SÃO PAULO — Após o bombardeio russo sobre o território ucraniano na madrugada da quinta-feira, diversos atores políticos no Brasil e no exterior começaram a se manifestar — e tomar lado — sobre a guerra. Mas em meio à hesitação do presidente Jair Bolsonaro em se posicionar, diferentemente de seus pares, bolsonaristas e grupos de direita radical demonstram confusão sobre de qual lado ficar.
Nos grupos de Telegram e nos perfis bolsonaristas nas redes sociais, onde geralmente dominam os discursos prontos a favor ou contra alguma ideia, usuários vacilam em assumir quem é o certo da história. “Entre Biden e Putin, eu fico com Trump e Bolsonaro”, resumiu a militante bolsonarista com 186 mil seguidores no Twitter. No aplicativo de troca de mensagens, após uma quinta-feira sem predominância de narrativas, começam a circulam mensagens a favor de cada um dos lados. Há usuários chamando os Estados Unidos de “principal instigador do conflito”, enquanto outros defendem a expulsão de membros a favor de Putin desses grupos.
Paulo Eneas, editor de um dos principais sites pró-Bolsonaro, chamou Putin de “ditador”, posição que tem sido assumida pelos olavistas. O bolsonarista Paulo Figueiredo, comentarista da Jovem Pan, associou Biden a uma “criança” e criticou o Partido Democrata, alinhado aos fãs do ex-presidente Donald Trump no Brasil. A família Bolsonaro tem evitado tocar no assunto. Eduardo Bolsonaro se limitou a compartilhar em suas redes uma nota oficial do governo federal que “apela à suspensão imediata das hostilidades” sem condenar o bombardeio.
Parte da dubiedade se associa ao fato de a própria Ucrânia ter se tornado referência para alguns grupos de extrema-direita no Brasil. Em 2020, no auge dos acampamentos e atos pró-Bolsonaro em Brasília e outras capitais pelo país, a bandeira ucraniana era frequentemente vista entre os manifestantes.
Figuras como a militante Sara Winter, que foi presa por organizar protestos antidemocráticos, diziam querer “ucranizar o Brasil”, já que o país europeu era tomado como exemplo por bolsonaristas pela forma como a extrema-direita conseguiu se organizar e agir politicamente. O termo se popularizou entre apoiadores de Bolsonaro. O deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), base do governo na Câmara, publicou em seu Twitter em abril de 2020: “Está na hora de ucranizar o Brasil! Quem sabe o que foi feito por lá, entenderá”.
Um grupo chamado “Ucraniza Brasil” ficou acampado por alguns dias no vão do Masp, em São Paulo, em 2021, antes de ser retirado pela polícia. A partir de então, passou a se organizar num grupo homônimo de 5 mil pessoas no Telegram, onde simpatizantes compartilham discursos extremistas e teorias conspiracionistas.
Nos últimos dias, esses usuários passaram a acompanhar os relatos do brasileiro Alex Silva, que participou dos atos antidemocráticos de 2020 ostentando uma bandeira da Ucrânia e chegou a ser visto como uma liderança no processo de “ucranizar” o Brasil. Silva tem enviado vídeos e informações diariamente da Ucrânia, onde ele diz trabalhar em uma academia de tiro e táticas militares.
Além das principais democracias ocidentais, estão ao lado da Ucrânia nesta guerra também partidos de extrema-direita europeus. É o caso de Jaroslaw Kaczynski, líder do partido ultraconservador Lei e Justiça (PiS), e Viktor Órban, primeiro-ministro da Hungria e líder do Fidesz. Mas, por outro lado, para embaralhar ainda mais o assunto, há também figuras odiadas pelos bolsonaristas como os presidentes Joe Biden (Estados Unidos) e Emmanuel Macron (França) — o que torna o apoio desses grupos à situação ucraniana menos categórico.
Em apoio a Vladimir Putin — ou pelo menos um esquivamento em condenar o bombardeio sem ressalvas — há outros nomes da extrema-direita, como Steve Bannon, ex-estrategista da campanha de Trump, e o próprio ex-presidente americano. Bolsonaro se encontrou com Putin em Moscou dias atrás, ocasião em que demonstrou “solidariedade” à Rússia. Após o bombardeio, o presidente preferiu se esquivar do assunto em discursos e conversas com apoiadores.
Mas desse lado também está parte da esquerda. O perfil do PT no Senado, por exemplo, fez uma publicação controversa no Twitter na quinta-feira: disse condenar “a política de longo prazo dos EUA de agressão à Rússia e de contínua expansão da OTAN em direção às fronteiras russas”. Pouco após ser publicado, o tuíte foi deletado da rede social, e uma nova nota condenando os ataques foi publicada.
Manuela D’Avila (PCdoB), candidata a vice-presidente na chapa de Fernando Haddad na eleição de 2018, após pedir paz ao conflito, chamou as preocupações da Rússia de “legítimas” e criticou “o cerco da OTAN às fronteiras russas”. Já o PCO (Partido da Causa Operária), legenda de extrema-esquerda, declarou “apoio total à ação da Rússia na Ucrânia”.
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