Presidente ambiciona selar aliança efetiva com governadores e, ao mesmo tempo, desarmar bolsonarismo nas polícias e estrangular financeiramente o crime
O plano de segurança que o governo começa a colocar em execução a partir do anúncio das operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLOs) nos portos e aeroportos é um primeiro passo do que o presidente Lula espera ter alcançado ao fim de seu mandato: um novo modelo de combate ao crime organizado que de fato signifique uma cooperação federativa efetiva e a superação da máxima segundo a qual a esquerda não tem projetos para essa área. Duas missões bastante complexas de ser atingidas com pleno êxito, todos estão cientes.
O tamanho da tarefa vem sendo mencionado como razão suficiente para justificar que Lula diga ao ministro da Justiça, Flávio Dino, que precisará dele à frente da empreitada —e, portanto, não deverá indicá-lo ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao menos não neste primeiro momento. Esse foi o primeiro efeito colateral colhido junto aos demais integrantes do governo e aos que acompanham a lenta discussão sobre a sucessão no STF desde que as medidas foram elencadas, com Dino e José Múcio à frente do comitê que coordenará as ações.
Mas como fazer para que o plano de agora seja mais bem-sucedido que os anteriores, e não apenas repita a escrita de surtir algum efeito aparente no momento de seu lançamento para, logo em seguida, ser superado por alguma reengenharia do próprio crime organizado ou pelo simples término das operações emergenciais?
A cooperação com os governos estaduais, sem que se suplantem as prerrogativas deles, sobretudo no policiamento dos territórios, é a principal diferença apontada pelos responsáveis pela execução do novo plano. A conclusão em Brasília e nos estados é que, se não houver uma reação coordenada à sem-cerimônia com que as narcomilícias se alastram nacional e internacionalmente, tendo o Rio de Janeiro como exemplo máximo de exibição de força, em pouco tempo as instituições do Brasil serão tomadas pelo crime de forma a comprometê-las.
Ao que se anunciou como plano para enfrentamento logístico às facções, seguir-se-á, segundo as autoridades, um conjunto de ações também na área de inteligência, para estrangulá-las financeiramente. Essa é e sempre foi a maior lacuna das versões anteriores de GLOs, intervenções e outras propostas lançadas com semelhante pompa por governos anteriores, inclusive do próprio PT.
O Judiciário também tem papel urgente a cumprir, enfrentando a investigação de decisões judiciais que favorecem líderes de organizações criminosas com liminares de transferência de presídios federais para outros próximos dos territórios que comandam, quando não o relaxamento de prisões temporárias.
Uma das maiores preocupações de Lula, contemplada com o desenho das GLOs voltadas apenas para portos e aeroportos, era o Exército não ser envolvido em operações de policiamento de comunidades no Rio ou noutros estados. Por duas razões: ele não quer que o governo federal assuma atribuições que não são suas pela Constituição, dando aos governos locais um “sócio” conveniente para o caso de fracasso no policiamento ostensivo. Também existe um trauma não superado na relação com a Força terrestre, considerada a mais contaminada politicamente pelo bolsonarismo, que ainda enfrenta o acerto de contas com eventos como o 8 de Janeiro.
A se concretizarem os objetivos do plano, com o estreitamento dos laços com os governos estaduais e uma boa sinergia entre militares e Polícia Federal, com comando duplo da Justiça e da Defesa, a gestão Lula espera desarmar não só o discurso de falência da esquerda na área, como também o domínio bolsonarista sobre as polícias. Com tantas possibilidades de ganho político, trata-se de uma prioridade máxima de governo.
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