José Roberto de Toledo, colunista do jornal O Estado deS.Paulo
A política vem em ondas. Como um mar seria poético demais.
Melhor comparar com uma rádio e sua programação repetitiva. O terceiro ano de
governo é sempre o mais crítico na relação dos presidentes petistas com o
Congresso. Foi assim em 2005 e 2009 para Lula. Repetiu-se com Dilma Rousseff em
2013. Os motivos vão além da coincidência. Desgaste, barganha e chantagem.
Dilma perdeu 16 votações na Câmara no ano passado. Foi o
dobro das derrotas que ela sofreu em 2011 somadas às de 2012. Seu núcleo duro
de apoio - aqueles parlamentares que votam ao menos 9 em cada 10 vezes segundo
a orientação do governo - caiu de 306 deputados no primeiro ano de mandato para
123, quase todos petistas ou do PC do B, em 2013.
É notícia, mas não chega a ser novidade. No seu ano de
estreia na Presidência, Lula teve 309 deputados federais ponta-firme. Dois anos
depois, o grupo estava reduzido a menos de um terço: 91. No segundo mandato,
mesmo o presidente tendo superado o desgaste do mensalão e estar surfando a
onda do consumo de massa, o filme passou de novo: os 329 deputados do núcleo
duro de apoio no primeiro ano viraram 197 no terceiro ano de governo.
A ciência política um dia explicará esse ciclo de altos e
baixos previsíveis dos presidentes e suas bases de apoio no Congresso. Até lá,
resta se conformar com o empirismo jornalístico.
O terceiro ano é crítico porque há o acúmulo das denúncias
que se abatem sobre a maioria dos governos, sem contar o desgaste de três anos
de relação franciscana entre Legislativo e Executivo. Mas é também o ano de
criar dificuldades para vender facilidades no momento crucial para todos, o
quarto ano, o ano da reeleição.
Às vésperas de barganhar todo o tempo de propaganda na TV e
no rádio que puder conseguir, o presidente da vez dificilmente irá às últimas
consequências em um confronto com os partidos que lhe dão sustentação no
Congresso. Mesmo traído em uma votação ou outra, tende a ceder. E para garantir
que isso ocorra, os aliados mostram as garras e lhe impõem derrotas no terceiro
ano.
O PMDB é o mestre nesse jogo. Sua taxa de apoio ao
presidente é sempre mais alta nos dois primeiros anos. Mas está longe de ser o
único a praticar esse caxangá de votos, pondo no primeiro biênio, para tirar na
sequência. PSB e PP, apesar de terem sido dos mais fiéis aos petistas, adotam a
mesma tática.
Primeiro governo Lula: 89% dos votos do PMDB foram a favor
do presidente nos dois primeiros anos, mas a taxa caiu para 74% no terceiro.
Não foi por causa do mensalão? Sim, mas não só. Ou o fenômeno não teria se
repetido no segundo mandato: os 92% de apoio nos dois anos inicias caíram para
88% no ano subsequente. Com Dilma, a queda voltou a ser grande: de 90% para
77%.
O PSB caiu de 96% de votos pró-Lula no biênio 2003/2004 para
84% em 2005. No mandato seguinte, caiu de 93% para 88%, entre 2007/2008 e 2009.
E, já sob Dilma, passou de 92% em 2011/2012 para 77% em 2013. No PP, as quedas,
nos mesmos períodos, foram de 83% para 78% com Lula-1, depois de 93% para 87%
em Lula-2, e de 90% para 82% durante o governo Dilma. Parece um relógio.
De tão repetitivo, esse ciclo de toma lá, dá cá com
tira-põe-deixa-ficar acaba fazendo o jogo político previsível. Se valer o
retrospecto, o quarto ano de Dilma será melhor do que o terceiro. Dá até para
entender: com os próprios mandatos em jogo, ninguém quer arriscar-se a esticar
demais a corda e vê-la arrebentar bem no meio da campanha eleitoral.
Além disso, prevalece outra onda do Congresso: o último ano
de mandato dos deputados é ainda menos produtivo do que os três primeiros. Com
menos embates em plenário, diminui a oportunidade de impor uma derrota ao
governo. Em 2006, houve um terço a menos de votações nominais do que na média
dos anos anteriores. Em 2010 a redução foi de dois terços. Imagine com a Copa
no Brasil.
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