Editorial, O Estado de S.Paulo
Ninguém espera que num momento de crise um governante
demonstre desesperança, mas Dilma Rousseff abusa da paciência dos brasileiros,
subestimando-lhes o discernimento com demagógicas e irresponsáveis
manifestações de otimismo. Na reunião com os governadores que promoveu na
quinta-feira em Brasília, depois de afirmar que não nega a existência de
problemas, mas garante que o governo “tem como enfrentar essas dificuldades e
em um prazo bem mais curto do que alguns pensam, voltar a ter, assistir à
retomada do crescimento da economia brasileira”, a presidente da República
tentou explicar como se faz isso: “Estou tentando mostrar que o estímulo à
exportação, o investimento em infraestrutura, a retomada do crédito e a
expansão do consumo vão fazer o Brasil voltar a crescer”.
Se tudo é tão fácil e óbvio, o que é que Dilma está
esperando para operar esse milagre e acabar com a agonia dos brasileiros? Ou
ela estava apenas ministrando aos governadores uma aula de princípios básicos
de economia que ela própria não quer ou não consegue seguir?
A verdadeira razão pela qual a chefe do governo convocou os
governadores para essa encenação em palácio foi resumida pela colunista do
Estado Eliane Cantanhêde: “Dilma só queria tirar uma foto e dar um grito de
socorro contra o impeachment. Seria só patético, não fosse dramático que uma
presidente recém-eleita, com apenas meio ano de mandato, tenha chegado a esse
ponto”.
Por ironia, a presidente comandou essa pantomima na capital
federal exatamente no mesmo dia em que o governo anunciava um inédito déficit
fiscal semestral de R$ 1,6 bilhão e cortes de R$ 1 bilhão no orçamento da
Educação, R$ 1,18 bilhão no da Saúde e R$ 4,6 bilhões no das obras de
infraestrutura previstas no PAC. É o caso de perguntar: como é que a chefe de
um governo que não consegue pagar suas contas e ainda é obrigado a cortar
recursos previstos para áreas essenciais da administração tem coragem de, como
se ainda estivesse em cima de um palanque eleitoral, fazer promessas obviamente
delirantes?
Em seu discurso de meia hora aos governadores Dilma expôs as
razões das “dificuldades passageiras” que ela reconhece existirem, mas apenas
como uma fase de “travessia”: crise internacional, desvalorização do real em
relação ao dólar, aumento da inflação, retração do consumo, falta de chuva,
etc. Mas teve o cuidado de esquecer a razão principal da crise: o malogro da
“nova matriz econômica” intervencionista, estatizante, que impôs ao País,
agravado por sua própria incompetência gerencial e política.
Tratando, de modo cautelosamente velado, do verdadeiro
motivo da convocação feita aos governadores – seu desejo de que todos colaborem
politicamente para impedir que progrida a ideia do impeachment –, Dilma tentou
ser sutil: “Essa é uma reunião que tem um papel muito importante nos destinos e
na condução dos caminhos do Brasil”. E passou a desenvolver um raciocínio no
qual está implícita a ameaça a cada um dos governadores – se ela rodar, eles
próprios correrão também o risco de perder o mandato.
Dilma cometeu com os governadores a injustiça de equipará-los
a si mesma, simplesmente porque foram todos “eleitos num processo democrático”.
A campanha eleitoral de Dilma nada teve de “democrática” no sentido de que foi
baseada em promessas mentirosas quando passou a atacar seus opositores,
atribuindo-lhes a intenção de adotar medidas econômicas impopulares que ela
mesma já estava planejando e colocou em prática a partir do primeiro dia de seu
novo mandato. Ela própria, por razões eleitorais, não cumpriu seu “dever em
relação à democracia, ao voto democrático e popular”.
Dilma tem todos os motivos para se preocupar com a
possibilidade do impeachment. Se isso vier a acontecer, será em função de
razões constitucionalmente objetivas relacionadas a fatos consumados. Mas só
acontecerá num ambiente político favorável, com indiscutível apoio popular. E a
esta altura dos acontecimentos nenhuma esperteza política será capaz de mudar
isso.
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