Conselho que deveria fiscalizar e disciplinar age como órgão corporativo em temas como o do auxílio-moradia
Toda atenção é pouca quando um órgão com o histórico do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) edita portarias e resoluções que versam sobre pagamentos a promotores e procuradores.
No papel, a instituição surgiu para incrementar a fiscalização administrativa e disciplinar do Ministério Público; na prática, sua conduta se distingue pouco daquela esperada de uma entidade corporativa.
Em novembro passado, por exemplo, o conselho lutou contra a transparência e dificultou a busca de dados sobre remuneração de membros do Ministério Público.
Anos antes, fez ainda pior: autorizou que a licença-prêmio fosse convertida em pecúnia, uma medida que, de 2019 a 2022, custou R$ 439 milhões aos cofres públicos.
E o que dizer do auxílio-moradia? Em 2014, uma decisão provisória do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, concedeu a ajuda de custo a todos os juízes federais, pouco importando o local em que trabalhassem.
Como se pode imaginar, não tardou para a regalia ser estendida a todos os magistrados brasileiros. Diante dessa escalada esdrúxula, como reagiu o Ministério Público? Enfrentou a mamata? Não: pediu para se refestelar na pândega.
Agora o CNMP se vê mais uma vez às voltas com o auxílio-moradia. Ainda que a distribuição indiscriminada dessa benesse tenha sido encerrada em 2018, sempre parece haver alguém disposto a explorar as brechas legais.
No fim de 2023, Elizeta Ramos, então na condição interina de procuradora-geral da República, resolveu ampliar o valor máximo do benefício, elevando-o de R$ 4.377 para pouco mais de R$ 10 mil mensais.
Em 5 de fevereiro deste ano, o titular do cargo, Paulo Gonet, repetiu a canetada. No mesmo dia, porém, baixou outra ordem, determinando que o teto do auxílio seria de R$ 4.377. Eis que, menos de duas semanas depois, o valor mudou de novo e passou para R$ 5.691.
Seja qual for a cifra, nenhuma faz muito sentido. Membros do Ministério Público são a elite salarial do funcionalismo e não precisam de ajuda de custo. Seus contracheques com frequência ultrapassam o limite constitucional, porque somam regalias aos vencimentos.
Apesar do absurdo patente, há quem defenda os enormes gastos com o sistema judicial brasileiro. É o caso do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, para quem soa irrelevante o fato de o Brasil deter o custo recorde entre 53 países analisados pelo Tesouro Nacional.
Como a atuação do CNMP atesta, muito desse custo decorre de privilégios injustificáveis, garantidos por sequências tão tortuosas que a sociedade às vezes nem sabe se a confusão esconde alguma trama ou se revela certa incompetência.
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