O risco fiscal entrou no radar. Os indicadores fiscais
são piores, e as reações do mercado cambial são mais tempestivas, o que
alimenta a inflação
Afirmei em artigo recente que, simbolicamente, a viralização
do vídeo do deputado Nikolas Ferreira, com críticas à portaria da Receita que
ampliava a fiscalização sobre o Pix, seria para o governo Lula o que os
protestos de 2013 foram para o governo Dilma.
A hipótese ganha musculatura à luz da queda brusca da
aprovação do presidente em fevereiro, segundo o Datafolha. Explico: a aprovação
de Dilma vinha em patamares elevados (55% líquido, na diferença entre bom/ótimo
e ruim/péssimo), apesar do desconforto com a economia.
Não era apenas a tarifa de ônibus de São
Paulo que subia; a taxa de inflação anual estava na casa de 6,5%, sendo 15%
para alimentos. Os protestos de junho de 2013 provocaram um mergulho da sua
aprovação (5% líquido em julho). Foi como “cair a ficha” quanto aos erros na
gestão da economia.
Avalio que algo similar ocorre agora. A aprovação líquida de
Lula era magra, mas estava no campo positivo, em 4% em outubro. Caiu para 1% em
dezembro, possivelmente refletindo o susto com o salto do dólar para R$6,00.
Agora, depois da confusão do Pix, despencou para o campo
negativo, atingindo -17%, mesmo com a revogação da portaria. Mais uma vez, caiu
a ficha para a sociedade de que há problemas na política econômica.
Seria injusto colocar as políticas econômicas de Guido
Mantega e Fernando Haddad no mesmo patamar, mas por outro lado, a sociedade
está mais cansada e mais polarizada.
Tenho discutido que a deterioração da confiança dos players
de mercado no governo vai além dos indicadores fiscais correntes e das
projeções para até o final do mandato. Trata-se de uma análise que incorpora a
expectativa de risco fiscal futuro. Há o medo do porvir.
Havendo ou não exagero no pessimismo, o fato é que o governo
deu corda para o mau humor dos mercados. Foi uma sequência de decisões testando
os limites da expansão fiscal, um risco já conhecido.
Não é só isso. Houve erros de diagnóstico. O governo
acreditava que o aumento (ou “recomposição”) da arrecadação bastava para
atender as regras do arcabouço fiscal e entregar as metas fiscais prometidas,
sem a necessidade de conter gastos. Porém, há um teto para o crescimento das
despesas (2,5% real anual) que demanda medidas para sua contenção.
Teve também erro de cálculo político ao não se considerar as
resistências ao aumento da carga tributária.
Agravou-se o problema ao retomar regras do passado que
elevam a velocidade de crescimento de gastos obrigatórios, tornando o Orçamento
ainda mais rígido. O principal exemplo foi a volta da regra de valorização real
do salário mínimo pela taxa de crescimento do PIB. No atual contexto do país,
essas medidas representam grande retrocesso no desenho da política fiscal.
Ademais, houve retrocessos institucionais, como nas
políticas públicas que estão fora do Orçamento.
Como se não bastasse, olhando adiante, há bombas fiscais se
formando — tema da coluna na semana passada. O próximo presidente começará com
um grande peso nos ombros. Enquanto isso, o mercado teme que Lula não tenha
força política, ou mesmo disposição, para a empreitada.
É nesse contexto que o dólar caiu, e a Bolsa subiu com a
notícia de forte queda da aprovação do presidente.
A reação do governo à baixa aprovação tem sido de reafirmar
políticas públicas de cunho populista. No entanto, essa fórmula do passado,
utilizada para eleição e reeleição de Dilma, é bem mais arriscada hoje. A
reação negativa dos mercados é mais rápida.
Os preços de ativos demoraram para reagir ao desastre do
governo Dilma. Tomando o câmbio como referência, seu comportamento só descolou
da média dos emergentes (controlando pelo fato de o real ser mais volátil) em
2015, no seu segundo mandato.
E mesmo com a enorme artilharia fiscal eleitoreira (e uma
dose de sorte com a estabilidade dos preços de alimentos nos meses anteriores
ao pleito de 2014), a aprovação líquida na casa de 20% entregou uma reeleição
bem apertada.
O risco fiscal entrou no radar dos mercados e veio para
ficar. Os indicadores fiscais são piores hoje, e as reações do mercado cambial
são mais tempestivas, o que alimenta a inflação. Ainda mais se, porventura,
houver alguma recuperação na avaliação do governo.
Lula e o PT parecem buscar uma marca. Uma pena não ser a da
pacificação na política e da promoção do debate público sobre as urgentes
reformas de Estado.
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