Da revista ISTOÉ
Às 10h14, da quarta-feira 9, a reportagem de ISTOÉ chegou à
residência do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, para uma entrevista
exclusiva. Desde que decidiu reformar o Palácio das Princesas, sede do governo,
Campos se divide entre o gabinete provisório, instalado num centro de
convenções, e sua casa – que, na verdade, pertence à família de sua mulher,
Renata, há 40 anos. É lá que ele vive com os quatro filhos e os sogros.
Localizada num bairro da zona rural de Recife, a residência é decorada por uma
grande variedade de obras de artesanato regional. A preferida de Campos é uma
imagem de São Francisco em tamanho natural. “A política brasileira tem que
entrar na era do Papa Francisco”, diz o candidato do PSB à Presidência da República.
“E não adianta quererem me colocar contra a Marina”, brinca, referindo-se à
nova aliada, que é evangélica fervorosa. A primeira-dama dá boas-vindas da
varanda, em companhia da filha Maria Eduarda, de 21 anos. Ela exibe a gravidez
de Miguel, o quinto filho do casal, que chegará ao mundo em fevereiro. Eduardo
Campos despacha com um de seus secretários na mesa da sala, e o pequeno José
Henrique, de 8 anos, corre de um lado a outro com o smartphone do pai. Os
outros dois filhos, João (19) e Pedro (17), estavam fora, estudando. “Tem
político que gosta de criar bois. Outros preferem cavalos. Eu gosto de criar
gente.”
ISTOÉ – Por que o sr. acredita que pode ser um bom
presidente?
Eduardo Campos – Porque somos capazes de mudar a qualidade
da política no País. A política se degradou. Vivemos uma encruzilhada. Não
podemos colocar em risco o que acumulamos nas últimas três décadas,
especialmente em termos de democracia, estabilidade econômica e inclusão
social. Quero resgatar o bom debate, a utopia, a leveza e o respeito da
sociedade. Representamos milhões de brasileiros que acreditam em democracia,
que é possível um padrão sustentável de desenvolvimento econômico, que é
preciso aumentar a participação da sociedade na governança pública. Minha
aliança com Marina é a primeira resposta à crise de representatividade que o
País está vivendo. O PSDB e o PT já tiveram sua chance de liderar o processo
político. Agora é a nossa vez.
ISTOÉ – O sr. acredita mesmo em possibilidade de retrocesso
nas conquistas sociais?
Campos – Enquanto a nova agenda for negligenciada, sim. As
pessoas não têm acesso a serviços públicos de qualidade. Quem passa quatro
horas num ônibus, quem espera oito meses para fazer um exame, com risco até de
perder a vida pela demora no atendimento, quer mudança. As respostas para essas
questões não serão dadas com velhas práticas políticas.
ISTOÉ – O que são as velhas práticas?
Campos – Achar que basta juntar uns partidos para ter tempo
de TV, contratar um bom marqueteiro e depois contar os parlamentares, distribuir
ministérios entre partidos, sem discutir conteúdo de nada. O que está posto na
sociedade? Quer ter uma telefonia decente, transporte público de qualidade,
energia sustentável para iniciarmos um novo ciclo de crescimento. Quem entendeu
o que aconteceu nas ruas em junho entende a aliança que estamos fazendo agora e
a pauta que estamos colocando.
ISTOÉ – Essas questões são antigas e ninguém mudou.
Campos – São questões que estão postas há duas décadas, ao
menos. É o que ocorre, por exemplo, com as reformas política e tributária. O
presidente Lula tentou fazer. Só que político pensa no imediato e, se aquilo
vai prejudicá-lo, ele não apoia. A saída é propor reformas escalonadas, com
previsão de entrar em vigor em oito, 12 ou 16 anos. Na reforma política, por
exemplo, poderíamos terminar, de saída, com a coligação proporcional, com a
cláusula de barreira e a coincidência de mandatos. Isso já dá uma primeira
arrumada.
ISTOÉ – Se Lula não fez as reformas com a popularidade e a
base de apoio que tinha, por que o sr. acha que conseguirá?
Campos – Porque o Brasil que sairá das urnas em 2014 será
outro. Foi por isso que alguns setores tentaram reduzir as chances de debate,
polarizando a disputa. Em 2014 teremos uma eleição de posturas. Precisamos usar
mais mecanismos de democracia direta, usar o potencial de 108 milhões de
brasileiros com smartphones ligados à internet. Os governos precisam ser
digitais. Com isso, dá para governar com uma base menor, mas que tenha
qualidade.
