Há muito, os presidentes da República, no presidencialismo
brasileiro, não dispõem de maioria parlamentar sólida e fiel para governar.
Isso se deve à excessiva pulverização partidária da representação política da
sociedade no Congresso Nacional, com uma grande quantidade de partidos, sem que
haja duas colunas vertebrais - uma de situação, outra de oposição - com número
suficiente de parlamentares para dar consistência aos dois blocos: maioria e
minoria, conceitos presentes na maior parte dos parlamentos mundo afora, mas
ausentes aqui nas últimas décadas.
Outro causa importante foi o grande alargamento da autonomia
dos parlamentares em relação ao Executivo com o crescimento exponencial do
valor das emendas orçamentárias de execução obrigatória e o financiamento
público de partidos e campanhas.
A falta de maioria parlamentar tem tido
papel moderador, ao longo do tempo, em relação às tentações autoritárias do
Executivo. Mas também dificultado o encaminhamento de soluções mais profundas
para os dramas brasileiros, sobretudo na economia. Os governos não ousam porque
sabem que o horizonte de apoio político é curto para medidas mais polêmicas e
radicais, às vezes necessárias.
A situação gera situações complexas e esdrúxulas que
poderíamos caracterizar com “parlamentarismo incompleto”. O Congresso tem muito
poder, mas não todas as responsabilidades necessárias com a governabilidade. Os
partidos políticos pragmáticos raciocinam mais ou menos assim: “O governo, em
parte, é meu, afinal tenho três (ou dois) ministérios, mas as metas fiscais são
do Lula e do Haddad, não minhas”. Alguns desses partidos se dividem ao meio em
votações essenciais para o governo. Aliás, é difícil identificar qual o partido
que não está no governo. Todos estão, creio, exceto PL, NOVO, CIDADANIA E
PSDB.
Outra situação incomum, em tempos de reforma ministerial, é
ouvirmos dirigentes partidários dizendo: “Aceitamos ministérios, mas isso não
quer dizer apoio eleitoral em 2026”. Ora, ora, ora, isto revela explicitamente
o descompromisso com os resultados do governo, que serão avaliados exatamente
nas eleições. Se aceito participar de um governo deveria ser porque acredito
nele, quero que ele seja bem-sucedido e bem avaliado, e, consequentemente, vou
apoiá-lo na sucessão. Mas qualquer presidente da República acaba se rendendo à
realpolitick porque depende de apoio parlamentar. São as agruras do
“parlamentarismo incompleto”.
Fui de quatro comissões especiais de reforma política entre
2011 e 2018. Acompanhei as idas e vindas do tema. Estudo há décadas o assunto.
E creio que essa é uma discussão central no Brasil, embora seja cético em
relação às possibilidades de êxito. É o típico círculo vicioso: “você não
resolve o problema porque tem o problema”.
Para enfrentar o tema e levantar essa discussão estratégica,
em boa hora, os deputados Lafayette de Andrada (REP/MG) e Luiz Carlos Hauly
(PODE/PR) apresentaram a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 2/25
instituindo duas mudanças essenciais: o semipresidencialismo e o voto distrital
misto. O parlamentar mineiro homenageia assim a memória de nosso saudoso
Bonifácio Andrada, entusiasta da proposta. Outro deles é o ex-presidente Michel
Temer.
Na próxima semana, discutiremos conceitos e problemas
envolvidos nesta difícil e decisiva discussão.
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