Uma mentira em cima da outra
Nos primeiros dias deste mês, em depoimento à Polícia Federal, Bolsonaro disse que as joias no valor de 16,5 milhões de reais ofertadas pela ditadura da Arábia Saudita a Michelle, sua mulher, seriam incorporadas ao acervo do Estado brasileiro.
Após as joias serem apreendidas pela Receita Federal porque não foram declaradas à sua chegada, ele então tentou reavê-las até o último dia do seu mandato só para poupar o Brasil da vergonha de ter que leiloar um presente que recebera de outro país. É o que manda a lei.
A verdade é outra. O ex-assessor de Bolsonaro, tenente Cleiton Henrique Holzschuk, contou à Polícia Federal ter sido informado pelo tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid que as joias iriam para o “acervo pessoal” de Bolsonaro, não para o acervo do Estado.
Holzschuk trabalhava com Mauro Cid, que foi ajudante de ordens e uma espécie de faz-tudo de Bolsonaro. Consta do seu depoimento que, entre os dias 28 e 29 de dezembro último, quando Bolsonaro estava pronto para voar aos Estados Unidos,
“(…) foi falado pelo tenente-coronel Cid durante as conversas de WhatsApp relatadas que as joias iriam para o acervo pessoal do presidente da República”.
Por encomenda de Cid, Holzschuk escolheu o sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva para ir buscar as joias no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, onde elas repousavam no fundo de um cofre da Receita. O sargento voltaria de mãos abanando.
Ao mesmo tempo, Holzschuk entrou em contato com a secretária da Ajudância de Ordens, Priscilla Esteves das Chagas de Lima, para que adiantasse os documentos necessários de modo a concluir o trâmite de recebimento do presente por Bolsonaro.
Militar da Aeronáutica, Priscilla revelou à Polícia Federal que fez o que Holzschuk ordenou. Segundo ela, o ofício relatava que o “presente” havia sido transferido para a “posse do Presidente da República como presente pessoal e não institucional”.
Mas como as joias acabaram ficando onde estavam… Disse Priscilla que Holzschuk determinou que ela apagasse o ofício e os demais documentos. Priscila guardou o áudio onde ele afirma a certa altura:
“Aí, na segunda-feira [2 de janeiro] a gente tem que ver aí como é que faz pra excluir aí o ofício, excluir a documentação que a gente fez com relação ao recebimento desse material, beleza?”.
Ou seja: era preciso apagar qualquer evidência de que Bolsonaro pretendia apoderar-se das joias de Michelle para incorporá-las ao patrimônio do casal. Está na lei que todos os presentes recebidos por um presidente, inclusive os entregues por autoridades estrangeiras,
“devem ser considerados públicos, com exceção de itens de natureza personalíssima ou de consumo direto”.
Bolsonaro, portanto, mentiu à Polícia Federal. Não foi a primeira vez, e não será a última.
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