sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

CONVERSA FRANCA

Por Mel Bleil Gallo, IstoÉ
Em janeiro, o ex-governador e ex-senador pelo PMDB do Rio Grande do Sul, Pedro Simon, completou um ano desde sua aposentadoria da vida parlamentar. Neste mesmo mês, ele comemora 86 anos, dos quais mais de 50 dedicados à vida pública, iniciada como deputado estadual em 1963. Longe da tribuna parlamentar, entretanto, Simon decidiu manter-se ativo no ano passado e optou por um giro pelo Brasil. Percorreu o País em palestras a políticos, estudantes, movimentos sociais e organizações empresariais. Agora, tira suas tradicionais férias na casa de verão na praia Rainha do Mar, de onde, após voltar de uma missa, conversou com ISTOÉ.
Entusiasmado com os rumos da investigação sobre o esquema de corrupção na Petrobras, o peemedebista acredita que as denúncias serão responsáveis por uma verdadeira transformação na ordem política brasileira. Segundo Simon, a novidade virá da Lava Jato, quando, segundo ele, “chegar em pessoas que nunca imaginávamos”. A partir daí, acredita ele, acontecerá uma grande renovação. Católico, ele diz rezar, diariamente, pela proteção de Sérgio Moro e do Papa Francisco. “Tenho muito medo que aconteça alguma coisa contra eles”, revela.
ISTOÉ - Existe a possibilidade de o ex-presidente Lula se lançar novamente como candidato à presidência em 2018. Como o senhor vê isso?
PEDRO SIMON - Quando houve a primeira denúncia no caso dos Correios, eu subi à tribuna e disse que o Lula iria demitir os envolvidos. Mas ele não demitiu, nem deixou que criássemos a CPI. Precisamos do STF para criá-la. Hoje, o Lula não pode mais dizer que não sabia, porque está tão provado, está tão certo, que o melhor é ele ficar quieto. Não sei o que vai acontecer com ele, mas, certamente, ele ficará marcado como uns dos homens públicos que levou à ruína do País. Ele não vai ser mais nada, as pessoas estão muito esclarecidas agora. O PT vai pagar suas contas e o Lula deixará a cúpula do partido.
ISTOÉ - O sr. já disse temer que a Lava Jato seja esvaziada. Por quê?
PEDRO SIMON - O Judiciário brasileiro nunca existiu, só existia para ladrão de galinha. Hoje, ele mudou. Com o Sérgio Moro as coisas vão aparecer. Vai ficar provado que o maior escândalo criminoso do século foi feito no Brasil e, pode ter várias origens, mas teve seu apogeu no governo Lula. Eu rezo todas as noites pelo Sério Moro e pelo Papa Francisco. Tenho muito medo que aconteça alguma coisa com eles, porque são duas pessoas muito boas e que estão fazendo coisas extremamente relevantes. 
ISTOÉ - O sr. acredita que nossa cultura de impunidade está mudando?
PEDRO SIMON - Certamente. O Moro é um homem fantástico. Merece uma estátua em praça pública. Se o Supremo não nos decepcionar, viveremos a época mais importante da história do Brasil. Desde Dom Pedro, o Brasil é o País da impunidade. Isso está mudando. Levei 20 anos no Congresso tentando criar a CPI dos empreiteiros, desde as denúncias na época do Collor. Mas nunca deixaram criar uma CPI sobre os corruptores, nem sobre os empreiteiros. A CPI só saiu agora, quando eles já estavam na cadeia.
ISTOÉ - Qual é a avaliação que o sr. faz hoje da atuação do Congresso?
PEDRO SIMON - Do Congresso, não se pode esperar nada, ele está vivendo uma realidade crítica. Virou a política do troca-troca. E agora, que Dilma está no seu pior momento, com a água chegando no pescoço, a prática do troca-troca está mais intensa do que nunca. Muda ministro atrás de ministro, dependendo das votações. Depois de cortar as doações das empreiteiras na eleição, multiplica o fundo partidário de R$ 300 para R$ 800 milhões e diminui o tempo de televisão. Faz tudo isso para evitar ao máximo a insatisfação popular, mas é só uma forma de apaziguar.
ISTOÉ - E do governo Dilma?
PEDRO SIMON - Eu felicito o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, um homem de muito mérito, e a Dilma, por permitirem a continuidade da operação Lava Jato. Desde que  assumiu o governo, Dilma demitiu seis ministros por corrupção. Eu aplaudi na tribuna e publiquei um livro chamado “Presidenta Dilma, resistir é preciso”. Ela deu sinais de que queria se libertar, mas aí veio o “Fora Dilma”, o Congresso parou de aprovar qualquer coisa e ela se entregou. Sem um apoio mais amplo, ela ficou isolada e entrou numa omissão total.
ISTOÉ - Qual é a sua posição sobre o impeachment?
PEDRO SIMON - Acho que houve um equívoco com relação ao momento de se pedir o impeachment. Eu fui um dos grandes responsáveis pela saída do Collor. Na época, nos reunimos em meu gabinete para criar uma CPI a partir das denúncias do irmão dele, o Pedro Collor, sobre o PC Farias. Ou seja, primeiro os fatos contra ele apareceram - e, sinceramente, nem eram tão graves quanto os que há hoje contra o Lula e a presidente. Mas dessa vez foi o contrário, foi antes do tempo, criaram a CPI para buscar os fatos. Eu confio muito mais no Supremo. Ele sim vai apurar dados graves contra o Lula e a Dilma.
