A polarização da discussão política não se transforma em
paralisia legislativa
Não passou nem um mês de governo Trump e
já perdemos as contas de suas ordens executivas. É quase como se o Congresso
americano não existisse. Ele é, hoje, disfuncional, entregue à polarização.
O Partido
Republicano —salvo raras exceções— virou o partido do movimento Maga
(Make America Great Again).
O Congresso lá funciona como um freio de mão. Quando está
nas mãos da oposição, trava o andamento do governo, inclusive impedindo a
aprovação do Orçamento e punindo toda a população. Quando está nas mãos do
governo, lhe dá carta branca. Como as maiorias são sempre pequenas, também não
permite que o governo aprove mudanças mais profundas, que exijam votações
superiores a 50%. Pelo mesmo motivo, um impeachment é impossível. Quase não há
negociação entre os partidos.
Essa é uma das grandes diferenças da
política americana para a brasileira: nosso Congresso é forte. Na verdade,
forte até demais, e é o governo que fica sempre contra a parede. Seja com Lula ou com
Bolsonaro, o Congresso se fez protagonista da política e impôs limites ao
presidente, bem como traz agendas próprias. Aqui não existe a possibilidade de
o presidente governar sozinho. Precisa formar uma coalizão. E tanto os partidos
da base podem votar contra o governo quanto os da oposição podem votar a favor
em uma série de projetos.
Também vivemos a polarização —inclusive afetiva— da
discussão política. No entanto, isso não se transforma em paralisia
legislativa. A representação proporcional garante uma pluralidade de vozes e
interesses. O Congresso pende para a direita, mas isso não impede que o governo
de esquerda negocie suas pautas e avance com uma agenda de reformas.
Bolsonaro bem que tentou governar sem o Legislativo —ou
melhor, contra ele— ao longo de 2019. O Congresso não só não se deixou coagir
como ainda aprovou a impositividade das emendas de bancada, aumentando seu
poder. O voto impresso foi outra derrota que o Congresso lhe impôs. Enquanto
Bolsonaro tratava a educação como palco para arroubos ideológicos, o Congresso
renovou o Fundeb em 2020. Lula, por sua vez, gostaria de ter revertido
privatizações e a reforma trabalhista, acabado com a independência do Banco Central;
graças ao Congresso, não o fez.
A questão é toda sobre os termos em que a negociação se dá.
O PL de
Bolsonaro aceitou apoiar Davi
Alcolumbre para a presidência do Senado. Isso
desagradou parte de sua base de eleitores. Mas o resultado foi que o partido
conseguiu espaços importantes —presidindo a Comissão de Segurança Pública, por
exemplo—, que poderá usar para avançar suas pautas. E isso é muito mais
produtivo do que ficar bradando aos quatro ventos contra tudo e contra todos
sem conseguir efetuar mudança nenhuma.
Se você é partidário de Lula ou de Bolsonaro e gostaria de
ver seus planos para o Brasil impostos sem limites, o poder do Congresso é
sempre ruim. Ele faz com que a mudança profunda seja possível, mas impõe a
negociação com o lado oposto. Quando ela se dá dentro da lei e com
transparência, em cima de projetos e propostas, essa negociação deve ser
estimulada, não condenada. É mais parte da solução do que do problema.


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