ISTOÉ – Não é um sonho governar com uma base menor?
Campos – É preciso testar. Não dá para ficar alimentando um
ciclo que não está sendo bom para a política brasileira. Estamos há dois anos
lutando contra essa inflação renitente, empurrando para cima da meta
prudencial. Tem muita gente que subiu degraus, deu entrada na casa própria,
comprou máquina de lavar, televisão de tela plana, assumiu vários compromissos
financeiros. Se a economia não melhorar, essas pessoas podem ser obrigadas a
descer esses degraus.
ISTOÉ – E o que o sr. fará para melhorar a economia?
Campos – A tarefa de conter a inflação não é só taxa de
juros. É preciso encarar a economia como você enfrenta outros problemas. No
caso da segurança pública, o que você faz? Não é só colocar polícia na rua, tem
que ter escola, assistência social, uma Justiça mais ágil, combater a
impunidade. Na economia, é fundamental compatibilizar a política fiscal com a
monetária, e passar segurança aos agentes econômicos.
ISTOÉ – Como passar essa segurança? Qual é o seu plano
econômico?
Campos – Não quero antecipar um debate que estou começando.
Mas o País precisa de um rumo estratégico, como o que Lula fez na “Carta aos
Brasileiros”, em 2002. A eleição dele gerou na ocasião mais ansiedade no
mercado, mais sobressaltos, que qualquer outra crise, levando o dólar na casa
dos R$ 4. Há hoje uma crise de confiança que precisa ser neutralizada. Tem que
fazer o dever de casa, alavancar os investimentos, combater a corrupção,
implementar uma gestão pública mais eficiente, baseada na transparência, no
controle social e na meritocracia, e não no apadrinhamento. Eu fiz isso em
Pernambuco. Todos concordam que é preciso reduzir o número de ministérios. É
uma questão simbólica.
ISTOÉ – O sr. vai se apresentar como uma terceira via?
Campos – Não é uma terceira via, mas é “a via”. Não gosto do
clichê de terceira, porque parece que há uma primeira e uma segunda. Não quero
ser a contestação da contestação, quero ser o caminho para melhorar a vida das
pessoas.
ISTOÉ – Apesar do desempenho como governador, o candidato
Eduardo Campos ainda é desconhecido dos brasileiros. Como pretende mudar isso?
Campos – É verdade que o Brasil ainda não me conhece. Mas
não fiz até agora nenhum esforço sistemático para mudar isso. Recentemente,
temos falado na TV, mas apenas dez minutos a cada seis meses.
ISTOÉ – E como virar o jogo?
Campos – Vamos andar juntos pelo Brasil, eu e Marina. Vamos
ter o apoio desse maravilhoso mundo da internet, participar de fóruns e
atividades País afora. Os espaços vão surgindo naturalmente, é um processo em
construção. Não pode ser um processo ansioso, mas tranquilo, como estamos. Quem
não está tranquilo são os outros!
ISTOÉ – Qual é a estratégia de sua campanha?
Campos – Vamos correr o País. Estamos fechando uma agenda de
debates e atividades, de agitação de ideias e participação em eventos públicos.
Nos próximos dias já vamos começar a aparecer juntos. Haverá também atividades
internas direcionadas à militância do PSB e da Rede, que devem estar coesas.
Queremos o apoio de personalidades e de diversos setores da sociedade civil.
Mostrar que temos um campo que inclui outras lideranças políticas, como Luiza
Erundina, Pedro Simon, Jarbas Vasconcelos. A campanha será a expressão política
do desejo de mudanças que alimenta protestos e manifestações País afora.
Podemos expressar esses valores que estão sendo reclamados na vida pública em
torno de ideais que vão juntar as pessoas.
ISTOÉ – E os palanques regionais? Vocês vão cobrar
fidelidade e expulsar o PT das coligações?
Campos – Não vamos expulsar ninguém. Sai quem quiser. Os
Estados estão livres para fazer os arranjos necessários, desde que garantam o
palanque para nossa candidatura.
ISTOÉ – Mas a Dilma também vai querer o palanque. Vocês vão
dividir?
Campos – Pode ser, não vejo problema.
ISTOÉ – A Marina vai ajudar a projetar sua imagem?
Campos – Acho que a aliança vai ajudar a difundir ideias que
são novas, simples, mas de grande impacto e com grande sinergia com as pessoas
que não são candidatas e que não são partidárias. Pessoas que militam por um
Brasil melhor. Não podemos ser encarados como ofensa, só por oferecer um
caminho alternativo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário