Pacote é desidratado no Legislativo; argentino ameaça tensionar o campo político
Javier Milei conseguiu levar para o plenário da Câmara dos Deputados o projeto da sua lei "omnibus", um pacote de 664 artigos chamado de "Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos". Tratava-se de um grande plano de reforma da economia —e também da sociedade e da política.
Tratava-se. Mudanças de impacto foram amputadas do texto por comissões. Mesmo aspectos essenciais do programa de corte de gastos corriam risco de rejeição.
O partido do presidente conta com apenas 38 do total de 257 deputados. Somados os parlamentares de blocos potencialmente aliados ou que, ao menos, aceitam negociar com o governo, Milei poderia contar com metade dos votos.
Poderia. Um dia depois do relativo progresso na Câmara, o presidente voltou a acirrar os ânimos. Disse em entrevista que não está "disposto a negociar nada" —o que não for aprovado agora, o será mais tarde, de alguma maneira.
Nas comissões, caíram artigos relativos às reformas penais e eleitorais, à do Código Comercial e Civil, a prerrogativa de governar por medidas de emergência por dois anos (reduzida a um ano) ou privatizações maiores, como a da petroleira YPF e a do Banco de la Nación.
Nesta sexta (26), o governo anunciou que tiraria do diploma artigos essenciais para o reequilíbrio orçamentário, como o controle do reajuste de aposentadorias.
Em troca de apoio, governadores de províncias, com influência parlamentar relevante, querem que o governo proponha a restauração da cobrança do imposto de renda, derrubada em iniciativa eleitoreira do governo anterior, apoiada também pelo então deputado Milei.
A política impõe por enquanto limites à atuação do chefe de Estado. Porém o presidente reafirma seu programa de conflito, seu personalismo e sua defesa de refundação incontestada da Argentina. Opositores seriam apenas parte da "casta" de privilegiados, cúmplices de um século de ruína do país.
Ao menos na retórica, Milei insiste no tudo ou nada. Líderes do bloco adepto do diálogo reiteram apelos para que a Casa Rosada negocie seu projeto. Pedem interlocução mais qualificada e atenciosa.
O mandatário dá sinais de que pretende usar sua popularidade para pressionar os que não se filiam ao kirchnerismo ou à esquerda.
A centro-direita indica que aceita aprovar o essencial do programa de controle das contas públicas. Sem isso, o governo corre risco de naufrágio rápido.
Na próxima semana, quando devem ser discutidos artigos da "lei das liberdades", será possível verificar se o presidente pretende preservar a viabilidade de seu mandato ou se vai insistir em ilusões revolucionárias fadadas ao fracasso.
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