Editorial O Globo
Lançado no final de outubro do ano passado pelo PMDB, o
documento “Uma ponte para o futuro” terminou contaminado por aquele momento
político, em que o pedido de impeachment da presidente Dilma era o centro dos
debates. Isso bastou para que o texto fosse interpretado como uma iniciativa do
vice, Michel Temer, presidente do partido, para anunciar a plataforma do seu
governo.
A interpretação atraiu ainda mais rancores do PT e aliados
contra as propostas, rejeitadas também por princípio, ao reduzir o peso do Estado,
dogma lulopetista. Até mesmo considerar o documento como “do PMDB” é um certo
exercício de elasticidade, considerando-se a divisão da legenda, muito
tensionada, com um bloco situacionista e um outro oposicionista. Mais ou menos
como sempre.
O grupo de peemedebistas que lançou o texto decidiu
patrocinar análises e sugestões que já transitavam no mundo acadêmico e na
imprensa.
Apenas o PT não percebe — ou se percebe, não admite — que se
esgotou um regime fiscal cujas raízes estão fincadas na visão ideológica
embutida na Constituição de 1988: cabe ao Estado ser o principal instrumento do
combate à pobreza, à miséria, ser o prestador de serviços de saúde a toda a
população de forma gratuita, bem como educação de boa qualidade.
Estava pavimentado o caminho para o Estado,
independentemente do governo de turno, ampliar a expropriação de rendas da
sociedade, para ele distribuí-las no cumprimento desta enorme (e impossível)
missão.
O saldo dessa trajetória é que o Brasil passou a ter a maior
carga tributária entre os países emergentes (36% do PIB). Afinal, os gastos
ditos sociais foram indexados, grande parcela deles ao salário mínimo. Para
tornar tudo mais difícil, a correta política de valorização do mínimo, de FH,
foi radicalizada com o PT no Planalto.
E, além de tudo, vincularam-se parcelas do Orçamento a
gastos específicos: Saúde, Educação, sem falar na folha do funcionalismo, por
definição fixa, dada a estabilidade legal do servidor. Pode ser cortada apenas
pela inflação.
Uma engenharia dessas só se manteria em pé se a economia
brasileira sempre crescesse, e a uma boa taxa. Como isso é impossível, todo
este edifício desabou a partir do momento que a mistura de recessão com
inflação, que chegou a dois dígitos, reduziu, de um lado, as receitas tributárias,
e, de outro, jogou na estratosfera a maior parcela das despesas: Previdência e
outros gastos ditos sociais. Não surpreende que o déficit nominal em 2015 haja
sido de 10,34% do PIB, do nível da Grécia no auge da crise.
Ora, diante de uma situação insustentável como esta,
economistas — e o PMDB os endossa neste documento — defendem, entre outras
medidas, a desindexação do Orçamento e o fim das vinculações, o que implicará
rever a qualidade de cada gasto na montagem anual dos orçamentos, algo
imprescindível.
Se o PT e Dilma insistirem em manter a fórmula de alta carga
tributária, a recessão se transformará em depressão, e a coleta de impostos
desabará junto, num cataclismo.
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