Ao longo de uma hora de entrevista concedida à Folha, a
ministra da Cultura, Marta Suplicy, se posicionou pela primeira vez sobre
alguns de seus principais desafios à frente da pasta.
Ela afirmou que avalia a possibilidade de criar um órgão de
fiscalização para o Ecad (escritório que arrecada e distribui direitos
autorais) e de retirar da alçada da Fundação Biblioteca Nacional as políticas
públicas de livro e leitura --mudança feita na gestão de sua antecessora, Ana
de Hollanda.
Veja abaixo os principais trechos da entrevista.
Folha - Quais serão as prioridades de sua gestão?
Marta Suplicy - Eu não tenho que marcar a minha gestão, mas
sim a do governo Dilma. Eu vim para a pasta com o objetivo de criar uma
política de Estado. Entre as prioridades estão aprovar as novas leis de incentivo
fiscal [ProCultura] e de direitos autorais [no Congresso], além de aumentar a
inclusão social via cultura.
A sra. está satisfeita com o orçamento da pasta de R$ 2,9
bilhões, motivo de reclamação de sua antecessora? É preciso aumentar recursos?
Nenhum gestor nunca pode estar satisfeito com o que ele tem
para trabalhar. Você sempre quer mais. Houve um aumento de 63% do orçamento,
mas é dinheiro carimbado [para a Ancine (Agência Nacional do Cinema) e para o
Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Então, dizer
que teve um aumento de orçamento que vai viabilizar muita coisa nova é difícil.
O prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), propõe
a vinculação de verbas para a pasta da Cultura em São Paulo. Qual é a sua
opinião sobre esse tipo de mecanismo?
A tendência sempre é você engessar porque, para o gestor de
um ministério, tornar obrigatório o investimento dá a certeza de que haverá
recursos. A postura de quem está com a gestão total é de não engessar. Não
serei eu a proponente disso à presidenta Dilma [Rousseff]. Acharia ótimo que
fosse engessado, mas preciso fazer esse ministério acontecer com o dinheiro que
tenho.
O Fundo Social criado em 2010 para ser abastecido com
recursos oriundos da exploração do pré-sal no país é alvo de disputa por
diversas pastas do governo, como o Ministério da Educação. A Cultura está
perdendo essa briga?
Há tantas questões aqui para resolver... já estou até dando
aula em algumas áreas, mas não tive tempo ainda de ver todas as questões do Congresso.
Ainda não tem um ponto final. A Cultura ainda não se manifestou sobre essa
briga.
Seus antecessores, Gilberto Gil e Juca Ferreira, eram contra
a manutenção de 100% de renúncia fiscal na reforma da Lei Rouanet. Queriam
forçar as empresas a tirar dinheiro do bolso para os projetos. O que a sra.
pensa sobre isso?
Eu penso como eles. Por isso acredito que a solução à qual o
Pedro Eugênio [deputado federal do PT-PE e um dos relatores da reforma da Lei
Rouanet, em tramitação na Câmara] chegou foi a mais habilidosa. Ele está
propondo que, para atingir os 100%, será preciso cumprir uma série de
contrapartidas. Sempre preferiria o limite de 80%, mas não tenho a caneta na
mão. Não dá para ter tudo no mundo.
Com a reforma da Lei Rouanet, a sra. teme a migração de
recursos para outras áreas, como o Esporte?
Não tenho nenhum temor disso. Quem quer fazer uma marca com
a cultura tem um perfil diferente de quem quer fazer isso com o esporte.
Uma das primeiras medidas da sua gestão foi anunciar editais
para criadores e produtores afrodescendentes. Cotas raciais, e não sociais, não
promovem a discriminação?
Não, de jeito nenhum. Sou absolutamente a favor das cotas
raciais. Quando dizem que é racismo, não me incomoda e nem nunca me incomodou
quando eu lutava pelos direitos das mulheres e dos gays.
O relatório da CPI do Ecad no Senado, concluída neste ano,
propôs a criação de um órgão federal para fiscalizar a atuação da instituição
que arrecada e distribui direitos autorais. A sua antecessora era contra essa
fiscalização. Qual é sua posição?
Conversei com muitos setores da sociedade. A minha percepção
é a de que o Ecad é um órgão que precisa existir e que tem uma autonomia que
precisa ser preservada. Eles dizem que têm absoluta transparência. Ouvi o outro
lado, que não está satisfeito com essa transparência. Então, estamos analisando
a possibilidade de tornar o órgão mais transparente.
Sem a necessidade de um órgão externo de fiscalização?
Não, [a solução] pode ser [incrementar] a transparência com
um órgão externo. Isso existe em todos os países do mundo e não muda
absolutamente nada em relação à autonomia e à independência do órgão --e ainda
responde ao clamor da sociedade.
A Fundação Biblioteca Nacional concentrou, nos últimos anos,
as políticas públicas de livro e leitura, ao mesmo tempo em que enfrentou
problemas como vazamentos e deterioração do prédio da instituição, no Rio.
Seria ela a instância adequada para a política do livro e da leitura?
Não acho que seja. Estou estudando porque foi feito desse
jeito e como ficaria se eu trouxesse a política do livro para Brasília. Ainda
não tomei uma decisão sobre isso.
Por que motivo Ana Paula Santana foi demitida da chefia da
Secretaria do Audiovisual do ministério?
Não tenho nada contra ela, mas eu queria um outro perfil
para a secretaria. Ainda não decidi quem irá substitui-la.
Diante da sua força política, a senhora cogita concorrer ao
governo de São Paulo em 2014?
Eu não sou candidata.
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