, que, como todos sabem, se dissemina principalmente pelo ar.
Em agosto, Guedes enviou ao Congresso projeto de lei abrindo crédito suplementar de R$ 690 milhões para o combalido ministério do astronauta, na mesma época em que até a plataforma de currículos acadêmicos Lattes saiu do ar por falta de recursos para manutenção.
Dois meses depois, Economia e Casa Civil decidiram realocar R$ 600 milhões da verba para outras pastas. Segundo Guedes, a medida foi tomada porque Pontes é incompetente e não consegue gastar nem o que seu ministério recebe.
O ministro atacado se defendeu e disse que o colega da Economia talvez esteja confuso, dada a dificuldade para fechar as contas do Orçamento de 2022. Na ausência de diálogo, a investigação científica e tecnológica perdeu mais uma.
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