quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

VENDE TUDO

Gil Alessi, El País
João Doria Jr., do PSDB, quer ficar conhecido como “João dos Bairros”. Aos 58 anos de idade, o empresário, que chegou a apresentar o reality show O Aprendiz, quer ‘demitir’ o prefeito Fernando Haddad (PT) nas eleições municipais de 2016. Para assumir a cadeira do petista, e se cacifar como o nome do PSDB na disputa, Doria tenta tomar o “banho de povo” que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que a legenda precisava.
Sentado em uma das salas do edifício-sede do Grupo Doria, na zona oeste de São Paulo, vestindo uma camisa branca com o monograma azul-escuro “J. D. J” no bolso, o empresário recebeu o EL PAÍS neste final de dezembro. Além de ter afirmado que caso eleito não disputará a reeleição ("faremos quatro anos vibrantes que valerão por oito"), o pré-candidato tucano voltou a dizer que doará seu salário de prefeito para instituições do terceiro setor. Além de Doria, o vereador tucano Andrea Matarazzo também já anunciou que quer a vaga do partido para disputar a prefeitura, e o primeiro turno das prévias da legenda, que escolherão o postulante tucano para 2016, estão marcadas para 28 de fevereiro.
Pergunta. Um dos seus adversários na luta pela vaga do PSDB na disputa do ano que vem, o Andrea Matarazzo, tem uma base forte de vereadores além do apoio de caciques do partido. Ele tem a máquina da legenda a seu favor. Isso não o intimida?
Resposta. Ele tem a máquina e eu tenho o sentimento. O sentimento da militância tem sido muito fortalecido nas inúmeras visitas que fiz [aos diretórios do partido]. Nos últimos meses já foram 68 bairros, 51 diretórios, dos 58 do PSDB. Os outros sete visitarei em janeiro. Eu entendo que o Andrea é um bom candidato, que merece respeito, tanto ele quanto um eventual outro que possa vir pela frente, não está fechada essa possibilidade. Mas eu sou muito determinado, e sigo a orientação e a instrução de gastar sola de sapato, amassar barro, ir ao encontro da militância, ouvir mais do que falar, ter contato com eles... E isso está funcionando muito bem.
P. O PSDB costuma ter muita dificuldade no chamado cinturão vermelho da cidade, composto pelos bairros periféricos que tendem a dar ao PT maioria de votos…
R. Primeiro que o cinturão não é mais vermelho. Ele foi, hoje não é mais. A disruptura foi feita não por ação do PSDB, mas por ineficiência na gestão do PT. O desastre da gestão petista no Governo Federal influiu muito na ruptura desse cinturão, na decepção dessa população que vive hoje a amargura do desemprego ou a ameaça do desemprego. Esse eleitorado hoje vive a inflação, são pessoas que faziam compras no mercado com determinado valor e hoje compram menos da metade, e essa decepção rompeu o cinturão vermelho.
P. Você e o Andrea Matarazzo são empresários. Não teme que esse fato afaste esse eleitorado?
R. A Marta Suplicy [possível candidata do PMDB para a prefeitura] é tão Matarazzo quanto o Andrea. Tão Suplicy quanto a família Suplicy. E nem por isso ela é mal avaliada nas periferias. Ela é uma pessoa com um passado e uma trajetória na qual, contrariando seus dois sobrenomes, foi uma prefeita com boa penetração nas bases populares. Eu não vejo em que sobrenome ou endereço possam comprometer atitudes. E não vejo que seja preciso ter atestado de pobreza para ser bem avaliado pela população mais simples da cidade. É preciso ter propostas, e capacidade de olhar e corresponder ao voto de confiança da população.
P. Como o PSDB pode se aproximar desse eleitorado das periferias?
R. É seguir o exemplo de Mário Covas: ir ao encontro deles, estabelecer compromissos viáveis e não mentir. E buscar fazer uma gestão, quando eleito, muito próxima da população, sobretudo a mais simples e a mais sofrida da cidade. Não existe a menor possibilidade de que, caso eleito, eu seja um prefeito engravatado estacionado dentro do gabinete do Viaduto do Chá. Vai falhar quem fizer isso... Pode ter a maior sabedoria, ser o mais profundo conhecedor da cidade, se fizer isso [ficar no gabinete], vai falhar.
