Sem novas receitas para fechar o rombo das contas do governo
em 2016, o Bolsa Família – o intocável programa social do governo – entrou na
mira da tesoura. O relator-geral do projeto de Orçamento da União de 2016,
deputado Ricardo Barros (PP-PR), decidiu que não vai incluir na proposta os
recursos previstos com a arrecadação da nova CPMF e avisa que, para compensar,
não terá “dó” de cortar recursos de programas do governo. Para ele, pode haver
espaço para enxugar o Bolsa Família porque há “fraude” no programa.
O programa de transferência que beneficia cerca de 13,8
milhões de famílias sempre foi blindado dos cortes orçamentários e, no próximo
ano, deverá custar R$ 28,8 bilhões. O pagamento médio por família é de R$ 164.
Para tirar o orçamento do déficit, o governo já promoveu uma série de cortes em
programas sociais no valor de R$ 25,5 bilhões, como mostrou reportagem do
Estado.
“Eu posso passar a tesoura. Eu não tenho dó. Eu não tenho
nenhuma dificuldade de cortar as coisas que não vão ter dinheiro para serem
feitas. Não adianta deixar no Orçamento o que não vai se realizar depois”,
disse Barros, um dos vice-líderes do governo da Câmara. “Eu não tenho nenhum
problema em cortar o Bolsa Família porque eu sei que tem fraude.”
Ricardo Barros já avisou aos ministros da Fazenda, Joaquim
Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, que não pretende incluir no orçamento
do próximo ano os R$ 32 bilhões previstos para serem arrecadados com a volta da
CPMF. Para Barros, além da aprovação “incerta” pelo Congresso, ela não
produzirá a arrecadação esperada pelo governo.
O relator cobra do governo outras medidas que elevem a
arrecadação para compensar o déficit orçamentário. Barros defende o aumento das
alíquotas da Cide sobre a gasolina e o diesel – medidas que o Executivo pode
fazer sem o aval do Legislativo –, mas que o governo resiste em adotar. Ele
disse que não tem compromisso em cumprir a meta de superávit primário (economia
para pagamento de juros) das contas do setor público de 0,7% do Produto Interno
Bruto (PIB), como defende o ministro Joaquim Levy, mas sim em entregar um
orçamento “equilibrado” sem déficit.
O deputado disse que pedirá uma “opinião” do governo e de
prefeitos, responsáveis por organizar cadastros. Ele quer saber se há espaço de
enxugamento no Bolsa Família. Para o deputado, o programa pode passar por uma
reavaliação. O Bolsa Família foi criado pelo governo Lula em 2004 como junção
de uma série de programas sociais.
Legado. Procurado, o Ministério do Desenvolvimento Social,
pasta que gerencia o programa, não quis se pronunciar. Fontes do governo
contestam a possibilidade de se cortar o Bolsa Família e não acreditam que os
parlamentares terão coragem para restringir o programa. No Executivo, há ainda
quem considere que o objetivo da tentativa de se restringir o programa é acabar
com o legado da gestão petista.
“A ideia é acabar com o grande legado do PT, o social, para
cortar todas as possibilidades políticas do Lula”, criticou uma fonte do
governo, referindo-se a eventual possibilidade de o ex-presidente tentar voltar
ao Palácio do Planalto em 2018 e usar o programa como ativo eleitoral.
Autoridades do governo ouvidas reservadamente pelo Estado
defendem o programa que, este ano, deve gastar R$ 27,7 bilhões.
Elas dizem que ele é “bem focalizado” e tem normas de
controle para garantir o pagamento do benefício para quem realmente tenha
direito. O número de famílias beneficiadas tem se mantido praticamente
constante desde 2012 e, para ter direito ao benefício, cada pessoa da família
tem de ter renda de até R$ 154.
(Estadão).
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