Republicano sai do atentado com ferimentos menos graves que os de brasileiro e não deve esperar por bônus semelhante
O tiro de Thomas Crooks vai ajudar a eleger Donald Trump como a facada de Adélio Bispo ajudou a eleger Jair Bolsonaro?
É difícil dizer. Na verdade, até hoje não sabemos bem qual foi o efeito da facada sobre a campanha eleitoral de 2018. A maioria dos analistas acha que o atentado ajudou Bolsonaro, eu também acho. Mas como?
Uma primeira hipótese, levantada nos primeiros dias após o atentado de 2018, apostava que a comoção em torno do atentado faria Bolsonaro subir rapidamente nas pesquisas. Alguns achavam que algo semelhante havia acontecido com a campanha de Marina Silva em 2014, lançada logo após a morte de Eduardo Campos em um acidente aéreo.
Não foi bem assim: Bolsonaro subiu nas pesquisas depois da facada, mas gradualmente. Se houve um "bônus de solidariedade" eleitoral, ele cresceu conforme o candidato era mostrado no hospital, com sua família, todos os dias, correndo risco de vida.
Se foi isso, Trump não deve esperar por um bônus semelhante: o republicano saiu do atentado com ferimentos leves, incomparavelmente menos graves que os de Bolsonaro.
Uma outra hipótese dizia que a facada aconteceu exatamente quando a campanha de Geraldo Alckmin iniciaria uma bateria de ataques pesados contra Bolsonaro na TV. Os ataques foram adiados por causa do atentado. Só vieram quando Jair já havia crescido nas pesquisas. Algo assim pode beneficiar Trump: a campanha democrata ainda está procurando o tom certo após o episódio.
Por outro lado, falta muito mais tempo para a eleição americana do que havia entre a facada e a eleição que Bolsonaro venceu. Os democratas têm mais margem para retomar seus ataques do que os adversários de Bolsonaro tinham em 2018.
Finalmente, uma terceira hipótese sobre o efeito da facada em 2018 é que ela tirou Bolsonaro da campanha, transformando-o em uma tela branca sobre a qual fatias diferentes do eleitorado projetaram suas esperanças, muitas vezes contraditórias entre si. É o que eu acho.
O site Infomoney produziu uma série de podcasts sobre "os pregões que fizeram história".
No episódio sobre o dia da facada, os entrevistados dizem que ela beneficiou Bolsonaro porque, daí em diante, quem falou em nome dele foi Paulo Guedes. Sim, foi Guedes quem falou para o mercado; mas, nas periferias, quem falou em nome de Bolsonaro foram as igrejas evangélicas, e duvido que tenham feito o mesmo discurso de Guedes.
Trump não deve esperar efeito semelhante. Ao contrário de Bolsonaro em 2018, Trump já foi presidente; os americanos já têm opinião formada sobre ele.
Claro, Trump também tem trunfos que Bolsonaro não tinha. Já é o favorito: mesmo um efeito muito menor do que o da facada pode ser suficiente para lhe dar a vitória. Se os ferimentos leves reduziram seu "bônus de solidariedade" potencial, lhe deram a chance de erguer os punhos e gritar "fight!" na hora do atentado, gerando uma imagem histórica.
Se Trump já era favorito, e o atentado deve ajudá-lo, podemos cravar que a eleição americana já está decidida? Ainda não.
Exatamente pela ampliação do favoritismo republicano, o atentado deve acelerar a substituição de Biden por outro candidato democrata. Isso pode acontecer ainda neste domingo (21), quando essa coluna for publicada. O novo candidato democrata começará em desvantagem, mas é cedo para calcular suas chances.
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