P. Como você avalia a gestão do prefeito Fernando Haddad?
R. Tenho uma relação republicana com o prefeito. Não somos inimigos, somos adversários. Respeito sua trajetória de vida, acadêmica principalmente, é um bom professor. Até aqui me pareceu uma pessoa honesta, com bons princípios, mas não é vocacionado para ser um bom gestor. Ele não é um gestor. É um bom professor ocupando a prefeitura de São Paulo. Como gestor ele falhou, a gestão da cidade não foi boa, e não sou eu quem diz, são as pesquisas que mostram que ele tem uma avaliação muito ruim em todas as classes: A, B, C, D e E.
P. Uma das bandeira dele foram as ciclovias. Como você avalia essa política pública de mobilidade?
R. É uma política acertada, eu vou defender a manutenção das ciclovias. O que eu tenho como crítica é que houve uma implantação acelerada, houve um açodamento nessa implantação com o objetivo de alcançar metas de quilometragem de ciclovias, e nisso vários equívocos acabaram sendo cometidos. Primeiro teve um efeito no custo, o mau planejamento sempre estabelece custos mais elevados. Depois, ciclovia e ciclofaixas colocadas em áreas onde não há ciclistas ou áreas de risco para ciclistas, pedestres, transeuntes e até usuários de outros veículos. Imaginar que em várias áreas da cidade as ciclofaixas estão pintadas em cima de calçadas... Talvez nem ele saiba, porque como ele não frequenta a periferia, ele talvez não saiba que vários quilômetros de calçadas foram pintadas como ciclofaixas. Mas o programa é bom, é uma boa iniciativa e será mantida.
P. Vários municípios e Estados do país, inclusive São Paulo, enfrentam uma grave crise fiscal, não têm dinheiro para investir. Como fazer uma boa gestão sem caixa?
R. É possível. Principalmente fazendo aquilo que o PT não sabe fazer. Não sabe e não gosta de fazer uma gestão enxuta. O PT só sabe fazer gestão gorda e com muitos recursos. Recursos lícitos e recursos ilícitos. Os lícitos são mal aplicados no setor público. Os ilícitos, que deveriam ir para o setor público, vão para o bolso de parlamentares, secretários e tesoureiros do partido, que pautam sua vida de forma irregular, corrompendo a máquina pública e a cidadania brasileira.
P. Mas de onde a Prefeitura pode tirar dinheiro para investir?
R. Eu defendo o Estado mínimo, e vou fazer isso. A Prefeitura vai vender tudo aquilo que não for essencial para a gestão pública e a assistência à população que mais precisa. Vamos começar vendendo o estádio do Pacaembu, o autódromo de Interlagos e o parque de convenções do Anhembi. Numa mostra clara e definitiva de que o Estado não pode e não deve estar onde ele não é necessário. Quem deve administrar estes locais é o setor privado. Vamos vender e vamos vender bem, por valores que representam a dimensão física dos espaços e sua importância. E vamos aplicar os recursos onde são necessários. Principalmente saúde, educação e creches.
P. Caso eleito, qual será sua primeira medida como prefeito?
R. Voltar a velocidade normal nas marginais [Haddad reduziu a velocidade máxima nas vias expressas], para dar uma declaração clara do absurdo que foi feito, da falta de consciência e de planejamento. Isso vai ser uma demonstração clara de mudança e transformação. Nas marginais, as velocidades vão voltar ao que eram antes.
P. De acordo com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), após a implantação da medida as mortes no trânsito caíram 18,5% no primeiro semestre de 2015…
R. A razão não foi essa. A queda ocorreu fundamentalmente devido à redução sensível do número de veículos transitando nas marginais. A volta da velocidade normal será uma demonstração clara da busca da eficiência de colocar São Paulo na dimensão de uma megametrópole.
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