ISTOÉ - Como o sr. vê a atuação do PMDB e as denúncias que pesam sobre o partido?
PEDRO SIMON - O PMDB não merecia viver o que está vivendo hoje. É possível que ele possa ajudar lá adiante, com uma realidade diferente e resgatando um pouquinho da cara da época em que foi o grande responsável pelas “Diretas, Já” e pela democracia no País. Hoje, ele não tem peso nenhum, porque tem uns para lá, outros para cá, e ninguém se importa com a opinião do PMDB.
ISTOÉ - Como o sr. avalia nosso cenário político atual, em comparação com outras crises vividas no País?
PEDRO SIMON - Eu me sinto no escuro. Essa fase que nós estamos vivendo, que começou com a derrubada do presidente Jango em 1964, já completou meio século. Desde o MDB, Arena, aquela coisa toda. Desde então, nós vivemos momentos em que as circunstâncias em que nós vivíamos e ram muito piores do que as de hoje. Tivemos cinco presidentes nomeados com atos institucionais, o Congresso Nacional foi fechado, a imprensa não tinha absolutamente nenhuma liberdade. Agora não, vivemos uma democracia, a presidente foi reeleita, o Congresso está funcionando, o STF está funcionando e a imprensa tem a mais absoluta liberdade. É um momento mais complexo do que vivemos no passado. As pessoas mais ricas e poderosas estão sendo punidas. Vemos o presidente da Câmara e do Senado investigados, o dono da Odebrecht e dessas empreiteiras sendo punidos. É um momento em que as coisas realmente estão acontecendo, mas a população só pode assistir.
ISTOÉ - O sr. acha que a população participa mais ativamente da vida política?
PEDRO SIMON - Na ditadura, nós lutávamos com as armas que tínhamos. Havia quem defendesse a luta armada, a guerrilha, o voto em branco. Mas nós tínhamos estímulos e uma expectativa. Uma esperança popular. Hoje vivemos uma fase dolorosa em que só assistimos a esses episódios. A oposição está brincando, não tem um projeto. E estamos todos assistindo o trabalho notável do juiz Sérgio Moro, do procurador-geral Rodrigo Janot, e do Judiciário. Esses sim estão vivendo um momento significativo de nossa história e que poderá, se Deus quiser, nos transformar de maneira profunda, se não aceitarmos que, aos poucos, se esvazie essa operação.
ISTOÉ - O que aconteceu com aquela esperança?
PEDRO SIMON - Na ditadura, havia uma grande expectativa sobre o MDB e ele conseguiu, apesar das divergências, reunir o povo em busca do fim da tortura, da liberdade de imprensa e das “Diretas, Já”. Veio então o Collor, que saiu daquele jeito e assumiu o Itamar Franco, na minha opinião o homem mais importante dos últimos 50 anos da nossa história. Itamar criou o Plano Real e conduziu muito bem aquela transição. Elegeu-se o FHC, que levou adiante o Real, é verdade, mas que comprou a reeleição e vendeu de graça a Vale do Rio Doce. Daí, veio o Lula, que era uma expectativa do tamanho de um bonde e criou o que criou. O PT foi, na história do Brasil, a maior decepção e a maior paulada que levamos na vida. Foi nossa maior esperança e nossa maior expectativa, que se contrabalanceou com a maior traição que tivemos. Você tinha um partido forte, uma grande referência na área social, mas viu que era tudo um esquema montado, no qual o governo esteve presente e continua até hoje.
ISTOÉ - O vice-presidente Michel Temer, atual presidente do PMDB, conseguirá se reeleger para o comando da sigla, em março?
PEDRO SIMON - O normal seria que ele não fosse candidato. Ele já bateu o recorde, está lá há mais tempo que o Ulysses Guimarães. Seria um gesto bacana se ele orientasse um grande movimento para reorganizar o partido, mas sem ser o candidato.
ISTOÉ - Quem seria o candidato ideal?
PEDRO SIMON - Algum nome não tão metido na confusão.
ISTOÉ - E para 2018, o sr. continua defendendo uma candidatura própria do partido?
PEDRO SIMON - Sempre fui a favor, mas esse grupo que está aí nunca deixou. Em fevereiro, terá uma reunião para discutir isso novamente. Vamos ver o que será decidido. Essas candidaturas que hoje estão colocadas se posicionam muito longe da realidade. Até lá vamos ter um choque. Essas lideranças do Congresso, esse sistema todo do qual fazemos parte, essa história que o PT chama de “aliança de esquerda”... O povo vai se rebelar contra isso tudo e surgirá uma fórmula nova. Acredito muito no povo, o povo tá tomando conhecimento desse escândalo, formando verdadeiras correntes. O problema é que o povo está assistindo, torcendo para que dê certo, mas não sabe o que fazer.
ISTOÉ - De onde virá a novidade?
PEDRO SIMON -  Da explosão da Lava Jato. Quando a investigação chegar a pessoas que nunca imaginávamos, o povo estará nas ruas e, queira Deus, que saia uma grande renovação. E que não seja a loucura que aconteceu na época do Collor, em que os candidatos eram excepcionalmente bons e ganhou o pior deles. Hoje, a economia está em pandarecos. Agora, a paralisia é um problema gravíssimo e temos de ter a capacidade de não querer o “quanto pior, melhor”. Não podemos boicotar o governo naquilo que é essencial como segurança, saúde, educação. A novidade é que nunca um general, um grande empresário, grandes líderes políticos haviam sido processados e presos, que nem hoje. Começou a punição dos grandes.
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