Acordo em Gaza marca primeiro êxito de Trump, mas será
difícil replicá-lo com Ucrânia e Taiwan
A única forma de exercer deterrência sobre Rússia e China é
garantir a defesa de Ucrânia e Taiwan, o que Trump se recusou, até aqui, a
fazer
A conclusão do acordo entre Israel e
o Hamas é
o primeiro êxito da política externa de Donald
Trump — antes mesmo de tomar posse, nessa segunda-feira. Suas
credenciais pró-Israel, o fato de não ter mais eleição a disputar e a abordagem
transacional ajudaram, nesse caso. Dificilmente isso poderá ser replicado
com Ucrânia e Taiwan.
Trump designou o empresário do ramo imobiliário Steve
Witkoff seu enviado para o Oriente Médio. Judeu, sem qualquer experiência
diplomática, Witkoff foi uma escolha improvável, ao estilo Trump. Ele vendeu um
hotel em Manhattan para o fundo soberano do Catar, que exerce papel-chave
nas negociações.
Wittkoff chegou com uma mensagem dura de Trump: o presidente
eleito não desejava ter de se ocupar disso nos primeiros dias de seu governo. A
expressão “o preço vai ser o inferno” caso não chegassem a um acordo antes de
sua posse teve impacto sobre o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, exatamente
por sua imprecisão.
Ao longo das negociações, em Viena e Doha, Wittkoff deixou
claro para David Barnea, o chefe do Mossad, serviço secreto israelense, que seu
país arriscava perder o apoio de Trump se não colaborasse. O Hamas já havia
aceitado.
Inicialmente, Wittkoff enviou suas mensagens por meio dos
participantes diretos das negociações, incluindo o enviado de Biden, Brett
McGurk. Com o progresso, o enviado do atual governo americano concluiu que
seria mais produtivo o seu sucessor sentar-se à mesa. De fato foi. A linguagem
sem rodeios do empresário amigo de Trump, de que haveria consequências nefastas
para os responsáveis pelo fracasso, facilitou o entendimento.
Biden não foi tão assertivo quanto Trump perante Israel, que
depende das armas fornecidas pelos EUA para se defender do Irã e dos grupos por
ele patrocinado na Palestina, Líbano, Síria, Iraque e Iêmen. Biden sempre se
definiu como “o maior sionista não judeu” da política americana. O receio do
impacto eleitoral negativo de ser visto “abandonando Israel” o constrangeu a
adotar atitude cautelosa — e contraproducente.
Em seu primeiro mandato, Trump brindou Israel com apoio
incondicional, depois de uma campanha na qual acusou Barack Obama de ter
“traído” Israel ao firmar o acordo nuclear com o Irã. Na política, as
credenciais são um fator contraintuitivo: elas dão liberdade para um líder agir
de forma contrária àquela sugerida por seu histórico.
Ucrânia e Taiwan também dependem militarmente dos EUA. Mas ambas são vítimas. As agressoras são Rússia e China, potências nucleares. A única forma de exercer deterrência sobre elas é garantir a defesa de Ucrânia e Taiwan, o que Trump se recusou, até aqui, a fazer.


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