Da Veja
Há uma premissa de
ouro na cartilha de como crescer na Petrobras: encontrar um padrinho político.
Por mais capacitados que sejam os técnicos, dificilmente conseguem galgar
degraus além do terceiro escalão da estatal se não tiverem respaldo de uma
legenda — ou de algum nome poderoso no Congresso. Para alcançar tal façanha,
engenheiros de carreira negociam o que for preciso (inclusive a alma) para
conseguir um bom padrinho. Apontado por delatores do petrolão como interlocutor
do PT na Petrobras, Renato Duque, que por quase dez anos ocupou a diretoria de
Serviços da Petrobras, não fugiu à regra. Preso nesta sexta-feira, quando foi
deflagrada a sétima fase da Operação Lava Jato, o executivo entrou na empresa
em 1978, como engenheiro. Especializou-se em Engenharia do Petróleo na
Universidade Federal do Rio de Janeiro e assumiu diversas funções na estatal,
até ingressar na rentável área de contratos. Em 2003, quando foi nomeado
diretor da empresa, Duque comandava a gerência de contratos da área de
Exploração e Produção. Decidia, por exemplo, de quem contratar plataformas,
sondas de perfuração, embarcações e helicópteros. Acordos bilionários com empresas
nacionais e estrangeiras dependiam de sua canetada.
Duque nunca foi um petista histórico. Mas, nos idos do ano
2000, ao estreitar laços com o chefão José Dirceu, achou por bem aderir à
legenda. Escolheu, não por acaso, a corrente Construindo um Novo Brasil, a
mesma de Lula, e também a mais poderosa dentro do partido. A saída de Duque do
nível gerencial para a diretoria se deu por intermédio de Silvinho Pereira,
ex-secretário do PT e um dos nomes chave do escândalo do mensalão. Conhecendo
as grandes somas que transitavam pela área de Serviços, Pereira queria manter a
fonte dentro da cota do partido, já que a área de Abastecimento e a Transpetro
estavam sob o comando do PMDB. Duque parecia um bom nome aos olhos dos caciques
petistas, mas só foi chancelado depois que Pereira consultou o lobista Fernando
Moura, da empreiteira baiana GDK. A empresa ficou célebre depois que veio à
tona seu presentinho a Pereira, em 2004, em troca de contratos com a Petrobras:
uma Land Rover no valor de 73.500 reais. O caso foi revelado em 2005 nas
páginas de VEJA.
A pré-disposição do engenheiro para a contravenção está nos
autos do processo conduzido pelo Ministério Público Federal. Nas declarações de
Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef à Justiça, no âmbito da Operação Lava Jato,
consta que Duque operava um esquema criminoso de financiamento que drenava 3%
dos valores dos contratos de sua área para o PT. Disse Costa em seu depoimento:
“Olha, em relação à Diretoria de Serviços, era, todos, todos sabiam, que tinham
um percentual desses contratos da área de Abastecimento, dos 3%, 2% eram para
atender ao PT. Através da Diretoria de Serviços. Outras diretorias como gás e
energia, e como exploração e produção, também eram PT, então você tinha PT na
Diretoria de Exploração e Produção, PT na Diretoria de Gás e Energia e PT na
área de serviço. Então, o comentário que pautava lá dentro da companhia é que,
nesse caso, os 3% ficavam diretamente para, diretamente para o PT”. Ainda
segundo a decisão judicial que precedeu a prisão de Duque, os executivos
Augusto Ribeiro de Mendonça Neto e Júlio Gerin de Almeida Camargo, da Toyo
Setal, confirmaram esses fatos e detalhes a respeito do pagamento de valores
por contratos da Petrobras a Duque e ao lobista que o servia, Fernando Soares,
também conhecido como Baiano.
Mas, antes de operar o esquema que, tudo indica, ajudava a
abastecer os cofres do PT, Duque quase sucumbiu. Sua ligação com Pereira e
Dirceu colocou sua permanência na estatal por um fio em meados de 2006. Depois
da descoberta do esquema do mensalão, a principal fonte de arrecadação do
partido secou. Armou-se, assim, uma queda de braço na estatal entre PT e PMDB
pelos cargos na empresa. Os pemedebistas passaram a requisitar a área de
Serviços, alegando envolvimento de Duque com os mensaleiros. Queriam colocar no
lugar de Duque o engenheiro Alan Kardec. Mas o PT conseguiu manter o diretor
até 2012, quando Maria das Graças Foster assumiu a presidência da empresa,
nomeada por Dilma Rousseff. Falava-se, à época, em despolitização da estatal —
e a ascensão de Graça era vista com receio pelos partidos que detinham poder
nas diretorias. Um dos primeiros movimentos da nova presidente foi tirar o PMDB
da diretoria de Abastecimento e demitir Duque — o principal representante do
lulismo na empresa. O PT tentou negociar a permanência do diretor até 2013, mas
não conseguiu. Tanto ele, quanto Paulo Roberto Costa e Jorge Zelada, da área
Internacional, foram defenestrados.
Duque curou sua mágoa abrindo uma consultoria de óleo e gás,
a D3TM — empresa que usou, em muitos casos, para prestar serviços à Petrobras.
Da janela de sua sala, na Rua da Assembleia, era possível avistar a sede da
estatal, na Avenida Presidente Vargas, no Centro do Rio. Segundo as
investigações, a empresa se tornou um veículo de recebimento de propina do
megaesquema agora chamado de petrolão. Os bens da D3 foram bloqueados pela
Justiça nesta sexta-feira. Duque ainda possui imóveis na Barra da Tijuca e na
Zona Norte do Rio de Janeiro, onde nasceu. Tem ainda uma casa de campo no
município de Penedo, no interior do Rio. Todos os seus bens estão bloqueados
até segunda ordem.
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