Por Dora Kramer colunista do O Estado de S.Paulo
O enunciado do problema em tese é simples, não tem nada de
novo. O complicado na prática é a solução a que se propõem o governador Eduardo
Campos e a ex-senadora Marina Silva, agora que iniciam a elaboração do programa
conjunto dessa aliança para a eleição de 2014 sustentado na ideia da "nova
política".
De acordo com o esboço do documento que seria discutido
ontem e antecipado em parte pelo Estado, "é necessária mudança profunda do
sistema político". Até aí, morreu neves.
O trecho seguinte é que são elas: mudança "para
permitir a emergência de outro modelo de governabilidade, cujos alinhamentos se
deem em torno de afinidades programáticas, e não em torno de feudos dentro do
próprio Estado, do desmantelamento da gestão pública e do uso caótico, perdulário
e dispersivo do orçamento nacional".
Não resta dúvida de que existe outra maneira de se governar
em sistema de coalizão que não seja a adotada hoje e descrita com precisão na
proposta a ser debatida. Não é aceitável que uma democracia esteja condenada a
pagar pedágio ao fisiologismo e à corrupção.
O desafio de Campos e Marina será o de demonstrar com
objetividade e clareza como isso pode ser feito. A coragem de esmiuçar o
assunto para além do simples slogan em plena trajetória de campanha conta ponto
a favor deles.
Nenhum partido fez isso até hoje, provavelmente com medo de
afugentar potenciais aliados acostumados à dinâmica de usurpação do bem
coletivo para uso particular.
Para se afastar dos "moldes tradicionais" é
preciso mais que boas intenções. É indispensável a capacidade realística ( a
"sonhática" não basta) de mudar as regras de funcionamento do modelo.
E isso não se faz com lei, com reforma política, mas com mudança de
procedimento.
Começando pela superação de algumas contradições. Marina
Silva ficou no governo Lula até 2008, sabendo perfeitamente bem em que base se
formou a maioria parlamentar, até porque foram reveladas três anos antes no
escândalo do mensalão.
Eduardo Campos governa Pernambuco com uma coalizão de 14
partidos. Todos comprometidos e motivados por programa de governo? Pode até
ser, mas tal hipótese otimista não elimina o fato de que até
"anteontem" o PSB fazia parte do governo federal, cujos métodos são
exatamente aqueles que se propõe a mudar.
Nada é necessariamente eterno, as pessoas podem tentar fazer
diferente, mas votos de confiança são concedidos com mais facilidade se
precedidos de algo mais concreto que a mera inspiração da esperança. Este filme
o Brasil já viu.
Retomada. Agora que uma pesquisa (Datafolha) mostra em números
o repúdio de 95% dos consultados à ação violenta dos vândalos ditos "black
blocs", é possível que gente tão influente quanto equivocada perceba o que
a maioria da população já percebeu: a diferença nítida entre protesto e
bandidagem.
Se os mascarados refluírem é possível que o cidadão perca o
medo de se manifestar. Para os alvos dos protestos de junho, nada mais útil que
um bando de inúteis a interditar as ruas - estrito e lato sensos - fazendo, em
plena democracia, o papel da repressão na ditadura.
Dá no mesmo. Roberto Carlos tenta se penitenciar da fria a
que levou seus colegas a entrar (porque quiseram) na questão das biografias:
ofereceu suporte legal de primeira - e caríssima - linha ao grupo Procure Saber
e deu entrevista ao Fantástico depois de semanas de silêncio.
Disse que é a favor de biografias não autorizadas. Mediante,
entretanto, um "acordo prévio". É de se supor que com os autores e/ou
editoras sobre o conteúdo do que seria publicado. De onde trocou
"censura" por "acordo" e deixou intacto o conceito de
obrigatoriedade de autorização.
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