STF se autoblinda para evitar impeachment e implode sistema
de freios e contrapesos
Decisão vem antes do início de julgamentos de deputados e
senadores por desvios em emendas parlamentares
O sistema de freios e contrapesos estabelece independência e
autonomia para cada um dos Poderes atuar, mas com capacidade mútua de limitar
eventuais excessos. Esse equilíbrio entrou em colapso ontem, quando Gilmar
Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reduziu a capacidade do Senado de
abrir processo de impeachment contra ele mesmo e seus colegas.
Um exemplo de como esse equilíbrio funciona: o STF vota a
constitucionalidade de normas aprovadas pelo governo e pelo Congresso, podendo
derrubá-las. Em contrapartida, os parlamentares detêm o poder de abrir processo
de impeachment do presidente da República ou ministros da Corte.
Na decisão, Mendes considerou que há trechos na Lei de
Impeachment incompatíveis com a Constituição Federal. O ministro aumentou o
quórum no Senado para a abertura de processo, declarou que apenas o
procurador-geral da República pode entrar com a denúncia e estabeleceu que o
mérito de decisões judiciais não pode ser considerado crime de
responsabilidade.
A justificativa é louvável. De fato, o
instituto do impeachment tem sido usado como forma de intimidação. Hoje há
66 pedidos de afastamento dos atuais integrantes da Corte parados no Senado,
segundo o site do Legislativo. Destes, 32 foram apresentados neste ano. Os
processos não andaram, mas o simples fato de estarem lá configura um armamento
pesado para pressionar o Supremo.
Em tempos de atrito institucional, basta uma vírgula fora do
lugar para se acionar a bomba. O Congresso está insatisfeito com o STF por
motivos pretéritos, mas também com os planos futuros de iniciar os julgamentos
de deputados e senadores acusados de desvios cometidos a partir de emendas
parlamentares.
Antes da decisão de Mendes, qualquer cidadão –
parlamentares, inclusive – poderia apresentar denúncia para abertura de
impeachment de integrantes do Supremo. Para o ministro, a regra estimulava
denúncias motivadas por vinganças ou interesses políticos.
Agora, só quem pode denunciar é o procurador-geral da
República. Na configuração atual dos detentores de poder, significa
autoblindagem. Ligado a ministros do STF e indicado ao cargo duas vezes pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Paulo Gonet jamais entraria com pedido de
afastamento de um integrante da Corte.
No futuro, isso só seria possível se um presidente de
direita sucedesse a Lula. Ainda assim, seria necessário haver não maioria
simples, mas um quórum de dois terços dos senadores para aprovar o impedimento
de um ministro do STF.
Embora a decisão seja juridicamente questionável, ela não
deve cair. O plenário do Supremo vai votar se mantém ou não o entendimento de
Mendes. O mais provável é que todos concordem com a autoblindagem.


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