Rescisão de venda de refinaria, suspensão de privatizações e abertura a indicações políticas criam riscos futuros
A Petrobras tem disseminado insegurança com várias de suas decisões recentes. Na última semana, o conselho de administração retirou do estatuto da empresa a blindagem contra as indicações políticas que a transformaram no palco principal da corrupção desbaratada pela Operação Lava-Jato. O pretexto alegado para a decisão foi atender a uma liminar do Supremo Tribunal Federal sobre a Lei das Estatais, e a validade das medidas ainda está sujeita a manifestação do Tribunal de Contas da União (TCU), mas a mera discussão sobre um tema que parecia superado representa um retrocesso.
Não é o único. Duas outras decisões da Petrobras têm impacto temerário: a tentativa de rescindir a venda já formalizada de uma refinaria e a retomada de investimentos no refino. Além de ferirem a livre concorrência, ambas contrariaram acordo firmado pela própria empresa com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Em 2019, o Cade instaurou inquérito administrativo para investigar a conduta da Petrobras no mercado de refino. Pouco depois, a empresa informou que venderia oito refinarias. Como a privatização ampliaria a concorrência, houve acordo para suspender a investigação. A Petrobras vendeu uma unidade de xisto e três refinarias: Landulpho Alves (rebatizada Mataripe, na Bahia), Reman (Amazonas) e Lubnor (Ceará). Com a mudança de governo, houve reviravolta nas privatizações, pondo em risco não apenas o acordo com o Cade, mas também a segurança jurídica de negócios já firmados.
O plano estratégico da Petrobras para o quinquênio 2024-2028 prevê ampliar a presença no refino com investimentos de US$ 16, 3 bilhões. A empresa decidiu aumentar a capacidade de três refinarias que estavam na lista das que seriam vendidas: Abreu e Lima (Pernambuco), Gabriel Passos (Minas Gerais) e Repar (Paraná, com a produção de diesel menos poluente). Abreu e Lima, vale lembrar, foi um foco endêmico de corrupção.
A Petrobras anunciou ainda a rescisão da venda da Lubnor, sob a alegação de não cumprimento de medidas pela compradora, que decidiu buscar reparação por perdas e danos. Com isso, ganha força a impressão de que empresas já vendidas poderão voltar ao controle da estatal. Especula-se até se o fundo árabe Mubadala devolveria Mataripe, diante da insegurança jurídica.
No Cade, a Petrobras pediu renegociação do acordo de 2019. O presidente da estatal, Jean Paul Prates, argumenta que o compromisso foi elaborado com base em resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) depois revogada e que o Cade nunca apresentou estudo demonstrando o domínio do mercado pela Petrobras. Ora, basta acompanhar o sobe e desce no preço dos combustíveis para saber que o preço nas bombas é determinado pelo que a Petrobras cobra nas refinarias.
Quatro conselheiros indicados ao Cade ainda precisam ser sabatinados no Senado. Como falta quórum, a definição sobre o acordo deverá ficar para 2024. Nas sabatinas, os senadores fariam bem em questionar os candidatos sobre o assunto. Ninguém pode fazer vista grossa à tentativa evidente de fortalecer a presença no mercado de refino em detrimento da livre concorrência e de restaurar a intervenção política nos negócios da estatal. De um lado, está a visão de mundo estatista que já legou ao Brasil seu maior escândalo de corrupção. Do outro, a defesa dos consumidores e cidadãos brasileiros.
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