A corrida pelas últimas vagas de emprego no governo começou cedo em 2022. No primeiro mês daquele que, ao que parece, será o último ano de mandato de Jair Bolsonaro, aliados iniciaram um já tradicional movimento de tentar garantir espaço em órgãos públicos e estatais antes que o atual presidente perca o poder que ainda tem. É o caso do Ministério de Minas e Energia (MME), que, segundo revelou o Estadão, tentou criar nada menos que 200 cargos na Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBpar), companhia cuja razão de existência é permitir a privatização da Eletrobras.
A ENBpar, em tese, apenas assumiria atividades que precisam continuar sob domínio da União, como as usinas de Angra, dado que a exploração das atividades nucleares é monopólio constitucional, e Itaipu, usina binacional regida por um tratado entre Brasil e Paraguai. Há também políticas públicas coordenadas pela Eletrobras que seriam repassadas à nova empresa. O fato de que a estrutura interna de Itaipu e da Eletronuclear não passará por mudanças e será simplesmente transferida da Eletrobras para outra holding garantiria uma “estrutura enxuta”, segundo anunciou no início de janeiro o próprio CEO da companhia, Ney Zanella dos Santos, vice-almirante da Marinha.
Na semântica da ala militar do governo, 200 cargos aparentemente representam uma estrutura enxuta, mas essa interpretação não é compartilhada pela Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest) do Ministério da Economia (ME), que deu aval a apenas 27. Questionado, o MME disse ter solicitado o que julgava ser “suficiente”, afirmou que o número final de funções a serem criadas ainda estava em análise e não explicou o motivo que justificaria um quantitativo de funcionários sete vezes maior que o autorizado pelo ME. É preciso lembrar que se trata da segunda empresa pública que nasce em uma gestão que prometia arrecadar R$ 1 trilhão com a venda de estatais, e que a capitalização da Eletrobras ainda precisa do aval do Tribunal de Contas da União (TCU) para se concretizar.
Não é um caso isolado. Em um País que registrou uma taxa de desemprego de 11,6% no trimestre encerrado em novembro e a menor renda da série histórica, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos Da Costa, teve o mérito de criar um emprego para si mesmo e quadruplicar seu salário. Ele vai chefiar um escritório de representação da pasta em Washington, nos Estados Unidos, cujo objetivo será “fortalecer a interlocução com investidores, consolidando o País como ambiente seguro para se fazer negócios”, de acordo com a Secretaria-Geral da Presidência da República.
Parece uma estrutura redundante, já que essa atribuição pertence à Embaixada do Brasil na capital norte-americana. E de fato é, tanto que Da Costa terá remuneração equiparada à função de embaixador, algo em torno de R$ 75 mil mensais. O decreto estabelece ainda que a “duração da missão” será de dois anos e poderá ser prorrogada uma vez. Com isso, o secretário garantiu um cargo com o qual atravessará, ao menos, o primeiro ano de mandato do próximo governo.
Com a consolidação do resultado das pesquisas eleitorais, a tendência é que o mundo político em Brasília antecipe o fenômeno do “café frio”, expressão que descreve os últimos meses de mandato de um presidente, quando ninguém mais procura o mandatário e nem os garçons se esforçam para agradar-lhe. Mas enquanto o café estiver morno, aqueles que tiveram o nome associado à gestão bolsonarista tentarão avançar sobre a estrutura do Executivo com tanto ou mais apetite que seus antecessores para garantir os últimos nacos de poder. Em seguida, passarão a trabalhar com afinco para se desvincular da tragédia que foi a administração de Bolsonaro e se colocarão como técnicos a serviço do País. São os mesmos que falavam em “despetizar” o governo e que abandonaram a reforma administrativa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário