Do blog Balaio do Kotscho
Com seus olhos sempre arregalados, a ave agourenta que
sobrevoava soberana pelos céus de Brasília, no melhor estilo do corvo Carlos
Lacerda, teve que fazer um pouso de emergência. As asas de Eduardo Cunha, o
suprapartidário e plenipotenciário presidente da Câmara, foram cortadas em
pleno voo.
O super-Cunha se empolgou demais com os poderes subitamente
adquiridos em apenas um mês, e exagerou na dose, ao afrontar a opinião pública,
com algo que soou como deboche num momento em que o País e os brasileiros
enfrentam graves dificuldades econômicas.
Ao fornecer passagens aéreas de graça por conta da Câmara,
ou melhor, com o nosso dinheiro, para os cônjuges dos parlamentares, entre
outras benemerências, que custarão mais R$ 150 milhões por ano aos cofres
públicos, o novo herói da oposição midiático-financeira e dos setores mais
retrógrados da sociedade brasileira percebeu que já tinha ido longe demais.
"Não acho que foi precipitado nem que deveria tomar
mais cuidado. Acho muito bom quando se faz uma atitude e pode ter tranquilidade
de vir rever. Não somos imunes a críticas e possíveis erros", justificou,
candidamente, ao anunciar, na segunda-feira, que os voos da alegria das
românticas excelências estão temporariamente cancelados.
Que gracinha!, como diria minha velha amiga Hebe Camargo.
Faz uma atitude? Vir rever? Garboso, Cunha recuou, mas não deu o braço a
torcer, e ainda disse que a medida foi mal interpretada como regalia. "Foi
uma repercussão muito negativa. Não houve entendimento correto". Quer
dizer, somos todos burros.
Às vésperas da eleição na Câmara, Cunha encontrou tempo para
ir a uma reunião de mulheres de parlamentares a quem garantiu a volta da
"bolsa-esposa", que tinha sido suspensa em 2009. Durante sua
campanha, ele prometeu mundos e fundos (os nossos fundos, claro) aos seus 512
colegas, como se fosse candidato a
presidente do sindicato dos deputados.
Entre outros projetos, o mais grandioso é a construção de um
shopping center próximo ao prédio do Anexo 4 da Câmara. Como se quatro anexos à
obra original de Niemeyer não fossem suficientes para abrigar os deputados,
seus assessores e todas as mordomias, Cunha agora pretende erguer o Anexo 5,
com três prédios, um plenário e o shopping numa parceria público-privada.
As PPPs foram criadas para permitir a participação da
iniciativa privada em obras públicas, mas será que é este o caso? A construção
está estimada no módico valor de R$ 1 bilhão que, para os padrões do presidente
da Câmara, não deve representar muita coisa. "Ninguém vai fazer shopping
com dinheiro público", garantiu. Mesmo que isto aconteça de fato, o que se
pergunta é: para quê deputados precisam de um personal shopping em plena praça
dos Três Poderes? Não têm mais o que fazer?
Nas horas vagas, o super-Cunha se dedica a aprovar projetos
de sua autoria que criam o "Dia do Orgulho Heterossexual" e a
punição, com reclusão de um a três anos de prisão, a quem cometer atos
considerados discriminatórios contra heterossexuais num país em que 200
homossexuais são assassinados a cada ano.
Ao mesmo tempo, luta pela aprovação do Estatuto da Família que, entre
outros retrocessos, veta a adoção homoafetiva.
E vamos que vamos.
Em tempo (atualizado às 14h05):
"A decisão unânime foi essa: revogação pura e
simplesmente do ato", anunciou, agora há pouco, um constrangido Eduardo
Cunha, após reunião da Mesa Diretora da Câmara, que acabou com esta mamata.
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