Boa parte das angústias das pessoas que se preocupam com o futuro da democracia advém do impacto dos espaços digitais sobre o tecido social e a capacidade de deliberação dos cidadãos. A invasão do Capitólio nos Estados Unidos tornou-se um ícone dos efeitos deletérios da desinformação e dos discursos tóxicos, intensificando a apreensão sobre o papel das redes sociais.
Neste contexto, o Pew Research Center inquiriu mais de 800 inovadores, executivos, gestores e pesquisadores do campo da tecnologia a propósito do futuro dos espaços digitais e seu papel na democracia. A grande maioria (70%) acredita que a revolução digital tem em igual medida aspectos positivos e negativos; 18% veem uma predominância dos negativos; e 10% dos positivos. Perguntados se, num arco de 15 anos, os espaços digitais serão ou não utilizados de maneira que servirão significativamente ao bem comum, 61% afirmaram que sim e 39%, que não.
Os pessimistas apontam que as fragilidades e perversidades humanas tendem a se amplificar com as novas tecnologias. Humanos são autocentrados e têm a visão curta; logo, são fáceis de manipular. Muitos temem que as instituições humanas não sejam capazes de acompanhar o ritmo e a complexidade das comunicações digitais. Alguns preveem mesmo uma espiral distópica com os avanços na Inteligência Artificial, hipervigilância, a “dataficação” de cada aspecto da vida ou engenharias comportamentais abastecidas pelo autoritarismo e magnificadas pela desinformação.
É um dado que, para maximizar os lucros, os atuais algoritmos das mídias sociais são programados para acelerar o engajamento dos usuários. O problema é que, mais ou menos deliberadamente, eles acabam favorecendo meios de engajamento eficazes, mas socialmente destrutivos, como o extremismo, o ódio e a mentira.
Diante disso, os otimistas ancoram suas melhores esperanças no redesenho dos algoritmos a fim de qualificar a interação dos indivíduos e robustecer o debate democrático. Há um anseio difuso por uma regulação que promova o discurso cívico e reprima a desinformação. Mas ele se depara com a questão crucial: quem seria responsável pelos critérios e sua execução: os governos? As próprias mídias? Os usuários?
Para muitos, o Estado, por meio de uma combinação de regulação e pressões brandas, teria o papel de induzir as empresas de tecnologia a adotar comportamentos mais éticos. Alguns apontam que, como em todos os avanços anteriores na comunicação humana, após um primeiro momento disruptivo, o letramento digital e a familiaridade com os aspectos mais tenebrosos da tecnologia trarão naturalmente melhoras.
Entre as propostas que têm sido aventadas para redesenhar o ambiente digital estão a introdução de mais competição no ecossistema de informações por meio de softwares que permitam às pessoas escolher algoritmos que priorizem conteúdos conforme seus padrões editoriais; sistemas eletivos online que favoreçam consensos ao invés da polarização entre grupos partidários; uma Declaração dos Direitos da Internet que permita uma soberania individual, garantindo o anonimato a cada pessoa, mas erradicando robôs; ou sistemas de comunicação construtivos que reduzam a voltagem do ódio e concilie divisões.
É possível apontar fragilidades e riscos em cada uma dessas estratégias. Possivelmente, o melhor caminho será uma combinação de todas – de maneira que as virtudes de umas compensem os vícios de outras –, orientada pelo princípio da subsidiariedade, ou seja, a primazia da regulação sobre o conteúdo caberia ao usuário e, subsidiariamente, às outras autoridades, das menos às mais centralizadas: as próprias mídias, os governos nacionais e, por fim, uma governança global.
O que parece incontroverso é que, tal como o espaço público físico, o virtual precisa de alguma regulação. É a única alternativa à anarquia. E se essa regulação não for implementada pela coletividade conforme os princípios e métodos democráticos, a história sugere que inevitavelmente o será conforme as ambições autocráticas ou plutocráticas de uns poucos.
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