A Câmara dos Deputados e o Senado Federal iniciam nesta quarta-feira (2/2) o ano legislativo de forma semipresencial e de olho nas eleições de outubro, o que diminui a margem para aprovação de pautas polêmicas, sobretudo de interesse do governo Jair Bolsonaro.
A janela de aprovação deve ocorrer até meados de maio. Após esse período, parlamentares voltam às atenções aos redutos eleitorais, e Brasília passa a funcionar em “esforço concentrado”. Pautas armamentistas, de costumes ou de reformas podem movimentar o início de ano, mas sem grandes expectativas de aprovação, avaliam congressistas.
No Senado, há expectativa em relação à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110/19, da reforma tributária, e ao Projeto de Lei 3723/19, que trata das regras de registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição para caçadores, atiradores e colecionadores – grupo conhecido como CACs –, que estão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, e às propostas relacionadas ao preço dos combustíveis.
Neste último caso, há o PL 1472/21, que trata das diretrizes dos preços dos combustíveis e cria o Fundo de Estabilização dos valores, mas o governo ainda debate se enviará uma PEC sobre o tema, que prevê redução de impostos para gasolina, diesel e etanol. Trata-se de uma pauta sensível e com potencial eleitoral.
Ainda durante o recesso, um antigo impasse sobre o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) dos combustíveis ampliou o atrito entre presidente e governadores e evidenciou o desgaste entre as Casas: após governadores cobrarem uma solução definitiva do Executivo para o preço da gasolina, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), jogou a responsabilidade para o Senado.
O presidente da Casa Alta, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), anunciou que pautaria o PL 1472/21 e designou o senador Jean Paul Prates (PT-RN), líder da Minoria, como relator da proposta.
“Não é razoável pensar em uma solução impositiva, sem o devido diálogo. Devemos evitar o cultivo desarrazoado de animosidades. Esperamos que o Poder Executivo não se omita, e faça seu papel, atuando como gestor, sem transferência de culpa e terceirização de responsabilidades”, rebateu Prates.
Na CCJ, o presidente da comissão, Davi Alcolumbre (DEM-AP), prometeu na última sessão de 2021 que pautaria a reforma tributária na primeira sessão deste ano. A proposta tem apoio de Pacheco, mas sofre resistência de deputados e do presidente da Câmara, que querem ver avançar no Senado o PL 2337/21, a reforma do Imposto de Renda, já aprovado na Câmara e também motivo de desacordo entre as Casas. A reforma do IR é parte da reforma tributária fatiada por Lira.
“Reforma tributária tem que ser discutida à exaustão, não dá para ser de mesa. Temos que ouvir todos os segmentos, e eu sinto que há várias barreiras à PEC 110, como tem a do IR, que está na minha mão. Quando chegar abril, maio vem a campanha eleitoral, e é mais difícil termos quórum qualificado para votarmos projetos que mudam e muito a vida do brasileiro”, destaca o senador Angelo Coronel (PSD-BA), relator da reforma do IR.
“Reforma tributária deve ser feita em início de governo. Eu torço para que a reforma tributária — tanto IR quanto a PEC 110 — entre na pauta de discussão no início de 2023”, acrescenta.
Outro projeto que pode ser pautado é o que trata de porte e posse de armas, relatado pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES), que apresentou seu parecer no fim do ano. Após pedido de vista, a discussão ficou para o início deste ano, mas sofre resistência na Casa.
CPMI das Fake News
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News também deve retornar este ano, mas ainda sem data para reinício. Afinal, o Senado manteve o trabalho em formato híbrido, e a Câmara voltou ao formato remoto ao menos até o início de março por causa da variante Ômicron do coronavírus.
Com 207 dias – ou seja, quase sete meses – para finalizar os trabalhos, a comissão, que talvez seja retomada em março e siga até o período eleitoral, pode ser um calo para o presidente Jair Bolsonaro às vésperas do pleito.
“Ela [a CPMI] vai servir de link para receber denúncias, investigá-las em tempo real e enviá-las ao Ministério Público e à Polícia Federal. É o que pretendemos com a reabertura”, afirma Coronel, que também é presidente da CPMI das Fake News. “Ela terá potencial contra qualquer candidato que use as redes sociais indevidamente.”
Câmara
Na Câmara, há a expectativa que sejam avaliados em plenário o PL 442/91, que trata da liberação dos jogos de azar, apesar da resistência da bancada evangélica; o PL 1.595/19, da Lei Antiterrorismo; e o PL 6.438/19, sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição.
O deputado Sanderson (PSL-RS), vice-líder do governo, reforça que os projetos das armas e da Lei Antiterrorismo, dos quais é relator, são de interesse do Palácio do Planalto e acredita que devem ir à votação ainda no primeiro semestre.
“Tem também a questão dos jogos, dos cassinos, que não é matéria do governo, mas vai a voto e vai passar. Quando votamos o regime de urgência, vimos no placar. Temos mecanismos no Brasil para fazer o controle de evasão de divisas, combate à prevaricação, temos Receita Federal, Controladoria-Geral da União (CGU) e Polícia Federal para fazer o controle quanto a qualquer tipo de burla”, defende.
Além delas, o governo também não desistiu do PL 2.401/19, do homeschooling, e do 6.299/02, que muda, entre outras coisas, a forma de autorização dos agrotóxicos.
Outra pauta polêmica que deve começar a ser debatida neste ano é a que trata do semipresidencialismo, defendido abertamente por Lira, porém para valer a partir de 2030.
O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), afirma que temas polêmicos, como pautas de costumes ou armamentistas, não devem avançar neste ano. “Esses temas mais polêmicos não terão facilidade em avançar. O ambiente vai estar contaminado pela polarização da disputa política. Já temas com mais consenso podem avançar”, avalia.
Líderes das duas Casas também não acreditam que a agenda de reformas e privatizações avance.
Congresso
Além das pautas das duas Casas legislativas, o Congresso inicia o ano com 36 vetos do presidente Bolsonaro pendentes de votação. Entre eles, o veto ao Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, que visava fornecer absorventes para mulheres em situação de vulnerabilidade; à Lei de Segurança Nacional; à quebra de patentes; e ao projeto de privatização da Eletrobras. Todos esses sem acordo até agora.
Já o veto ao projeto que institui um programa de renegociação de dívidas para micros e pequenas empresas deve ser derrubado, inclusive com a ajuda do governo. Em três anos de gestão, Bolsonaro é o presidente que mais teve vetos derrubados pelo Congresso, e deve ampliar essa margem.
“A questão [da derrubada] do veto do Refis está no radar e deve vir no início do ano. Os demais [vetos] vão depender das discussões”, diz o líder do DEM.
Para rejeitar um veto presidencial, é necessária a maioria absoluta de votos — ou seja, pelo menos 257 votos de deputados e 41 de senadores. Por causa da pandemia da Covid-19, as sessões têm sido realizadas de forma alternadas – só entre deputados, e depois entre senadores.
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