sexta-feira, 29 de novembro de 2024

PACOTE É REMENDO IMPROVÁVEL

Vinicius Torres Freire, Folha de S. Paulo

Vai ser difícil conseguir mesmo o remendo para manter as contas até 2026

Está difícil de acreditar que o governo vai conseguir conter despesas no tanto que está previsto na tabelinha do pacote fiscal. Se vai conseguir cumprir suas metas em 2025 e 2026. O plano fiscal vai até 2030. Mas sabe-se lá qual será o próximo governo e qual será o tamanho do conserto fiscal necessário em 2027 —será grande. Ainda que o pacote funcionasse no próximo biênio, seria apenas um remendo.

O tamanho do resultado de algumas providências é incerto, como no caso dos pentes-finos, recadastramentos e mudanças de regras de acesso do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada. Para o ano que vem, o governo estima conter gastos de cerca de R$ 6,5 bilhões (da contenção total de R$ 30,6 bilhões prevista no pacote).

O governo pretende conter gastos com aquele mecanismo chamado pelo palavrão "DRU", desvinculação de receitas da União. Em resumo, a DRU permite ao governo não fazer certos gastos obrigatórios. Está em vigor. Vence no final deste ano. Se o governo vai apenas renovar o instrumento, de onde vem o dinheiro extra (R$ 3,6 bilhões em 2025)? Se vai mudar a DRU, como vai ser?

O governo prevê diminuir subsídios e subvenções em 10% (crédito barateados para empresas, muitas do agro, etc.). O governo diz que o arrocho será de R$ 1,8 bilhão. Vai conseguir? O governo quer também conter o aumento do dinheiro que é legalmente obrigado a passar para o Distrito Federal. Hum.

Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos e ex-secretário da Fazenda paulista, estima que, com subsídios, o governo arruma R$ 700 milhões. Com DRU, nada. Com as medidas para melhorar BPC e Bolsa Família, R$ 2,6 bilhões. No total, prevê frustração de R$ 11 bilhões.

Há contas mais precisas por fazer, pois faltam os textos legais. A coisa toda vai passar pelo Congresso. Há medidas que devem funcionar, como colocar a despesa com escola integral no cesto da despesa obrigatória e crescente do Fundeb. Vai haver algum controle sobre o crescimento do valor das emendas parlamentares —bom. Mas vai se cortar apenas parte da gordura de um bicho que cresceu muito, de modo indevido, quando não picareta.

Como observa o economista Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper e colunista desta Folha, o governo ainda vai precisar de muito aumento de receita. Mais aumento de receita implica mais gasto obrigatório com saúde e educação.

O resumo da ópera é desconfiança.

O anúncio do dito pacote fiscal foi dominado pela história do Imposto de Renda, entende-se. É vida real, mais ou menos dinheiro a cair na conta. É incerteza econômica, pois não se sabe se o governo vai conseguir criar o imposto extra sobre ricos, que pagam escandalosamente pouco. Quando este governo tentou cobrar mais sobre os fundos exclusivos, de famílias ricas, o Congresso cortou a alíquota quase pela metade.

O IR não apenas dominou a conversa como fez o pacote sair pela culatra, até agora: dólar a quase R$ 6, taxa de juros de um ano quase a 14% anuais, mais aperto financeiro, aumento do custo de financiamento da dívida pública, mais pressão sobre a inflação.

Esperava-se que, mesmo com um pacote mediano, o dólar poderia voltar ao preço salgado e inflacionário de R$ 5,5. Agora, sabe-se lá. Há incerteza nova, as metas do pacote parecem otimistas demais.

Vamos ter mais problemas, também a curto prazo.

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