Por Izabelle Torres, da ISTOÉ
Uma transportadora de veículos localizada em Betim, Minas
Gerais, pode ser a chave para desvendar um esquema de lavagem de dinheiro e
pagamento de propina a autoridades ligadas ao Ministério do Trabalho. A AG Log
Transportes foi criada em 2010 por Ana Cristina Aquino, uma emergente social
que costuma pagar revistas de celebridades para falar quanto gasta com os
eventos que promove. Apesar de não prestar serviços a nenhuma grande empresa, a
transportadora declarou ter faturado, de junho de 2012 a junho de 2013, R$ 112
milhões, uma enormidade perto do que faturam empresas do setor. Em apenas três
anos de funcionamento, período que a maioria das companhias leva para maturar
um negócio e não embolsar lucros milionários, Ana adquiriu jatinho, helicóptero
e uma dezena de carros de luxo – e tem orgulho de tornar pública a gastança. É
a origem desse dinheiro que a Polícia Federal quer descobrir.
Seria apenas um caso de excentricidade não fossem os
detalhes estranhos que envolvem a história. O primeiro deles é a relação entre
a AG Log e o advogado João Graça, integrante da cúpula do PDT nacional e
assessor especial do ministro do Trabalho, Manoel Dias. Graça, que foi assessor
do ex-ministro Carlos Lupi, não aparece em nenhum documento oficial da empresa
como sócio ou cotista e nega qualquer participação na sociedade. Entretanto, a
sede da transportadora em Curitiba foi registrada no mesmo endereço do
escritório de advocacia Graça Associados, do qual é o fundador. Há dois meses,
enquanto representava o ministério em um evento promovido pela Câmara dos
Deputados, Graça sacou do bolso uma dezena de cartões de visita da
transportadora, enquanto explicava que estava sem o cartão do novo cargo no
ministério. Não é só. Um e-mail obtido por ISTOÉ traz uma conversa entre Ana
Cristina e João Graça. Na mensagem enviada a Graça, Ana se refere à AG Log como
“nossa empresa”.
Outros documentos com detalhes das operações financeiras da
transportadora estão sendo analisados pela Polícia Federal e pelo Ministério
Público. Eles constam do inquérito da Operação Esopo, que há dois anos
investiga desvios de recursos do Ministério do Trabalho, sob o comando do PDT,
e prováveis pagamentos de propinas a servidores públicos. A operação prendeu 22
pessoas e as suspeitas são de que cerca de R$ 500 milhões tenham sido desviados
do ministério nos últimos anos. Agentes que trabalham nas investigações afirmam
que o caso não foi concluído ainda porque houve problemas operacionais. Os 11
especialistas que fizeram os primeiros laudos foram substituídos meses antes
das prisões por conta de uma greve, que deteriorou o andamento dos trabalhos.
Graças à falta de pessoal, a PF enfrenta dificuldades para avançar nas
apurações e oferecer a denúncia referente à Esopo. Por isso, a documentação em
poder da polícia sobre a transportadora de Ana Cristina e suas despesas ainda
não foi inteiramente analisada.
Alguns fatos, entretanto, chamaram a atenção durante a
análise do inquérito. Uma planilha de despesas da AG Log revela que a empresa
justificou gastos de R$ 3 milhões como referentes à regulamentação do Sindicato
dos Cegonheiros de Pernambuco (Sincepe). Detalhe: a solicitação de registro do
Sincepe tramita atualmente no Ministério do Trabalho. De acordo com documentos
apresentados ao próprio ministério, Ana Cristina consta como presidente do
Sincepe e um de seus filhos integra o conselho fiscal. O escritório de João
Graça advogou pela criação do sindicato até março de 2013. Em abril, de acordo
com documentos obtidos por ISTOÉ, a AG Log começou a gastar, mensalmente, R$
600 mil para a formatação do sindicato. Segundo a planilha de gastos da
empresa, foram cinco cheques de R$ 600 mil (que totalizam R$ 3 milhões)
depositados de abril a agosto. A última movimentação no processo de criação do
Sincepe ocorreu no dia 17 de outubro, quando o coordenador de registro
sindical, Cesar Haiachi, encaminhou ofício para Ana Cristina solicitando o
envio de documentos para a conclusão do processo de regulamentação.
Ana Cristina chamou a atenção das autoridades pelo despudor
com que exibe seus dotes econômicos. Ela costuma usar um helicóptero
diariamente e, para ir da casa onde mora em Betim (MG) ao escritório, escolhe
um entre os seis modelos de carros de luxo estacionados em sua garagem. Entre
os bólidos, um Corvette vermelho e um jipe Cherokee. Nos jornais, costuma dar
entrevistas falando do gosto por joias e roupas. Na festa de inauguração da
empresa, que contou com a presença do advogado João Graça, Ana Cristina fez
declarações sobre seu sucesso financeiro. No aniversário da filha, contratou o
cantor Gustavo Lima, que até foi buscar a adolescente na escola dirigindo um
Camaro amarelo. As contas da festança, de mais de R$ 1 milhão, também constam
na planilha de gastos da transportadora. Desde a festa, o cantor sertanejo
estreitou os laços com a família Aquino e agora está prestes a se tornar sócio
da transportadora.
Segundo ex-funcionários de Ana Cristina, João Graça se
afastou nos últimos meses por discordar da forma como a empresária atua nos
bastidores do poder. À ISTOÉ, Graça afirmou jamais ter sido sócio da empresa
(leia quadro). “Nunca utilizei e usei do meu cargo para locupletar-me para
absolutamente nada”, disse. “Tanto é fato que quaisquer acusações sempre foram
refutadas pela minha história. O único patrimônio que possuo é meu nome, e zelo
por ele.” Sobre o e-mail trocado com a Ana Cristina em que ela se refere a uma
sociedade com ele, João Graça afirma o seguinte: “Nada tenho a dizer porque
desconheço seu conteúdo. Reitero que jamais fui sócio da Ana Aquino e ouso a
qualquer um provar o contrário.” Entretanto, segundo os registros de mensagens
eletrônicas, ele não apenas teve conhecimento dos emails como respondeu uma
hora depois, utilizando um celular BlackBerry. Ana Cristina não retornou as
ligações da ISTOÉ e não respondeu a nenhum dos quatro e-mails que questionavam
as suspeitas em torno da sua empresa. O grande desafio da polícia nos próximos
meses será rastrear a origem das receitas da empresa e as operações da
transportadora, separando o que podem ser gastos legítimos dos ilegítimos. Até
lá, Ana Cristina continuará levando uma vida de milionária.
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