terça-feira, 27 de dezembro de 2022

O INTERLOCUTOR DE LULA COM A FARIA LIMA E A PERIFERIA

Andrea Jubé, Valor Econômico

“Lula não faz só o que quer”, diz aliado sobre ministério

Em tom de desabafo, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou na quinta-feira que é “mais difícil montar o governo do que ganhar as eleições”. Foi, evidentemente, um arroubo, porque na hipótese mais razoável montar um governo deve ser tão difícil quanto vencer as eleições.

O desassossego de Lula em relação aos aliados que não conseguiu acomodar, sendo alguns deles quadros que o acompanham há décadas, é tão cristalino que ele mandou um recado aos aflitos: “a quem está aqui, que ainda vai ser ministro, espere que a sua vez chegará”.

Um dos destinatários deste recado é o líder do PT, deputado Reginaldo Lopes, que fez intensa campanha para Lula em Minas Gerais, e desistiu de concorrer ao Senado para viabilizar a aliança com o PSD no Estado. A vaga coube ao senador Alexandre Silveira (PSD), aliado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que não se reelegeu, mas será ministro.

Lula vem sendo lembrado de que sua vantagem sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL) em Minas foi de 600 mil votos no primeiro turno. Caiu para 49 mil no segundo turno, após o apoio do governador reeleito Romeu Zema (Novo) ao adversário. Desse total, 40 mil votos vieram dos eleitores de Juiz de Fora, cidade governada pela prefeita do PT, Margarida Salomão, aliada de Lopes.

Lula precisa de espaço para alojar representantes de pelo menos dez tendências do PT, dos movimentos sociais, dos partidos de esquerda e dos aliados que chegaram após a vitória nas urnas. Estes vieram no fim da jornada, mas são necessários para a frente ampla que o petista tenta construir para governar. “Lula não faz só o que quer, faz o que pode ser feito”, diz um interlocutor do presidente eleito.

A escolha do futuro ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macedo, ilustra a angústia presidencial. Ele disputava a vaga com o advogado e fundador do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, e com o ex-prefeito de Osasco, deputado estadual reeleito e coordenador da campanha de Fernando Haddad, Emídio de Souza.

A opção por Macedo implicou vários critérios. Integrante da Executiva Nacional, pesou ele ser aliado de primeira hora da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, uma das mais influentes na definição dos ministros.

Além disso, Macedo aproximou-se de Lula nos últimos anos. Em 2017, foi o coordenador das Caravanas da Cidadania e percorreu com Lula os Estados do Nordeste, da Região Sul, além de municípios do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais. E foi o tesoureiro da campanha presidencial.

Pelo lado pragmático, a nomeação de Macedo abre uma vaga na Executiva Nacional do PT, porque ele terá de se afastar da vice-presidência da sigla para assumir a pasta. Ao mesmo tempo, desponta como um dos cotados para a sucessão de Gleisi nos próximos anos.

Diante da decisão de Lula, Emídio cogita permanecer em São Paulo para exercer o mandato de deputado estadual. Em paralelo, o nome dele começou a circular para um dos cargos estratégicos do segundo escalão: diretor-geral da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), vinculada ao Ministério da Economia.

Embora os três sejam próximos a Lula, Marco Aurélio era visto por uma ala do PT como o perfil mais adequado para o ministério, que fará a interlocução com os movimentos sociais. A principal missão da pasta será resgatar as conferências nacionais temáticas, que discutem políticas públicas para cada setor e tornaram-se uma das obsessões de Lula para o terceiro mandato.

Advogado na área empresarial, Marco Aurélio é, simultaneamente, um militante social há mais de 30 anos. Ele é um dos organizadores frequentes do “Natal com os catadores”, em que Lula confraterniza com a população de catadores de material reciclável de São Paulo e vem sendo reeditado desde o primeiro mandato do petista.

Marco Aurélio é filiado ao PT há 29 anos e foi uma das raras vozes na advocacia que defenderam o partido no escândalo do mensalão em 2005. Quando saiu em defesa de Lula na Lava-Jato, já não era uma voz isolada.

Aos 12 anos, Marco Aurélio ouviu Lula discursar na Praça Charles Miller, na campanha de 1989, e desde então, passou a seguir de perto o líder petista. Aos 16 anos, assinou a ficha de filiação ao PT. Aos 21 anos, encontrou-se com Lula pela primeira vez. Recebeu das mãos dele o prêmio por fazer parte da “equipe de jovens mais alegre” da campanha de 1998. Era um boneco inflável do Lula.

Depois de militar na juventude do PT, migrou para a militância social. Na faculdade de Direito da PUC-SP, estagiou na Central dos Movimentos Populares, na Unificação de Luta dos Cortiços. Recentemente, aproximou a Coalizão Negra por Direitos do PT, numa fase de distanciamento da sigla de sua base social.

Atualmente, sócio de uma banca bem sucedida na advocacia empresarial, Marco Aurélio se notabilizou como um quadro do PT que fala, ao mesmo tempo, “com a Faria Lima e com o Capão Redondo”.

Por essa qualidade, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), o sondou para assumir a presidência do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o “Conselhão”, outra obsessão de Lula. O órgão reúne trabalhadores, empresários e sociedade civil para discutir projetos para o país. Para não ter de se desligar da sociedade, Marco Aurélio aceitou fazer parte do colegiado, mas não será o presidente.

Ao fim, ele terá uma missão muito mais sensível do que se estivesse à frente da Secretaria-Geral, pasta que já foi comandada por Gilberto Carvalho na gestão de Dilma Rousseff. No ministério, Marco Aurélio se ocuparia apenas com os movimentos sociais, função que desempenha desde a juventude.

No “Conselhão”, terá que ajudar a manter os movimentos próximos de Lula. Mas, sobretudo, terá de falar a língua mais difícil, dominada por poucos no campo da esquerda. Ele será um dos interlocutores preferenciais do governo Lula com os empresários, em parceria com o vice eleito e futuro ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin (PSB).

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